11.30.2004

Motoboys de SP são odiados, mas indispensáveis

Pedestres e motoristas, mais cuidado! Eles estão com muita pressa

LARRY ROHTER
Em São Paulo

Esta é uma cidade com cerca de 11 milhões de habitantes e 4,5 milhões de carros de passageiro, 32 mil táxis e 15 mil ônibus. Congestionamentos que chegam a mais de 160 quilômetros não são incomuns e, mesmo em um dia comum, ir de um lado a outro da cidade pode levar duas horas ou mais.

Apenas um grupo em São Paulo, a maior cidade da América do Sul, parece imune a estas frustrações e atrasos: o ousado exército de mensageiros de motocicleta conhecidos como "motoboys". Ziguezagueando entre os carros parados, ignorando as demarcações de faixas, semáforos vermelhos e sinais para parar, eles ameaçam regularmente os pedestres e enfurecem os motoristas enquanto passam às pressas por ruas e avenidas congestionadas, armados com o conhecimento de que sem eles os negócios praticamente parariam.

"Atualmente estamos tão integrados à economia que São Paulo não funcionaria sem nós", disse Ednaldo Silva, um motoboy que é dono de uma firma que emprega cerca de 50 mensageiros. "As pessoas não gostam de nós nem nos respeitam, mas somos tão essenciais para o transporte quanto os caminhões, e se fizéssemos greve, a cidade entraria em colapso."

Grande parte do trabalho dos motoboys envolve o envio rápido de contratos e outros documentos legais de uma empresa a outra, especialmente para empréstimos bancários. Mas de autopeças a plantas de arquitetura, órgãos humanos para transplante a passaportes e pizza, não há quase nada que não possam entregar.

"Não há como nos livrarmos deles", reconheceu Gerson Luís Bittencourt, o secretário municipal dos Transportes. "Eles empregam uma tonelada de pessoas e facilitam as coisas para todos. Assim, o que temos que fazer é encontrar uma forma de regular o fenômeno e restaurar a sociabilidade no tráfego."

Apesar de ninguém saber ao certo qual é o número exato deles, as estimativas começam em 120 mil e vão até 200 mil. Muitos trabalham 12 horas por dia ou mais e ganham um salário de R$ 900 por mês ou menos.

Segundo números oficiais, São Paulo tem no momento 332 empresas de motoboys. A concorrência é forte, e eles adotam nomes, freqüentemente em inglês, destacando eficiência: Adrenaline Express, Moto Bullet, Fast Express, Agile Boys, Motojet, Fly Boy, Motoboy Speed, AeroBoy Express, Fast Boys.

Com tanta ênfase na velocidade e tamanha competição com outros veículos, o serviço é freqüentemente perigoso. Ossos quebrados e motos destruídas são um risco ocasional, e segundo números compilados pelo sindicato, em média, pelo menos um motoboy morre por dia em um acidente de trânsito.

"A verdade é que somos descartáveis", disse Edson Agripino, 38 anos, veterano de 15 anos como motoboy. "Quando um colega se machuca ou morre, a primeira coisa que os expedidores perguntam é: 'Ele entregou o documento?'"

Mas muitos motoboys, especialmente os mais jovens, vêem a si mesmos como espíritos livres ou caubóis urbanos, desafiando as convenções da sociedade e invejados pelos enfadonhos assalariados presos em seus carros e escritórios.

"É ótimo estar na rua, por conta própria, vendo as garotas, e não em um cubículo com um chefe perturbando você o tempo todo", disse Fábio César Lopes, que, aos 29 anos, tem nove anos de experiência como motoboy. "Eu passei cinco anos em uma seguradora, e acredite, eu não só ganho mais fazendo isto, mas também é muito mais divertido."

Pragas

Os motoristas comuns consideram os motoboys uma praga, e a hostilidade entre os dois grupos é feroz e está crescendo. Há pelo menos 17 grupos de bate-papo online dedicados a queixas contra motoboys, e conflitos nas ruas e até mesmo brigas entre motoristas e motoboys não são incomuns.

"Eu não suporto os motoboys", disse Flávio Kobayashi, um artista gráfico. "Você está sentado lá preso no trânsito, a caminho de casa após um dia longo e difícil, e eles vêm com suas buzinas infernais, costurando em meio ao tráfego em total desrespeito a todos os demais na rua. Eles quebram o espelho retrovisor do seu carro se você ficar no caminho, e toda vez que há uma discussão eles se unem para espancar os motoristas indefesos."

Os pedestres, especialmente os recém-chegados de cidades pequenas no interior, se sentem particularmente vulneráveis. Em um notório incidente em 2001, Marcelo Fromer, guitarrista do popular grupo de rock Titãs, foi atropelado e morto por um motoboy com carteira vencida, que fugiu mas foi preso um ano depois, julgado e condenado.

Para colocar a situação sob controle, a Prefeitura criou no ano passado um sistema de registro obrigatório. As novas regras exigiam que todos os motoboys pagassem uma taxa de R$ 317, provassem não ter antecedentes criminais, obtivessem seguro de vida, usassem capacetes, dirigissem motos com no máximo 10 anos de idade e transportassem sua carga em cestos montados na traseira, com os números de registro indicados neles, para fins de rastreamento.

Mas os motoboys resistiram ao sistema, dizendo que foi concebido para bani-los das ruas. Apenas 40 mil deles se registraram. Eles organizaram protestos e bloquearam alguns das principais ruas. Durante a campanha para as eleições municipais que ocorreram em outubro, alguns candidatos endossaram a posição deles e alguns conseguiram liminares na Justiça os isentando do registro.

A prefeita Marta Suplicy (PT) reformulou o programa.

Há poucos anos, o Congresso tentou uma abordagem diferente e aprovou uma lei que tornaria praticamente ilegal aos motoboys o exercício de sua profissão, que começou a se espalhar para outras cidades do Brasil. Mas o presidente na época, Fernando Henrique Cardoso, que é de São Paulo, vetou o projeto, reconhecendo tacitamente a indispensabilidade do motoboy.

"Todos odeiam os motoboys exceto quando precisam de um", disse Caíto Ortiz, diretor de "Motoboys -Vida Loca", um recente documentário premiado. "Quando ele está levando às pressas um documento seu pela cidade, então ele se torna seu salvador, um herói, e você adora o sujeito."

Tradução: George El Khouri Andolfato
The New York Times

Estresse acelera o processo de envelhecimento

Cientistas dos EUA relacionam sofrimento psíquico à idade biológica

Benedict Carey
Em Nova York

Alguns eventos estressantes parecem deixar uma pessoa grisalha do dia para a noite. Agora, uma equipe de pesquisadores descobriu que o sofrimento emocional severo --por uma experiência de divórcio, de demissão ou pelos cuidados com um membro doente da família-- podem acelerar o envelhecimento das células do corpo em um nível genético.

As descobertas, divulgadas nesta terça-feira (30/11), são as primeiras a ligar o estresse psicológico tão diretamente à idade biológica.

Os pesquisadores descobriram que, geneticamente, as células brancas do sangue de mulheres que passaram muitos anos cuidando de uma criança enferma eram cerca de uma década mais velhas do que as de outras mulheres, que tiveram muito menos experiências desse tipo.

O estudo, que será publicado pela "Proceedings of the National Academy of Sciences", também sugere que o fato de a pessoa se ver estressada pode acrescentar anos a sua idade biológica.

Os médicos já associaram o estresse psicológico crônico com o enfraquecimento da função imune, gerando maior risco de resfriados, entre outras coisas. No entanto, eles ainda estão tentando compreender como a tensão danifica ou enfraquece os tecidos. A pesquisa sugere como tal dano pode ocorrer e abre uma possibilidade de o processo ser revertido.

"Esta é uma descoberta nova e significativa", disse Bruce McEwen, diretor do laboratório de neuroendocrinologia da Universidade Rockefeller, em Nova York.

McEwen disse que a pesquisa forneceu as evidências mais claras até hoje "do preço de desgaste nos tecidos que todo mundo com uma vida estressante paga."

"Sabemos que, quando ficamos mais velhos, temos maior tendência a engordar e desenvolver doenças cardíacas e diabetes", prosseguiu.

No experimento, Elissa Epel e Elizabeth Blackburn, da Universidade da Califórnia em San Francisco, lideraram uma equipe de pesquisadores que analisaram amostras de sangue de 58 mães jovens e de meia idade; 39 delas cuidavam de uma criança com um distúrbio crônico, como autismo ou paralisia cerebral. Usando técnicas eletrônicas, os médicos examinaram o DNA das células brancas do sangue, que são centrais à resposta imune do corpo à infecção.

Os pesquisadores concentraram-se em um pedaço de DNA chamado telômero, na ponta dos cromossomos de cada célula. O telômero se encurta cada vez que a célula se divide. As células podem se reproduzir muitas vezes durante a vida, para reparar e consertar órgãos, para crescer ou combater doenças. Uma enzima chamada telomerase ajuda a restaurar o telômero a cada divisão.

No entanto, depois de 10 a 50 divisões --o número varia com o tipo e a saúde do tecido, e os biólogos não entendem bem o sistema-- o telômero fica mais curto, e a célula é efetivamente aposentada, incapaz de replicar-se.

Quem nasce com uma doença genética chamada disqueratose congênita, que causa o encurtamento acelerado dos telômeros, morre cedo, em geral na meia-idade, frequentemente como resultado de complicações causadas pela baixa imunidade.

Resumindo, o tamanho relativo do telômero serve como medida bruta da idade da célula, de sua vitalidade.

Quando os pesquisadores compararam o DNA de mães que cuidavam de crianças deficientes, encontraram uma tendência marcante: levando em conta a idade de cada uma, calcularam que, quanto mais tempo a mulher tomou conta de seus filhos, mais curtos eram seus telômeros e a atividade de sua telomerase. Algumas das mães mais experientes eram anos mais velhas que sua idade cronológica, segundo a medição de suas células brancas do sangue.

"Quando as pessoas estão sob estresse, parecem emaciadas; é como se envelhecessem a olhos vistos. Aqui temos algo no nível molecular", que reflete essa impressão, disse Blackburn, professora de bioquímica e biofísica.

Os pesquisadores também deram um questionário às mulheres, pedindo que estimassem, em uma escala de três pontos, como se sentiam em suas vidas diárias, se eram sobrecarregadas, e quantas vezes não conseguiam controlar aspectos importantes de suas vidas.

As mulheres que disseram que estavam sob estresse pesado também apresentaram telômeros encurtados, em relação às que se sentiam mais relaxadas --com ou sem filhos deficientes.

"Algumas das mães que tinham muito estresse objetivo e verdadeiro também tinham uma percepção baixa de seu próprio estresse. O próximo passo é tentar compreender o que promove esse tipo de resistência", disse Epel.

Ela disse que o grupo tinha planos de testar o efeito da meditação, do treinamento da mente e da ioga na percepção do próprio estresse e no tamanho do telômero. Uma forma de aconselhamento chamada terapia cognitiva, na qual as pessoas aprendem a moderar suas respostas ao estresse, também pode ajudar, segundo os psicólogos.

A personalidade e a criação quase certamente são responsáveis por parte dessa diferença, entretanto. Em 2003, pesquisadores que acompanharam 850 neozelandeses do nascimento até os 26 anos de idade viram que variações em um único gene ajudavam a prever quais crianças seriam mais suscetíveis à depressão depois de eventos estressantes como divórcio e desemprego.

Pesquisadores dos Institutos Nacionais de Saúde mostraram, em macacos, que a criação calorosa e atenciosa dos filhos pode proteger os jovens animais precisamente dessa variação genética, promovendo resistência em indivíduos geneticamente vulneráveis. Uma criação fria ou abusiva, dizem os psiquiatras, pode ter o efeito oposto.

"Todos esses fatores se combinam e modulam a forma como a pessoa lida com o estresse", disse Ronald Glaser, diretor do Instituto de Pesquisa de Medicina de Comportamento da Universidade Estadual de Ohio.

Junto com sua esposa, Janice Kiecolt-Glaser, ele documentou o efeito do estresse na função imune. "Agora temos evidências, vindas de vários campos de estudo --de cura de feridas, de inflamações, de vacinas e de idade celular-- que realmente corroboram" que o estresse pode causar verdadeiro dano.

Especialistas advertem que o estudo do telômero precisa ser duplicado e que ninguém ainda mostrou de forma convincente que o estresse psicológico pode encurtar significativamente a vida das pessoas. Além disso, está longe de claro como uma preocupação com uma dificuldade de aprendizado de uma criança, por exemplo, poderia levar a um encurtamento dos telômeros dos pais antes do tempo.

Apesar de os pesquisadores saberem que tensão emocional desse tipo promove a liberação de hormônios de estresse, como o cortisol, que com o tempo pode prejudicar as células, ninguém sabe como esses hormônios e outras toxinas relacionadas ao estresse afetam os telômeros.

"Nesse instante, essa é a caixa preta", disse Blackburn, "e é isso que vamos estudar agora".

Tradução: Deborah Weinberg

The New York Times

11.29.2004

Desemprego e renda têm queda na Grande SP

Contingente à procura de vagas recua em outubro pelo sexto mês consecutivo, mas postos criados pagam salários menores

CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL

A recuperação na economia tem tido impacto positivo no emprego na região metropolitana de São Paulo, mas não é suficiente para melhorar a renda do trabalhador.
Pesquisa da Fundação Seade e do Dieese mostra que a taxa de desemprego recuou em outubro pelo sexto mês consecutivo -passou de 17,9% da PEA (População Economicamente Ativa) em setembro para 17,6% no mês passado. É a menor taxa verificada para o mês de outubro nos últimos quatro anos.
O rendimento médio real dos trabalhadores, entretanto, caiu pela terceira vez consecutiva -a redução foi de 1,6% na comparação de agosto com setembro deste ano. Com isso, o rendimento passou de R$ 1.006 para R$ 990.
"A queda do desemprego é expressiva em relação ao ano passado. São 249 mil desempregados a menos na Grande São Paulo. A taxa em outubro 2003 foi de 20,4%. As vagas criadas, porém, são precárias, com baixo padrão de salários", afirma Anselmo Luis dos Santos, economista e pesquisador do Cesit (Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho), da Unicamp.
Enquanto na média a ocupação cresceu 5,2% entre o mês passado e outubro de 2003, o emprego no setor privado sem carteira assinada aumentou 10,6% no mesmo período. "São vagas em micro e pequenas empresas, em que as condições de trabalho são piores, a informalidade é maior, as jornadas, mais longass e os salários, mais baixos", diz Santos.
O desemprego diminuiu em outubro, segundo a pesquisa, porque o número de postos de trabalho criados (65 mil) foi superior ao de pessoas que ingressaram no mercado de trabalho (43 mil).

Indústria
A indústria foi o único setor que eliminou vagas -12 mil. Comércio, serviços e outros serviços (inclui domésticos e construção civil) criaram postos -respectivamente 18 mil, 18 mil e 41 mil.
"A indústria antecipou as contratações para o segundo trimestre. As admissões para o final do ano já foram feitas. Agora, está freando as contratações e dispensando", diz Clemente Ganz Lucio, diretor técnico do Dieese. Na indústria, a eliminação de vagas foi maior nas empresas dos setores metalmecânico, químico e têxtil.
Para o professor da Unicamp, o fechamento de postos na indústria pode ser um sinal de que a economia não está mantendo o ritmo de crescimento do primeiro semestre, o que põe em xeque a recuperação do emprego.
"A contratação se manteve em patamares elevados, de 85 mil a 90 mil vagas abertas mensalmente, em média, no período de abril até agosto. Em setembro, caiu para 25 mil. Em outubro, para 65 mil. É preciso saber se, com a elevação da taxa de juros, a economia vai manter esse ritmo", diz.
Na avaliação do coordenador da pesquisa do Seade, Alexandre Loloian, para que a renda do trabalhador se recupere, é necessária uma redução ainda mais drástica do desemprego. "É preciso que a economia continue crescendo, que o nível de investimentos aumente e que o desemprego diminua. Dessa forma, cria-se uma situação de disputa pela mão-de-obra. Como a oferta é maior do que a demanda, o empregador pode escolher, o que "achata" ainda mais os salários", diz.
A redução dos rendimentos pode ser reflexo do aumento de vagas para trabalhadores com menor qualificação, segundo informam os técnicos. Em outubro, dos 41 mil postos de trabalho abertos no setor outros serviços, 30 mil foram para domésticos.
Para o Dieese, a rotatividade nas empresas também afeta e dificulta a recuperação da renda. "Quem entra no mercado não recebe o mesmo salário de quem é contratado. Basta verificar que massa de rendimentos [soma de todos os salários] não cresce. Apesar de se contratar mais, a massa de rendimentos não aumenta seu volume", diz Ganz Lucio. Entre agosto e setembro, esse indicador teve redução de 1,3%.

FOLHA DE SÃO PAULO

11.28.2004

País viveu 35% do tempo sob recessão desde 82

Estudo da FGV aponta que Brasil passou por 96 meses de retração, ante 27 dos EUA no mesmo período

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

De janeiro de 1982 até setembro deste ano, o Brasil enfrentou 96 meses de recessão -ou seja, em 35% do período a economia estava encolhendo. Recessões são inevitáveis, ensinam os economistas, mas no caso do Brasil elas parecem um pouco mais inevitáveis do que a média.
No mesmo período, os Estados Unidos enfrentaram três recessões, que consumiram 27 meses. Em média, as recessões brasileiras duraram 15 meses, e as norte-americanas, 9.
A periodização dos ciclos de crescimento da economia brasileira foi feita pelos economistas João Victor Issler (EPGE-FGV), Angelo Duarte (Banco Central) e Andrei Spacov (Universidade da Califórnia), em trabalho publicado em abril deste ano.
O trabalho datava as recessões até 2002. Issler o atualizou a pedido da Folha. Os economistas não usaram o critério popular de caracterizar uma recessão como dois trimestres de retração do PIB (Produto Interno Bruto -soma de todos os bens e serviços finais produzidos em um período). O trabalho, pelo contrário, foi inspirado nos critérios da conceituada instituição norte-americana NBER (National Bureau of Economic Research), que é responsável por "datar" os ciclos econômicos nos Estados Unidos.
A definição: "Uma recessão é uma queda significativa na atividade econômica espalhada por toda a economia, dura mais do que dois meses e é visível no PIB real, na renda, na produção industrial e nas vendas".
Por que não usar apenas o PIB? Porque, apesar de ser um bom retrato da economia, ele pode esconder retrações significativas em algumas áreas. O PIB pode crescer ao mesmo tempo em que a tendência do período pode claramente ser de queda, com o cenário se deteriorando.
Para fazer essa datação no caso brasileiro, os economistas criaram um "Indicador Coincidente de Atividade Econômica", que junta em apenas um índice vários indicadores mensais de atividade. A última recessão brasileira começou em dezembro de 2002, um mês antes de Luiz Inácio Lula da Silva assumir a Presidência, e acabou nove meses depois, em agosto do ano passado. Foi uma recessão de origem interna.

Importadas
Houve recessões "importadas". E por importadas entendam-se reflexos, na economia brasileira, de crises internacionais. Foi assim no começo da década de 80, quando, depois das altas do preço do petróleo e do choque de juros nos Estados Unidos no final da década anterior, praticamente todas as economias latino-americanas e a própria economia dos EUA foram abatidas pela conjuntura ruim.
A hiperinflação e o fracasso dos planos de estabilização em meados dos anos 80 causaram outra crise "legitimamente nacional". A economia encolheu de maio de 1987 a fevereiro de 1989. Cresceu durante seis meses e voltou a recuar a partir de setembro de 1999, em recessão que duraria 18 meses.
Os nove primeiros meses de 1995 também foram de retração, com a economia abatida pela crise mexicana. Outra crise externa, a asiática, geraria outra recessão, que começaria em novembro de 1997 para durar outros 16 meses.

Analistas são unânimes em apontar volatilidade nos últimos anos, mas divergem sobre fim da vulnerabilidade

Economistas só concordam sobre passado

DA REPORTAGEM LOCAL

Não há analista que discorde de que a economia brasileira tenha sido excessivamente volátil nos últimos anos. Na hora de prever o que ocorre a partir de agora, no entanto, os economistas se dividem. Parte avalia que o país é hoje menos vulnerável e, portanto, os "vôos de galinha" tendem a desaparecer. Por outro lado, muitos analistas avaliam que a economia continua desprotegida e sujeita a repetir os ciclos de baixo crescimento das últimas duas décadas.
Mas ressalva-se que ninguém diz que o país deixará de passar por recessões. Recessões fazem parte do mundo capitalista. Os países crescem em ciclos, com períodos de expansão e de retração. O importante é que a tendência de longo prazo, a despeito das oscilações do curto, seja de expansão. Algo que não ocorreu no Brasil nos últimos 20 anos.
Fabio Giambiagi, economista do BNDES, está entre os que vêem com otimismo o quadro atual. Ele lembra que, durante grande parte dos anos 80 e 90, o Brasil conviveu com três problemas crônicos: inflação alta, contas públicas fora do controle e colapso do balanço de pagamentos. Problemas, diz o economista, combatidos em parte a partir de 1994, com o Plano Real, e em parte a partir de 1998 e 1999, com o início do ajuste fiscal e, depois, com a desvalorização do real e a adoção do câmbio flutuante.
"Os três problemas foram atacados. O desequilíbrio fiscal com superávit, a inflação com a estabilização e agora o sistema de metas e o balanço do pagamentos com o ajuste externo [com os superávits da balança comercial] e câmbio flutuante", diz ele.
Giambiagi admite que ainda existem problemas, como o tamanho da dívida pública. Mas ele diz que "saímos de um ponto crítico" e avalia que "vamos nos aproximar mais da situação de um país normal". Explique-se o que significa isso: crescer a taxas não maiores do que 5% ao ano, com inflação sob controle.
O economista do BNDES faz a ressalva de que sempre pode haver pedra no caminho, e o Brasil, como todos os demais países, não sairia imune de uma grande crise internacional, como um ajustamento brusco e desastroso entre o dólar e o euro.
O ex-ministro Luiz Carlos Bresser-Pereira (Fazenda), professor da Fundação Getúlio Vargas, está entre os que dizem acreditar que o Brasil ainda está sujeito a crises e a restrições do crescimento. Apesar de ter resolvido problemas graves herdados dos anos 80 e do início dos 90, como a crise fiscal e a estabilização de preços, o país continua dependente de uma âncora.
"Primeiro, pagamos o preço pela âncora cambial", diz, referindo-se ao período anterior à desvalorização de 1999. "Em 1999, o governo adotou as metas de inflação, uma âncora para substituir o câmbio. Gostaria de que dessem um exemplo de um país grande no mundo que use uma âncora como essa", afirma.
Ele não questiona o compromisso pela estabilidade de preços, mas a rigidez do sistema de metas de inflação, que obriga o governo a elevar juros e a comprometer o crescimento. "Por lei, o banco central dos EUA precisa combater a inflação, manter taxas de juros moderadas e garantir o pleno emprego", diz Bresser, que diz avaliar que nenhuma dessas condições é respeitada pelo governo brasileiro. "Com os juros e emprego nos níveis atuais? Temos um problema de curto prazo que já dura dez anos, que são taxas de juros e de desemprego altas."
João Sicsú, economista da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), prefere contar a história dos "vôos de galinha" da economia brasileira usando como eixo as crises cambiais. Desse ponto de vista, diz ele, o Brasil continua tão vulnerável quanto antes, talvez apenas um pouco menos. "Dependemos muito dos movimentos de capitais", diz o economista.

Arquitetura de blindagem
Para ele, apenas uma "arquitetura de blindagem" poderia tornar a economia menos volátil do que tem sido nos últimos anos. Arquitetura da qual fariam parte uma política de acumulação de reservas internacionais, intervenções cambiais para garantir taxa de câmbio favorável às exportações, melhora da composição da pauta de exportações e controle de capitais de curto prazo.
Já João Victor Issler, da EPGE-FGV, tende a concordar com Giambiagi na sua avaliação. Para o economista, tentar controlar variáveis como câmbio e preços -por meio de congelamento- seria cometer os mesmos erros que, de uma forma ou de outra, levaram o Brasil a crises nos últimos 20 anos. "Se aprendemos algo no Brasil, foi sobre a eficiência do câmbio flexível. Choques são absorvidos ou por preços ou por quantidades. Quando os preços não podem oscilar, a variação na quantidade [e, nesse caso, a perda de produto] é maior", diz.
FOLHA DE SÃO PAULO

11.27.2004

Renda do trabalhador recua 1,2%

Queda reflete contratações na construção civil, que paga salários menores

DA SUCURSAL DO RIO

A melhora do mercado de trabalho, sinalizada pelo recuo do desemprego, ainda não chegou ao bolso do trabalhador. É que a renda não definiu uma trajetória firme de expansão e voltou a cair em outubro -1,2% na comparação com setembro. Em relação a outubro de 2003, porém, o rendimento cresceu 2,6%, no segundo mês consecutivo de elevação.
De acordo com Lauro Ramos, economista do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), o comportamento "errático" do rendimento é "natural" num momento de retomada do mercado de trabalho. Primeiro, diz, cresce o emprego informal, depois a contratação formal. Só por fim é que a renda se recupera, afirma.
Para o IBGE, a queda em relação a setembro está relacionada à forte alta das contratações na construção civil (6,6% ante setembro), que paga salários menores.
O rendimento médio do segmento é de R$ 657,20, enquanto a média geral é de R$ 900,20. No setor privado, os maiores salários estão na indústria -R$ 900,10.
Ramos afirmou, porém, que o rendimento dá sinais de recuperação e que o "próximo passo" da melhora do mercado de trabalho é o indicador definir uma trajetória ininterrupta de crescimento.
Fábio Romão, da LCA, também afirma que o rendimento iniciará, em breve, uma fase duradoura de expansão. Segundo ele, o maior consumo de bens não-duráveis (alimentos, bebidas, roupas e outros), apontado pelas recentes pesquisas de comércio, indica uma reação do rendimento.

Futuro
Embora o rendimento ainda "ande de lado", Ramos disse acreditar que o mercado de trabalho melhorará mais até o final do ano. A taxa de desemprego, prevê, fechará 2004 abaixo de dois dígitos -ou seja, menor do que 10%, patamar nunca atingido na nova Pesquisa Mensal de Emprego, iniciada no final de 2001.
Apesar da queda do número de desempregados -17,9% em relação a outubro de 2003, ou 495 mil pessoas-, Cimar Azeredo Pereira, gerente do IBGE, ressalva que a taxa de desemprego (total de desempregados em relação às pessoas que estão no mercado) segue elevada, na casa de dois dígitos.
Lembrou também que ainda existem 2,271 milhões desempregados nas seis maiores regiões metropolitanas do país, onde a pesquisa é realizada. Apesar disso, Pereira também crê que a taxa de desemprego mantenha o ritmo de queda nos próximos meses, favorecida pelas contratações de final de ano. Como de praxe, ele não arriscou uma projeção.
Romão também não descarta recuo para menos de 10% na taxa: "Essa possibilidade está fortalecida com o resultado de outubro".
Indagado se a alta dos juros poderia frear a melhora do emprego, Ramos respondeu: "Isso pode disciplinar o crescimento, modular, interferir no ritmo, mas a economia continuará crescendo e gerando empregos".
De acordo com Ramos, os dados de outubro são "bastante positivos sob uma série de ângulos". Além da queda do desemprego, destaca o arrefecimento da informalidade. Prova disso é que as contratações com carteira somaram 96 mil em outubro na comparação com setembro, mais do que as sem-carteira e de empregados por conta própria.
Já Pereira afirmou que ainda não dá para falar "em uma formalização do mercado de trabalho", pois na comparação anual as contratações informais ainda superam as informais.
(PEDRO SOARES)

FOLHA DE SÃO PAULO

Desemprego tem a menor taxa em 3 anos

Melhora na economia reduz o contingente de pessoas à procura de vaga em outubro; renda do trabalhador, porém, registra queda

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Com menos pessoas à procura de um trabalho em razão da melhora da economia, a taxa de desemprego caiu em outubro para 10,5%. É a menor marca desde outubro de 2001, quando teve início a nova Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A mesma taxa já havia sido registrada em dezembro de 2002.
Em setembro, o desemprego havia ficado mais alto: 10,9%. Em outubro do ano passado, a taxa fora ainda maior -12,9%. A renda, porém, não seguiu a mesma trajetória positiva e voltou a ter queda: 1,2%.
Ao comentarem a queda do desemprego, especialistas ouvidos pela Folha dizem que a procura por uma vaga caiu em razão da saída do mercado de muitas pessoas que não são chefes de família. A queda ocorreu, afirmam eles, porque as pessoas desistiram de buscar uma recolocação -o chamado desalento, que acontece em tempos de crise na economia.
Esse contingente, afirmam, havia ingressado no mercado durante a crise 2003 para engordar a renda familiar ou compensar a demissão de outro membro da família. Agora, com o início da recuperação, está deixando de buscar trabalho e retomando suas atividades domésticas ou de estudo.
O IBGE considerou positivo o resultado, levando em conta que o desemprego atingiu em outubro o mesmo nível de dezembro, mês que historicamente apresenta a taxa mais baixa do ano. Outro dado favorável foi o aumento no emprego com carteira assinada. "É um comportamento do mercado de trabalho extremamente positivo para um mês de outubro", diz Cimar Azeredo Pereira, gerente da Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE.
Ele afirmou que o fato de a ocupação ter ficado praticamente estável na comparação com setembro -alta de 0,2%, ou apenas 38 mil pessoas- mostra que o desemprego cedeu como conseqüência da menor procura.
De setembro para outubro, 60 mil pessoas saíram do mercado de trabalho. Mesmo com a quase estabilidade em relação a setembro, a geração de vagas continua firme se comparada com 2003 -expansão de 4,2% ante outubro daquele ano, ou 774 mil pessoas.
Divulgado pelo IBGE, o perfil dos que deixaram o mercado de trabalho -jovens, mulheres e com mais de 11 anos de estudo- indica que são pessoas que estavam buscando um emprego para complementar a renda da família.
"Mais cedo ou mais tarde, esse contingente que entrou de forma desesperada no mercado por causa da queda da renda e das agruras da família sairia do mercado de trabalho com o começo da recuperação do rendimento", afirma Lauro Ramos, economista do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Ramos destaca também o aumento das contratações com carteira -1,3% ante setembro e 3,6% em relação ao outubro de 2003. "O mercado está cumprindo sua trajetória de recuperação. Primeiro, foram criados postos de trabalho de péssima qualidade. Agora, começa a crescer o emprego formal", disse. Fábio Romão, da consultoria LCA, ressalta que o "emprego formal nas regiões metropolitanas começa a reagir", fenômeno que já vem acontecendo há algum tempo no resto do país.

FOLHA DE SÃO PAULO

11.26.2004

Neurose ou excesso de segurança?

Medo exacerbado da violência nas cidades pode provocar de síndrome do pânico a hipertensão

O medo excessivo da violência ultrapassa a normalidade quando as atitudes preventivas passam a atrapalhar a vida pessoal, familiar, amorosa e profissional


Ana Paula de Oliveira
da reportagem local

Eu passava mal quando tinha de pegar o trem logo pela manhã. Tinha pavor de alguém me seguir, de ser estuprada. Ia rezando até meu destino. Se eu sentia que alguém tentava falar comigo, minhas mãos gelavam, sentia pânico e tinha taquicardia. De tanto medo, não conseguia nem ler, perdia a concentração."A professora em projetos sociais Elaine Camunha, 29, sente um pavor incontrolável da violência sexual. "Nunca fui molestada."
Ela não dorme sozinha nem entra em bancos desacompanhada e sabe que seu medo exacerbado -até de fantasmas, apesar de nunca ter visto um- a atrapalha. "Eu dependo de outras pessoas para fazer certas coisas, mas não tenho medo de assumir: sou medrosa mesmo e nem por isso me considero neurótica."
A violência em si não é objeto específico da medicina. Contudo, o relato de Elaine resume como o medo da violência urbana pode agir na mente e no corpo dos moradores das grandes cidades.
Assim, o excesso de prevenção, regido pelo medo exacerbado, sem limites e infundado, pode desencadear distúrbios mentais -que vão de neurose e paranóia a síndrome do pânico- e, como conseqüência, causa até transtornos físicos -como úlcera, taquicardia, hipertensão e tensão muscular, queda da resistência e aumento de quadros infecciosos.
Identificar o que são simples atitudes preventivas não é tarefa simples. Segundo especialistas ouvidos pelo Equilíbrio, existe uma linha muito tênue que separa a precaução do medo da violência, cujas atitudes extremas, porém não incomuns, levam o cidadão a se privar até de seu direito de ir e vir. Para a Polícia Militar, não existem excessos em se tratando de segurança, ou seja, vale tudo para se proteger.
Para o psiquiatra Olavo Pinto, do International Mood Center, da Universidade da Califórnia (EUA), as pessoas têm vergonha de procurar ajuda, pois se consideram fracas em relação às outras, já que seus medos são incomparavelmente maiores. "Mas não é sinal de fraqueza, é doença e deve ser encarada como tal."
Mas, então, como estabelecer parâmetros de normalidade? É preciso identificar os gatilhos que levam à neurose -distúrbio cujo uso do termo foi banalizado e hoje é obsoleto na comunidade ortodoxa científica-, que não se desenvolve da noite para o dia, mas é construída ao longo da formação da personalidade, de acordo com o psicanalista Noé Marchevsky, da Sociedade Brasileira de Psicanálise do Rio de Janeiro.
Assim, fica fácil identificar uma neurose legítima quando certos comportamentos começam a atrapalhar a rotina, seja profissional, amorosa ou familiar. "A pessoa normal tem uns tiquezinhos aqui ou acolá. O problema é ela ser dominada pelo medo", diz Marchevsky.

O CORPO SENTE
Quando aumenta a violência, cresce também a ameaça e a prontidão. A resposta orgânica para esse sentimento é o aumento da pressão e da sudorese. A pessoa passa a enxergar mais coisas do que imagina. "A violência deixa as pessoas mais neuróticas. Existe uma inteligência contra a violência, mas o organismo fica ansioso quando não consegue descobrir uma solução inteligente, seja mística, crédula etc", diz Henrique Del Nero, psiquiatra e filósofo, chefe do Departamento de Ciência Cognitiva da USP.
A solução para controlar as fobias, segundo Del Nero, é desenvolver medidas inteligentes que diminuam a ansiedade. "Não é mudando o mundo, mas uma área da realidade."
É o que muita gente tenta fazer quando está ao volante. Com o crescente aumento de roubos a carros parados em faróis, os motoristas tentam se livrar como podem da ameaça. "Estou sempre de vidro fechado, não deixo ninguém andar comigo com o vidro aberto", diz a artista plástica e paisagista Gica Mesiara, 30, que, apesar de não ter medo de malabaristas no farol -"até me divirto"-, não se distrai. "Estou sempre precavida. Até mesmo se vou dar dinheiro para o malabarista ou para uma criança, abro só um pouquinho do vidro", confessa Mesiara, que nunca foi assaltada no trânsito, mas quase na rua. "Fiquei tão nervosa que tive um chilique. O cara foi embora."
O grau de ansiedade -ou o medo da violência- pode até ser medido em "toques". Para testar esse termômetro, experimente encostar subitamente em uma pessoa distraída: provavelmente ela vai pular e dar gritos de susto, com medo de uma agressão.
O índice que mede a violência é também alto e epidêmico. É raro encontrar alguém que nunca foi vítima de violência ou que não conheça alguém próximo que tenha sido -"diferentemente de alguns anos, em que a raridade consistia exatamente no contrário", como afirma o sociólogo Luís Antônio de Souza, pesquisador do Núcleo de Estudos de Violência da Universidade de São Paulo (USP).

INTERRUPÇÃO
Uma das principais questões que devem ser trabalhadas com familiares de vítimas de homicídio é a interrupção do ciclo de violência proporcionada pela agressão, afinal, apesar de parecer lugar-comum, violência gera violência. É natural e até saudável o sentimento de vingança de um parente ou amigo de uma vítima da violência. O problema é quando esse sentimento é colocado em ação. É aí que entram os grupos de apoio, diz o psicólogo Francisco Beltrão, do Centro de Referência e Apoio à Vítima (Cravi), programa de atendimento gratuito da Secretaria da Justiça de São Paulo.
Outra solução é procurar grupos de auto-ajuda como o Neuróticos Anônimos.

MEDO À VENDA
Mercado sempre em alta em qualquer comunidade com níveis altos e constantes de violência, a indústria do medo é lucrativa: blindagem, segurança particular ou comunitária, grades, armas e munição, mesmo no mercado paralelo. "Assim, cresce a paranóia e a neurose. O Estado não dá conta e a pessoa fica cada vez mais agressiva", afirma o especialista em violência da Universidade de Brasília (UnB) Antonio Flávio Testa.
Segundo levantamento do sociólogo e coordenador do Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Michel Misse, o excesso de informação violenta é responsável por gerar medo e neuroses urbanas. "As pessoas têm acesso à informação sem experimentar a situação, pois existe a diferença entre a percepção real, que é como a realidade é interpretada, e a violência real. Em pessoas com predisposição, isso pode desencadear até a síndrome do pânico", diz Misse.

DILEMA
O que poderia ser melhor, menos mal ou pior? Pecar pelo excesso de prevenção -e entra aí viver em uma "ilha" cercada de arames farpados e câmeras de segurança- ou manter um nível razoável de relacionamento social, saindo à noite e até abrindo a janela do carro para dar dinheiro a um pedinte, mesmo se expondo claramente a assaltos? "O ser humano é adaptável e possui mecanismos para conviver com riscos", afirma Antonio Flávio Testa, sociólogo, antropólogo e psicanalista da UnB, para quem o medo é saudável.
"Parte desse medo amputa a vida social, principalmente em comunidades em que os moradores estão entre a polícia e o bandido e não têm a quem recorrer", afirma a psicóloga social Nancy Cardia, da USP.
As pessoas são induzidas a tomar medidas preventivas que, com o tempo, passam a ser automáticas, assim como escovar os dentes.
O medo de as filhas serem assaltadas em sua própria casa, principalmente quando não está lá para protegê-las, fez com que a empresária Carolina Correia Botelho, 29, projetasse um "bunker" -espécie de câmara secreta inviolável utilizada como abrigo em caso de invasão de criminosos- em sua futura casa, em São Paulo. "A sensação de segurança é plena", garante.
"Não abro os vidros de meu carro. É claro que ver crianças pedindo esmola nos faróis toca meu coração, mas sei que, naquele momento, não posso ajudar. É a regra número um dos procedimentos de segurança. Faço minhas ajudas em creches, em escolas. Quando minhas filhas ganham brinquedos novos, doamos os velhos a instituições de caridade", relata Botelho, que anda em carro blindado.

GASTOS SOCIAIS
Além de trazer um sofrimento emocional maior, o aumento da depressão e da ansiedade também eleva os custos sociais. Muitas das principais causas de incapacitação profissional no mundo são problemas mentais. E os sinais da ansiedade são caracterizados por crises de taquicardia, mal-estar abdominal, tensão muscular. Com esses sintomas, vêm a irritação e dificuldade para relaxar diante de situações que gerem medo.
"É quando a pessoa tem a sensação de perder os limites, de não ter mais controle de sua vida", analisa o psiquiatra da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Mário Eduardo Costa Pereira, autor do livro "Pânico e Desamparo".

Saiba mais
@> www.nev.prp.usp.br (Núcleo de Estudos da
Violência da Universidade de São Paulo)
@> www.necvu.ifcs.ufrj.br (Núcleo de Estudos da
Cidadania, Conflito e Violência Urbana da UFRJ)
@> www.justica.sp.gov.br/cravi.htm (Centro de
Referência e Apoio à Vítima - Cravi)

11.23.2004

Pobres são ignorados pelos tais "valores morais"

Conservadores pouco se importam com 12 milhões de famílias

Bob Herbert
Colunista do NYTimes

O ex-senador Phil Gramm, Republicano do Texas conhecido por ser intratável, disse certa vez: "Somos a única nação no mundo em que todos os pobres são gordos".

Esse exemplo particular do conservadorismo piedoso veio à mente quando li o relatório do Departamento da Agricultura mostrando que mais de 12 milhões de famílias americanas continuam lutando, e nem sempre com sucesso, para se alimentar.

As 12 milhões de famílias representam 11,2% dos lares americanos. "Em algum ponto durante o ano", disse o relatório, "esses lares não tiveram certeza de ter comida suficiente para alimentar todos seus membros, por falta de dinheiro ou outros recursos".

Das 12 milhões de famílias preocupadas em ter comida suficiente para colocar na mesa, 3,9 milhões de fato passaram fome em algum momento do ano passado. "Os outros dois terços obtiveram alimentos para evitar a fome usando uma variedade de estratégias", disse o relatório, "tais como comer menor variedade, participar em programas de assistência alimentar federais ou receber comida das despensas da comunidade ou de cozinhas de ajuda emergencial."

Essas são estatísticas lúgubres para um país tão afortunado quanto os EUA. Mas não ouvimos muito falar delas, porque a fome está associada à pobreza, e a pobreza não está nem perto de entrar para o nosso diálogo nacional. Barcos rápidos sim. Cenas de sexo no programa de futebol da segunda-feira à noite, com certeza. A dificuldade de milhões de americanos de se alimentar? Ah, não, isso não.

O que isso diz sobre os valores americanos?

Estamos cercados de pessoas pobres e de baixa renda. (As definições podem ser elásticas e confusas, mas, essencialmente, estamos falando de indivíduos e famílias que não têm dinheiro suficiente para cobrir o essencial --comida, teto, agasalho, transporte, etc.) Muitas trabalham tempo integral e algumas têm mais que um emprego.

Um novo estudo do Centro do Futuro Urbano, um grupo de pesquisa sem fins lucrativos, revelou que mais de 550.000 famílias em Nova York --um quarto de todas as famílias que trabalham no Estado-- teve renda baixa demais para cobrir suas necessidades básicas.

Tivemos uma eleição presidencial duramente disputada, mas este sério problema (que absolutamente não está confinado a Nova York) não fez parte importante do debate.

De acordo com o estudo: "A maioria das famílias de trabalhadores de baixa renda não se conforma ao estereotipo popular dos pobres como jovens, solteiros, funcionários de lanchonetes: 88% das famílias de baixa renda incluem um pai de 25 a 54 anos de idade. Casais formam 53% dessas famílias. Trabalhos indispensáveis, como o de assistente de enfermagem, zelador e funcionário de creche, pagam salário de pobreza."

Em sua introdução, o estudo diz: "O acordo implícito que os EUA oferecem aos seus cidadãos supõe que todo mundo que trabalha duro e obedece as regras poderá sustentar sua família e seguir adiante e para cima."

Se esse era o acordo, foi rompido diversas vezes. Trabalhadores de baixa renda sempre foram alvo de exploração e isso nunca mudou. Steven Greenhouse, do The New York Times, publicou artigo preocupante, na primeira página da edição da última sexta-feira (19/11), sobre funcionários de restaurantes, supermercados, centrais telefônicas e outros que são forçados a fazer hora extra sem receber.

O governo federal não aumenta o salário mínimo desde 1997 e ainda permitiu que algumas empresas se negassem a pagar mais pela hora extra.

O democrata Franklin Delano Roosevelt, em seu segundo discurso inaugural [após ser reeleito presidente em 1936], disse à multidão debaixo da chuva: "O teste de nosso progresso não é se vamos adicionar mais à abundância aos que têm muito; é se vamos prover o suficiente para os que têm pouco demais."

Posso ouvir os políticos de hoje em Washington, rindo à vontade desse sentimento.

Há ativistas e até alguns políticos que trabalham duro para enfrentar uma série de problemas que afligem os trabalhadores e suas famílias. Mas recebem pouca atenção ou recursos dos setores mais poderosos da sociedade. Então, pessoas que trabalham com saúde e não podem pagar um seguro vão continuar esvaziando comadres por uns trocados. E os zeladores vão limpar fielmente a sujeira dos patrões que os ignoram.

São tempos duros para o sonho americano. Mas os tempos mudam, e as pessoas que romperam com o sonho não ficarão no poder para sempre.

Tradução: Deborah Weinberg

The New York Times

11.22.2004

Para mulheres, o divórcio é igual a uma demissão

De que adianta minha formação se larguei tudo para criar os filhos?

Theo Pauline Nestor
Em Nova York

Alguns casamentos vão se degradando até acabarem. Outros, como o meu, explodem no meio do vôo, como uma nave espacial destroçada a céu aberto, enquanto uma multidão chocada observa, descrente. E os destroços perigosos da catástrofe continuam caindo.

Era final de setembro, ainda quente, mas depois do último período de calor forte de verão indiano. Eu tinha esperado um dia fresco o suficiente para assar um frango para meu marido e minhas duas filhas. Quando coloquei o frango de 2 kg no forno, com ervas verdes frescas em seu peito, nosso casamento ainda estava intacto. Quando a tirei, meu marido tinha saído de casa para sempre, o carro lotado de roupas caindo dos cabides.

O golpe fatal foi quando liguei para o banco para saber nosso saldo. Apesar de os impulsos financeiros destrutivos de meu marido terem ameaçado nosso casamento antes, eu achava que aquilo tinha acabado. Mas, naquela tarde, sem nem tentar, descobri a verdade: longe de mudar seus hábitos, ele simplesmente estava escondendo-os mais. Eu o confrontei. E, como dizem, foi isso.

Assim, o frango assado alimentou apenas uma pessoa naquela noite: nossa filha de 9 anos, Elizabeth. Eu não conseguia comer, e nossa filha de 5 anos, Grace, anunciou que não ia comer galinha de verdade, só nuggets. Peguei a caixa vermelha do freezer, tirei cinco quadradinhos amarelados, aqueci-os no microondas e coloquei-os em frente de Grace, que acreditava, como sua irmã, que seu pai tinha ido até o centro para encontrar-se com um amigo e sair em viagem de carro. "Papai vai voltar na próxima semana", disse-lhes. Não sabia o que mais dizer.

Pensei na minha amiga de infância, Nancy, cujo casamento tinha desmoronado um ano antes. Tenho três amigas de infância das quais ainda sou próxima; coincidentemente, nós quatro nos casamos em torno dos 30 anos. Durante 10 anos, vencemos as estatísticas. Então, o casamento de Nancy ruiu e agora o meu. Nosso pequeno grupo passou a refletir a estatística tão citada: metade de todos casamentos terminam em divórcio.

Na cerimônia de casamento de Nancy, o ministro falou brevemente ao grupo reunido. "Cabe à comunidade manter um casal unido", disse ele em tom firme. "Cada um de vocês aqui é responsável por lembrar a este casal do amor que os uniu e o compromisso que fizeram."

Levei suas palavras a sério, silenciosamente prometendo apoiar Nancy e Terry; a lembrar Nancy das qualidades de Terry algum dia, se viesse a falar comigo sobre uma discussão marital. Apesar de seus votos e do meu apoio, apesar de 10 anos e dois filhos, seu casamento não pôde se manter. E agora, apesar de 11 anos e duas filhas, o meu também não.

As mulheres com quem cresci, como a maior parte das mulheres de hoje, têm suas habilidades comercializáveis. Uma é eletricista; outra é artista gráfica; uma terceira é enfermeira. Dentro ou fora do casamento, podem se sustentar. Eu também sou uma pessoa bem formada, com um currículo decente. De fato, eu ganhava mais do que meu marido quando nos casamos. Eu me orgulhava de ser auto-suficiente.

Mas nós dois queríamos que um de nós ficasse em casa com as crianças e decidimos que seria eu. Então, parei de trabalhar e deixei-o nos sustentar. E agora acabei na mesma posição vulnerável que pensava ser o destino apenas das mulheres que se casaram logo após o colégio, sem experiência no mercado de trabalho.

Não que eu teria feito diferente. Valorizo o tempo que passei com nossas filhas mais do que qualquer outra experiência que já tive. Mas para uma mãe dona-de-casa como eu, o divórcio não é só divórcio. É um divórcio e uma demissão, porque você não pode mais manter seu trabalho em casa, aquele para o qual você desistiu de sua carreira.

Quando trabalhava como professora de inglês na faculdade local, chamávamos as pessoas como eu de donas-de-casa deslocadas. Imagino legiões de Betty Crockers de avental, eternamente tirando pó de móveis imaginários, nunca parando de cuidar de um "lar" que não existe mais.

Agora que minha renda minguou para a pensão das filhas e um mísero cheque de "manutenção", preciso deixar esse trabalho e procurar um "de verdade". Adiciono nossos gastos do mês e subtraio a contribuição dele. O total restante indica que, para nos manter sem dívidas, preciso ganhar um terço a mais do que jamais ganhei.

E o divórcio é um trabalho em si, com curso e manual.

Tradução: Deborah Weinberg

The New York Times

11.17.2004

RJ tem 5 mil menores no crime organizado, diz relatório

Uma rede de ONGs internacionais divulgou um relatório que estima que 5 mil jovens com menos de 18 anos estão envolvidos com o crime organizado no Rio de Janeiro.

A rede, chamada Coalizão para Acabar com o Uso de Crianças como Soldados , tem como objetivo impedir que crianças sejam recrutadas para combater em conflito.

O relatório mostra a presença de "crianças-soldados" em vários países. Nos últimos três anos, crianças teriam lutado em 22 conflitos ao redor do mundo.

Com relação ao Brasil, o relatório se baseou em estudos feitos em comunidades carentes do Rio de Janeiro.

Tráfico

No capítulo dedicado ao Brasil, o relatório tomou como referência, entre outros documentos, em um estudo realizado pelo antropólogo britânico Luke Dowdney, pesquisador do Iser (Instituto de Estudos Superiores da Religião) e do Viva Rio.

O estudo resultou no livro Crianças no Tráfico, lançado no ano passado.
A pesquisa analisou entre 5 mil e 6 mil jovens armados e envolvidos com o tráfico no Rio de Janeiro.

Segundo Luke, o número de jovens envolvidos na luta entre traficantes aumentou muito a partir do final dos anos 80.

Ainda no capítulo dedicado ao Brasil, o relatório diz que as medidas de seguranças adotadas pelos governos estaduais para combater a criminalidade resultaram no aumento de casos de violações dos direitos humanos, além da ação dos chamados "esquadrões da morte".

O relatório global sobre "crianças-soldados" inclui dados coletados entre abril de 2001 e março deste ano. Os dados coletados nos países citados pela organização foram fornecidos por diferentes fontes que vão desde agências da Organização das Nações Unidas a reportagens jornalísticas.

A coalizão também tem como um dos seus objetivos fazer com que os jovens que estejam atuando como soldados sejam desmobilizados e reintegrados à sociedade.

A organização lançou um apelo para que o Conselho de Segurança da ONU identifique e leve à Justiça os exércitos ou movimentos rebeldes que utilizem crianças como combatentes.

Publicado na BBCBrasil.com

11.16.2004

Diferença salarial entre homem e mulher persiste nos EUA

WASHINGTON (Reuters) - Todos os Estados norte-americanos reduziram a diferença salarial entre homens e mulheres, mas em nenhum essa disparidade foi eliminada, segundo um estudo divulgado na terça-feira. Um relatório do Instituto de Pesquisa de Políticas para Mulheres, um grupo de pesquisa de Washington, mostrou que no ritmo atual dos salários, vai demorar ainda outros 50 anos antes que as remunerações entre homens e mulheres fiquem iguais nos Estados Unidos.

O relatório usou dados de 2000 da agência do Censo dos EUA e dados de 2002-03 do Estudo de População Atual, uma pesquisa mensal conduzida pelo Censo e pela Agência de Estatísticas Trabalhistas.

Foi descoberto que em todo o país a média salarial para as mulheres em 2002 foi de 76,2 por cento do salário dos homens. A primeira pesquisa do grupo, em 1996, mostrava que as mulheres em 1989 ganhavam 68,5 por cento do salário dos homens.

"As coisas melhoraram em alguns lugares e pioraram em outros, mas onde quer que você vá na América as mulheres são enganadas, a começar por seus salários", disse Heidi Hartmann, economista e presidente do instituto.

Estatísticas sobre a disparidade salarial vêm sendo criticadas por alguns grupos como imprecisas. Por exemplo, o Centro Nacional para Análise Política disse em um artigo de 2002 que "os padrões da vida profissional" das mulheres e a preferência por empregos que ofereçam mais flexibilidade e benefícios no lugar de altos salários afetavam de forma significativa a remuneração.

"A 'disparidade salarial' não tem tanto a ver com a discriminação dos patrões contra as mulheres, e mais com as mulheres fazendo escolhas discriminantes no mercado de trabalho", disse o Centro Nacional para Análise Política. Segundo o estudo do instituto, as mulheres em Washington ganhavam mais e foram as que mais se aproximavam dos homens em questões salariais. Elas ganhavam 92,4 centavos para cada dólar ganho pelos homens por empregos em tempo integral, disse o relatório.

A disparidade salarial era mais acentuada em Wyoming, onde as mulheres ganhavam 66,3 por cento do salário dos homens, mostrou o estudo.

Em alguns Estados, a disparidade salarial era ainda maior quando a raça era considerada, e com mulheres negras e hispânicas em comparação com os homens brancos. Por exemplo, mulheres na Louisiana ganhavam 68,5 por cento do que os homens recebiam, mas negras naquele Estado ganhavam menos.

Reuters Brasil.

11.15.2004

Taxa sindical "come" até 1 mês de salário

Levantamento do governo aponta que entidades cobram de 25% a 40%, na média, de um rendimento mensal

CLAUDIA ROLLI
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

O Ministério do Trabalho constatou que o trabalhador chega a pagar por ano em contribuições sindicais o equivalente ao salário de um mês. A abusividade na cobrança de taxas pelos sindicatos foi constatada em levantamento realizado pelo governo neste ano.
A partir de convenções e acordos coletivos feitos entre patrões e empregados e protocolados nas DRTs (Delegacias Regionais do Trabalho) de todo o país, o ministério verificou que, na média, os sindicatos recolhem no ano -de sócios e de não-sócios- entre 25% e 40% de um salário mensal.
O cálculo leva em conta a cobrança do imposto sindical obrigatório (equivale a um dia de trabalho por ano do trabalhador ou 3,3% do salário de um mês), da contribuição assistencial (cobrada como resultado das negociações salariais feitas pelos sindicatos) e da contribuição confederativa (sustenta a estrutura sindical: confederações nacionais, federações estaduais e sindicatos).
Na assistencial e na confederativa, os valores dependem de negociação com a categoria. A mensalidade arrecadada dos filiados não está incluída nessa conta.
"Esse levantamento, feito por amostragem, revela que há abusividade na cobrança de taxas e que é necessária nova regulamentação para os sindicatos. O abuso não é generalizado, ocorre nos sindicatos menos representativos, que se financiam com recursos de não-sindicalizados", afirma o ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini.
Como a cobrança de taxas varia de sindicato para sindicato, é decidida em assembléias -quando ocorrem- e não há controle sobre a arrecadação das entidades, ninguém consegue saber o tamanho do PIB sindical do país.
O governo só sabe o quanto se arrecada com o imposto sindical. De janeiro a setembro deste ano, foram recolhidos R$ 657,6 milhões. A estimativa é que esse valor chegue a R$ 800 milhões. Desse total, 60% são repassados para os sindicatos; 15%, para as federações; 5%, para as confederações, e 20%, para o Ministério do Trabalho -na conta salário/emprego, gerenciada pelo FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador).
As altas taxas levaram o governo a editar a portaria nº 160, em abril deste ano, para limitar a cobrança das taxas assistencial e confederativa. Por pressão das centrais sindicais, essa norma foi suspensa até maio de 2005, por meio de outra portaria -a de nº 180. O Ministério Público Federal (DF) recorreu à Justiça, e a portaria nº 160 voltou a valer.

Recadastramento
O governo também decidiu fazer um recadastramento sindical a partir de 2005. "É bem possível que existam mais de 18 mil sindicatos no país. Não se sabe ao certo, porque muitos foram criados em cartório e conseguiram obter um código na Caixa Econômica Federal para receber o imposto sindical. Só após a Constituição de 1988 houve a necessidade de obter registro no ministério", afirma Osvaldo Bargas, secretário de Relações de Trabalho. O recadastramento, em elaboração, deve ser feito pela internet.
Uma das entidades que mais cobram taxas, segundo o levantamento do ministério, é o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Papel, Papelão e Artefatos de Papel de Aparecida do Norte e Guaratinguetá (interior de SP).
Com 200 trabalhadores em sua base, dos quais 27 são sindicalizados, o sindicato cobra por mês 3% do salário do trabalhador em contribuição confederativa. Também recolhe o imposto sindical, que corresponde, por ano, a 3,3% de um salário mensal. Somadas as duas taxas, o desconto total, no ano, é de 39,3% de um salário mensal. Isso significa que, se o trabalhador ganha o piso da categoria (R$ 681,91), ele paga anualmente ao sindicato R$ 267,99.

Dependência
"O sindicato só existe porque temos essa contribuição. Não cobramos mais nada do trabalhador. Esse dinheiro é usado para dar assistências médica e oftalmológica. Pagamos metade do convênio para os trabalhadores, que custa R$ 80", afirma Nelson Barbosa, presidente do sindicato.
No Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Gráficas de São Paulo, os sócios pagam por ano 24,3% de um salário mensal em contribuições: 10% de taxa confederativa, 12% de mensalidade, além de 2,3% de imposto sindical -porque devolve, segundo a entidade, 1% para o trabalhador sindicalizado. Já os não-sócios pagam 13,3% em taxas -são 10% de contribuição confederativa e 3,3% de imposto sindical.
Pelas contas de Dino Chiarelli, tesoureiro da entidade, o sindicato arrecada, no ano, de sócios e não-sócios cerca de 15% de um salário mensal. "A nossa principal fonte de recursos é a contribuição confederativa, que rende R$ 1,8 milhão por ano. Se a portaria valer, o sindicato fecha as portas."
Na semana passada, as centrais foram buscar apoio de senadores e líderes de vários partidos para derrubar a portaria. Até quarta-feira, esperam que uma decisão seja tomada. "Não trabalhamos só para os sócios. As campanhas salariais resultam em reajustes para toda a categoria", diz João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário-geral da Força Sindical.
Com a proibição, os sindicatos ameaçam suspender as homologações de não-sindicalizados. "O trabalhador já dá um dia do salário para o sindicato trabalhar para ele. Suspender a homologação é o mesmo que comprar um produto e não recebê-lo", diz Bargas.
A queda-de-braço em torno da revogação ou da vigência da portaria coloca empresas e sindicatos em um "caos contributivo", segundo a Folha apurou com advogados de sindicatos e empresas. Isso porque as entidades que estão fechando acordos e convenções coletivas não sabem se devem ou não incluir nos acordos a cobrança de taxas de não-sócios.
O Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região informa que o acordo coletivo recém-fechado prevê a cobrança da taxa assistencial de sócios e não-sócios. "Vamos cobrar de todos porque isso foi decidido em assembléia", diz Luiz Claudio Marcolino, presidente do sindicato. A contribuição assistencial rende ao sindicato R$ 2 milhões por ano.
FOLHA DE SAO PAULO

Sadia é acusada de levar 300 à falência em MT

Justiça acata ação do Ministério Público segundo a qual empresa persuadiu criadores de frango a fazer "parceria suicida"

HUDSON CORRÊA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM CUIABÁ

MÁRCIA OLIVEIRA
FREE-LANCE PARA A AGÊNCIA FOLHA, EM CUIABÁ

A Justiça Federal aceitou ação contra a Sadia na qual a empresa é acusada de enganar e levar à falência 300 criadores de frango em Mato Grosso, usando como "laranja" empresa fantasma de engenharia rural, de 1991 a 1993.
A acusação é do MPF (Ministério Público Federal), que entrou com ação civil pública no último dia 7 de outubro, aceita pela Justiça. Os criadores são de Chapada dos Guimarães e Campo Verde, região central de Mato Grosso.
O MPF pede na ação indenização total de R$ 20 milhões. O valor, a ser destinado aos produtores e à União, seria pago pela Sadia e pelo BB (Banco do Brasil). Segundo o MPF, o BB fez empréstimo com dinheiro público aos criadores de frango "sob influência do gigantesco grupo econômico" da Sadia.
Os empréstimos, de 1991 a 1993, foram feitos em cruzeiros, o padrão monetário da época. Na ação, o MPF não fez a atualização desses valores. Mas, para os 300 produtores, o pedido de indenização é de R$ 10 milhões.
O dinheiro do empréstimo veio do FCO (Fundo Constitucional do Centro-Oeste), recurso do Ministério da Integração Nacional liberado para investimentos na agroindústria na região -daí o pedido de indenização também para a União.
De 1993 a 2002, o presidente do conselho de administração da Sadia era Luiz Fernando Furlan. Ele deixou o cargo para assumir o Ministério do Desenvolvimento no governo Lula. Furlan não foi citado judicialmente na ação.
O MPF pediu o seqüestro dos bens da Sadia para garantir o pagamento de indenização. O juiz da 2ª Vara Federal de Cuiabá, Paulo Cézar Alves Sodré, determinou que a empresa apresente defesa até o próximo dia 18.
De acordo com o MPF, a Sadia "persuadiu" criadores de frango a participar de uma "parceria suicida", da seguinte forma:
1) Em 1991, diretores da Sadia Agroavícola, sediada em Várzea Grande (MT), fizeram reuniões com produtores rurais de Chapada dos Guimarães e de Campo Verde. Propuseram a eles a construção de aviários. A empresa entregaria pintinhos, ração e daria assistência técnica aos criadores. Crescidos, os frangos seriam comprados pela Sadia, que anunciava um ganho de US$ 5.000 por ano a cada criador;
2) Para construir os aviários, geralmente galpões de 100 m de comprimento por 12 m de largura, a Sadia orientou os criadores a buscarem financiamento do FCO no Banco do Brasil;
3) O projeto técnico para liberação de recursos era apresentado pela Agrisa Engenharia Rural, uma "empresa de fachada", na definição do MPF;
4) A Sadia enviava então ao BB ofícios, um para cada criador, com respectivo laudo técnico da Agrisa, dizendo que tinha "o prazer de encaminhar proposta de financiamento pelo FCO". A empresa anunciava ainda que faria contrato de parceria com o produtor rural. A Agência Folha teve acesso aos documentos;
5) Passado um ano da construção dos aviários, os criadores começaram a ter prejuízos devido ao fato de o projeto da Agrisa ser inviável e também por causa das exigências de investimento impostas pela Sadia, como instalação de ventiladores nos galpões;
6) Os criadores ficaram com dívidas no BB e com a propriedade hipotecada;
7) A Sadia "armou um esquema para produção de frangos a custo baixíssimo", livrando-se do pagamento de mão-de-obra e de empréstimos no banco, deixando o produtor rural na situação de "eterno devedor, quase num trabalho escravo", diz o MPF.

Laudos
"Em vez de lucro de US$ 5.000, passei a ter prejuízo anual de R$ 7.000", afirma o criador José Carlos Alves Ferreira, 55.
Para comprovar que os projetos da Agrisa, apresentados ao BB pela Sadia, eram inviáveis e davam prejuízo, o MPF recorreu a laudos e relatórios da UFMT (Universidade Federal de Mato Grosso), do TCU (Tribunal de Contas da União) e da Famato (Federação de Agricultura de Mato Grosso).
A Famato indica que o criador amargava um prejuízo de R$ 49 por lote de 14 mil frangos que vendia à Sadia. Segundo a entidade, a empresa pagava R$ 1.750 ao avicultor, porém o custo de produção era de R$ 1.799.
A Agência Folha esteve no endereço da Agrisa que consta na ação do MPF. Um vigia que trabalha há 20 anos na rua afirma nunca ter ouvido falar da empresa. Segundo a Junta Comercial de Mato Grosso, a Agrisa não está registrada no órgão. Nos laudos enviados ao BB com pedido de liberação de dinheiro do FCO, não consta o CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) da empresa.

FOLHA DE SÃO PAULO

11.12.2004

2,5 milhões deixaram classe média em 2003

RECEITA ORTODOXA

Estudo da Unicamp revela encolhimento no 1º ano do governo Lula; pesquisador nega tese de "herança maldita"
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

A classe média empobreceu de forma generalizada em 2003, mostra estudo do economista Waldir Quadros, da Unicamp. Mais de 2,5 milhões de pessoas "deixaram" a classe média -integrantes de famílias com renda média superior a R$ 1.000- no ano passado.
Cerca de 57 milhões de brasileiro pertenciam a famílias com esse perfil de renda em 2002. Em 2003, eles eram 54,4 milhões para uma população total de 173 milhões. A classe média portanto, que representava 33% da população total em 2002, passou a representar 31% em 2003.
Segundo o estudo, 928 mil pessoas deixaram a classe média alta, e outras 680 mil que se enquadravam na classe média média em 2002 já não poderiam ser incluídas no grupo no ano passado. Nem a classe média baixa escapou: perdeu 980 mil membros. A maioria esmagadora foi para as classes inferiores.
A perda no padrão de vida da classe média já era algo intuitivo, que analistas e economistas estimavam por conta da queda no consumo. O trabalho de Quadros, professor do Cesit (Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho), baseado nas estatísticas da Pnad 2003, do IBGE, é o primeiro a quantificar as perdas.
Ele divide a população em seis classes, associadas a um padrão de vida -de classe média alta, média média, média baixa, massa trabalhadora, pobres e indigentes. O trabalho assume que, quanto maior a renda, maior o padrão de vida. Algo distinto do conceito de classe social. Há, por exemplo, no estrato mais alto -famílias com renda superior a R$ 5.000- de advogados a operários.
O número de pessoas na classe média alta -com renda média familiar superior a R$ 5.000- caiu 13% no ano passado. Eram 3,96% da população em 2002 e passaram a 3,38% em 2003.
O padrão se repete nas escalas de renda mais abaixo. O grupo que ganhava entre R$ 2.500 e R$ 5.000, que Quadros chama de classe média média, antes 7,10% da população, representava, no ano passado, 6,61% e perdeu 684 mil membros. Desapareceram da classe média baixa 960 mil pessoas. O grupo, com renda mensal que varia de R$ 1.000 a R$ 2.500, representava 22,15% da população em 2002, proporção que caiu para 21,30% no ano passado.
Mesmo para quem se manteve nas faixas de renda em que estava em 2002, houve perda de renda. A renda média das famílias que ganham mais de R$ 5.000, por exemplo, caiu 4,7% em 2003.
O resultado final da perda de renda e emprego -males que afetaram todas as classes de rendimento- foi uma migração generalizada para as faixas de renda mais baixas, com renda inferior a R$ 1.000. O grupo representava 66% da população em 2002, aumentou em 4,8 milhões e passou a representar 68% do total.
Nem todos esses 4,8 milhões são pessoas que perderam renda ou emprego em 2003. Uma parte é explicada também pelo crescimento populacional. "Essa piora é o retrato da política econômica de 2003", diz Quadros, que não admite o argumento de que a piora possa estar relacionada a uma suposta "herança maldita". "O governo atual tem, sim, responsabilidade. Existe uma herança, claro. Mas o governo também fez suas escolhas em 2003", ano em que o PIB caiu 0,2%.
A queda, diz o economista, ocorre de forma acelerada. A recuperação, no entanto, demora mais. Quadros diz que a melhora registrada nos índices de desemprego não está se refletindo em altas significativas da renda. Em setembro, por exemplo, o rendimento dos trabalhadores subiu 3,2% em relação a 2003, ano em que o rendimento havia caído nada menos do que 13%.
Mudar de uma classe de renda para outra, no estudo do economista, não significa uma perda automática de padrão de vida. Uma família pode ter poupança, FGTS, outros investimento, enfim, recursos antes economizados para enfrentar turbulências. Assim, é possível, apesar da perda de emprego e de grande parte da renda mensal, manter certo padrão de vida -mas não indefinidamente.
O quadro torna-se ainda mais preocupante porque a piora já havia sido detectada no ano anterior. A diferença, mostra o estudo do Cesit, é que naquele ano as perdas se concentravam nos principais centros urbanos, com concentração maior em São Paulo. Em 2003, elas foram generalizadas. "Podemos dizer que a Grande São Paulo foi o epicentro da crise, que se espalhou para o resto do país em 2003", diz Quadros.

FOLHA DE SÃO PAULO

11.09.2004

Central ameaça boicote a rescisão de não-filiado

DA FOLHA ONLINE

As centrais sindicais ameaçam boicotar a rescisão dos trabalhadores não-sindicalizados a partir da terça-feira da próxima semana. A medida servirá como instrumento de pressão contra a portaria 160 do Ministério do Trabalho, que proíbe as entidades de cobrarem a contribuição confederativa dos trabalhadores não-sindicalizados.
"Existe um mito de que os sindicatos não trabalham para os não-sindicalizados. Nós não só trabalhamos no acordo salarial dos não-sindicalizados como fazemos as suas rescisões", disse o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna.
Segundo ele, as rescisões dos não-sindicalizados -hoje feitas nos sindicatos- serão enviadas para a DRT (Delegacia Regional do Trabalho). "Vamos ver como é que a DRT dará conta desse trabalho. Ficarão abarrotados de rescisões para homologar."
O boicote aos não-sindicalizados deve ser encabeçado pelos sindicatos filiados à Força, à CGT (Confederação Geral dos Trabalhadores) e à SDS (Social Democracia Sindical).
Na semana passada, eles se reuniram em Brasília com o presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho), Vantuil Abdala, para pedir uma solução para o caso.Segundo as centrais sindicais, essa proibição poderá fechar a maioria dos sindicatos no país, já que os recursos arrecadados com a contribuição representam a maior parte do orçamento.
Publicado na FOLHA DE SÃO PAULO

Metrópoles concentram alta do emprego informal

Estudo do Ipea de 92 a 2002 revela aumento da informalidade nas cidades

PEDRO SOARES
DA SUCURSAL DO RIO

Principal fator de deterioração do mercado de trabalho nos anos 1990, a informalidade cresceu especialmente nas grandes metrópoles e atingiu 52,6% do total trabalhadores em 2002, segundo estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), com dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios).
Dez anos antes, em 1992, o percentual de trabalhadores informais era menor: 51,9%. Em 1997, a cifra era praticamente a mesma registrada em 2002 -52,7%.
Em número absolutos, 36,3 milhões de brasileiros estavam, em 2002, empregados sem carteira assinada ou trabalhando por conta própria, os chamados biscates, categorias incluídas pelo Ipea no contingente de informais.
De acordo com o Ipea, os grandes centros urbanos foram os responsáveis pela "explosão" da informalidade que varreu o país na década passada e ainda continua a se expandir.
Prova disso é que nas seis mais importantes regiões metropolitanas do país -São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife e Salvador- houve aumento da informalidade, enquanto no resto do país o caminho foi o inverso.
Nas seis regiões, a informalidade subiu de 38,3% em 1992 para 45% em 2002, considerando os dados da Pnad, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Segundo a PME (Pesquisa Mensal de Emprego) -também do IBGE, mas pesquisada mensalmente nas seis áreas metropolitanas citadas-, saltou de 41% para 50% no período.Já no resto do Brasil, a informalidade caiu de 58,5% em 1992 para 56,4% dez anos depois, embora ainda esteja num nível mais elevado do que as grandes metrópoles.
Responsável pelo estudo, Lauro Ramos, economista do Ipea, disse que os motivos da trajetória distinta de metrópoles e interior são a migração da indústria dos grandes centros às cidades menores e a expansão do agronegócio exportador. De saída especialmente da Grande São Paulo, a indústria partiu para o interior do Estado, Paraná, Mato Grosso do Sul e com menos intensidade para Minas Gerais e Bahia.
Outro fator que explica os comportamentos diferentes, diz Ramos, é o fato do emprego formal ter crescido mais no interior -30,2% de 1992 a 2002, contra 8,7% nas seis principais regiões metropolitanas do país. Na média, a expansão do emprego formal no Brasil ficou em 22,7%."Não quer dizer que o problema da informalidade não exista. Longe de mim dizer isso. Mas menos mal que ele não tenha ocorrido fora das metrópoles", afirma Ramos.
Ainda menos formalizado do que a indústria, o setor de serviços registrou queda no número de trabalhadores informais -de 53,5% em 1992 para 52,4% em 2002. Já na indústria, setor mais formal da economia, aumentou o total de empregados na informalidade, de 33% para 36,3%.
O Ipea também estudou a evolução do grau de informalidade por regiões. O maior nível de informalidade está no Nordeste, onde 67,8% dos trabalhadores ou eram conta própria ou não tinham carteira assinada. Esse percentual era mais alto em 1992 -68,6%.Já no Sudeste, ainda na liderança da formalidade, 45,2% das pessoas estavam no setor informal da economia. Houve crescimento, porém, em relação a 1992, quando o percentual era de 42,7%.
Publicado na FOLHA DE SÃO PAULO

11.06.2004

Aumenta o uso de drogas pelos jovens e pobres

Le Monde
Pesquisa aponta que maior parcela de usuários tem de 15 a 24 anos
Paul Benkimoun
Em Paris
O relatório das pesquisas para o ano de 2003 do Observatório francês das drogas e das toxicomanias evidencia que os usuários de drogas que têm entre 15 e 24 anos, bem mais numerosos, adotaram um comportamento específico: 85% dentre eles consomem maconha, uma maior quantidade de ecstasy e, sobretudo, na proporção de um terço dentre eles, uma droga chamada Subutex. Eles são mais novos, consomem com freqüência vários tipos de drogas e se encontram numa situação social muito mais precária do que os seus colegas mais velhos. Este rejuvenescimento da população dos toxicômanos na França é o fenômeno mais marcante em 2003, segundo o relatório nacional do dispositivo Trend (iniciais de Tendências Recentes e Novas Drogas), que o Observatório Francês das Drogas e das Toxicomanias (OFDT) acaba de disponibilizar para o grande público no seu site (www.ofdt.fr). As outras tendências são a continuidade da progressão do uso da cocaína e a nova paixão pelo consumo de substâncias alucinógenas naturais (cogumelos).
O relatório Trend faz a síntese dos dados que foram fornecidos por uma rede nacional de 12 centros de observação na França (dos quais 9 ficam em regiões metropolitanas), que realiza, entre outras, a pesquisa conhecida pelo nome de "primeira linha", por meio do dispositivo de observação das drogas de síntese e, por fim, por meios de parcerias como órgãos públicos.Ele "tem por objetivo fornecer de maneira precoce informações sobre os usos e os usuários de drogas ilícitas e sobre os fenômenos emergentes que estão vinculados e este universo", precisa Jean-Michel Costes, o diretor do OFDT, um organismo financiado pela Missão interministerial de luta contra as drogas e a toxicomania (MILDT).
O trabalho de observação foi desenvolvido em dois meios distintos. O primeiro é o espaço urbano, que corresponde a uma população estimada em 160 mil pessoas e que era dominada, no passado, pelos consumidores de heroína. As informações sobre este espaço são obtidas junto a estruturas conhecidas pelo nome de "de baixo patamar", em primeira linha para o atendimento dos toxicômanos, e para observações de comportamentos na rua ou de moradias marginais.O segundo meio é o "espaço festivo", principalmente onde se toca música "tecno", que abrange as "free parties" (festas de arromba), as "raves", os "teknivals" (festivais tecno), assim como as discotecas, as boates e os bares.
O relatório para o ano de 2003 evidencia um rejuvenescimento das populações encontradas nas ruas ou nas estruturas "de primeira linha" (lojas especializadas, programas de trocas de seringas).
De fato, as observações do dispositivo Trend permitiram identificar três subgrupos de jovens usuários que não apareciam de maneira significativa anteriormente. Um primeiro subgrupo é constituído por "pessoas fortemente marcadas pela cultura "tecno", e que reivindicam certas formas de marginalidade" (andanças sem rumo, nomadismo).
Um segundo subgrupo é representado por pessoas em situação de ruptura com a sua família e cujo nível de inserção social é bastante reduzido. O terceiro é constituído por pessoas recém-imigradas, em particular provenientes dos países do leste europeu, e que preferem geralmente consumir estimulantes. Os dois primeiro subgrupos encontram-se na intersecção dos dois espaços estudados --urbano e "festivo"--, o que tem por efeito de reduzir as diferenças antes existentes entre as diferentes práticas e formas de consumo.
Menos opiáceosAs práticas destes jovens que têm entre 15 e 24 anos diferem em parte daquelas dos seus colegas mais velhos. Praticamente, a totalidade dentre eles consumiu tabaco (92%), maconha (85%) e álcool (80%) no decorrer do mês que antecedeu a sua entrevista. É dentro desta faixa de idade que a proporção de usuários cotidianos de maconha é a mais elevada (68%, contra 61% entre os que têm 25 anos ou mais).
Da mesma forma, no decorrer do mês que antecedeu a pesquisa, a taxa de consumo de estimulantes e de alucinógenos foi mais importante do que para os usuários mais velhos, diferentemente do que tem sido observado para os opiáceos.
Os estimulantes mais utilizados pelos jovens de 15 a 24 anos são o ecstasy (59%, contra 23% para os que têm 25 anos ou mais) e o cloridrato de cocaína --sob forma de pó-- (42% contra 33%). Os cogumelos figuram no topo da lista dos alucinógenos (30%, contra 9% entre os mais velhos), seguidos pelo LSD (23% contra 7%).
Consumindo menos opiáceos, com exceção do "rachachá" (um derivado da papoula, apelidado de "ópio de nível inferior"), os jovens toxicômanos utilizam --na proporção de um terço dentre eles-- a buprenorfina de alta dosagem (Subutex), desviada de seu uso como tratamento de substituição, sendo que um quarto dentre eles consome heroína.
O modo de consumo privilegiado dos jovens de 15 a 24 anos é o "sniff" --consumo por via nasal-- (57% contra 28% dos que têm de 25 anos para mais), enquanto 28% praticam a injeção de drogas (contra 40% dos mais velhos).Por fim, nesta população jovem, a taxa de infecção pelos vírus da Aids (6%) ou das hepatites B e C (3% e 17%) permanece reduzida, mas estes números devem ser considerados de forma não tão absoluta e mais relativa: cerca de um jovem em cada dois apenas praticou uma vez na sua vida um teste de detecção.

Alucinógenos naturais
O resto desta vasta pesquisa confirma vários fenômenos. Diferentemente do que tem sido observado para a heroína, que vem regredindo no espaço urbano sem progredir de maneira significativa no espaço festivo, o uso de cocaína continua a sua progressão, nestes dois meios. Tanto num como no outro, mais de um terço dos usuários consumiu cocaína no decorrer do mês que antecedeu a pesquisa enquanto "os perfis sociais dos usuários deste produto vêm se diversificando", constatam os autores do relatório, uma vez que o consumo da cocaína envolve tanto marginais quanto pessoas de renda elevada. Vale notar, por fim, que o Subutex se tornou "o opiáceo mais consumido em relação à heroína, e que no decorrer do mês que antecedeu as entrevistas, 4 toxicômanos entre 10 o consumiram".Uma última tendência marcante evidenciada por este relatório é a moda dos alucinógenos naturais. "Os cogumelos alucinógenos beneficiam de uma imagem positiva entre os consumidores, que os assimilam com freqüência a produtos "biologicamente corretos".
Mais desvencilhados do tráfico do que outras substâncias ou ainda, mais acessíveis pela Internet, eles são também objeto de uma colheita de estação", explica o médico Pierre-Yves Bello, um dos responsáveis do dispositivo Trend. Classificadas como entorpecentes, estas substâncias são consumidas sobretudo no espaço festivo, assim como no espaço urbano (14% disseram ter consumido cogumelos no decorrer do mês que precedeu a pesquisa).
Perda dos vínculos sociais
Os jovens usuários de drogas, dos quais o relatório Trend para o ano de 2003 sublinha que seu número aumentou, não diferem dos seus colegas mais velhos apenas por causa da natureza diferente dos produtos que eles consomem. Os pesquisadores sublinham que a "situação de sofrimento social", entre os jovens na faixa de idade de 15 a 24 anos no quadro da população estudada, é mais importante do que para os que têm 25 anos e mais. A pesquisa que se aplica aos usuários das estruturas "de primeira linha" evidencia o perfil-tipo de um homem (80% dos usuários), cuja idade média é de cerca de 30 anos, desempregado e cujo nível de estudos é equivalente ao ensino médio incompleto.
Mas a situação parece ser pior entre os mais jovens. Mais de 6 entre 10 entrevistados declararam viver num alojamento precário ou não tem alojamento nenhum, contra um pouco mais de 4 entre 10 para os seus colegas mais velhos. Enquanto eles representam 26% da população estudada, os jovens de 15 a 24 anos representam mais de 45% das pessoas que disseram não beneficiar de nenhuma cobertura social. Por fim, 37% dos jovens de 15 a 24 anos declararam não dispor de nenhum recurso financeiro, contra 8% entre os que têm mais de 25 anos, que podem beneficiar da renda mínima de inserção (RMI - auxílio proporcionado pelo Estado).
Tradução: Jean-Yves de Neufville

11.05.2004

Esquerda dos EUA perdeu contato com os pobres

Le Monde

Esta é a explicação mais plausível para vitória de George W. Bush

Editorial

O Ohio, onde finalmente foi decidida a eleição presidencial americana, perdeu milhares de empregos industriais ao longo dos últimos quatro anos.Esse Estado que pertence ao "cinturão enferrujado", onde estão concentradas principalmente as fábricas de aço e as montadoras de automóveis, é aquele cujos operários não foram beneficiados com a retomada econômica e, pelo contrário, sofreram com os recuos da industrialização e os deslocamentos de empresas para o exterior. Esse Estado --apesar de tudo-- votou em favor de Bush, que venceu com 51% dos votos.
A lição da derrota de John Kerry é a de que o Partido Democrata perdeu o contato com as classes laboriosas americanas. Trata-se de uma lição que vale também para os outros países ocidentais. Desde o início do século passado, os partidos social-democratas optaram por definir como prioridade a luta pelo progresso social.
Os compromissos econômicos e sociais foram mais ou menos favoráveis a uma tal meta, conforme as épocas e as relações de força entre as forças em presença, mas, independentemente das decepções que elas sofreram, as classes operária e média tinham o sentimento de estar sendo representadas pelos partidos da esquerda.
Será que a nítida vitória de George W. Bush permite prever um questionamento deste esquema? Em todo caso, ao que tudo indica, a conexão centenária entre a esquerda e os votos populares, foi rompida.Sem dúvida, esta configuração pode ser em parte explicada pela personalidade de John Kerry, que teve muitas dificuldades para se apresentar como sendo o representante das classes americanas mais desfavorecidas.
Os democratas só conseguiram vencer nas ricas regiões "fronteiriças" do Nordeste e da Califórnia, onde as populações gozam de um nível de vida e de educação muito elevado. Eles perderam pontos decisivos junto aos operários, entre os latinos (que costumam trabalhar, na maioria dos casos, nos empregos mais precários) e entre os negros.As razões para tanto devem ser buscadas em primeiro lugar nos discursos contraditórios e inadequados dos dirigentes democratas. Entre a linha de um Bill Clinton, que faz o elogio da globalização, e a de um John Edwards, o candidato à vice-presidência de John Kerry, que evoca o protecionismo para defender o emprego, o partido ficou totalmente dividido.
Os democratas perderam sua credibilidade ao ficarem sem coerência na escolha das prioridades que colocavam no cerne de sua ação, da sua política econômica e social.
Em segundo lugar, elas também se concentram no fato de o jogo político ter sido habilmente deslocado para fora da economia pelos estrategistas republicanos. George W. Bush venceu apostando na defesa dos "valores morais" da família e da fé, sendo que este deslocamento tinha por objetivo ir ao encontro de uma América que havia se tornado, ou havia permanecido, fundamentalmente conservadora em relação a essas questões. Quatro milhões de eleitores cristãos evangélicos que se abstiveram em 2000 responderam, desta vez, favoravelmente, o que lhe permitiu vencer no Kentucky, no Arkansas e naqueles Estados do "cinturão da Bíblia" que no passado eram favoráveis a Clinton (no atrasado sul do país).
Para retomar o contato com o eleitorado popular, o Partido Democrata deverá reencontrar uma coerência econômica e investir, por sua vez, ele também, no campo dos "valores". Mas existe o risco de que ele seja seduzido por uma linha populista e que ele renuncie às suas origens. A sua política deve ser a da defesa das liberdades, no momento em que estas estão ameaçadas em nome da luta contra o terrorismo. Tradução: Jean-Yves de Neufville

Criados novos 337.000 empregos nos EUA em outubro

Washington, 5 nov (Agencia EFE).
A economia dos Estados Unidos criou em outubro 337.000 empregos, segundo informou nesta sexta-feira o governo, enquanto o Federal Reserve (Fed, banco central americano) prepara sua reunião da próxima semana na qual deve continuar seus ajustes gradativos da política monetária.No entanto, o Departamento de Trabalho informou que o índice de desemprego subiu no mês passado um décimo e ficou em 5,5%, um aumento devido provavelmente ao fato de mais gente ter procurado trabalho.O relatório do governo também corrigiu os números de agosto e setembro que agora mostram um aumento de 115.000 postos de trabalho nesses dois meses.O aumento de postos de emprego foi duas vezes maior que o esperado pelos analistas, e o maior registrado desde março.Os analistas esperavam que em outubro a economia tivesse criado cerca de 175.000 empregos e que o índice de desemprego ficasse em 5,4%.Terça-feira e quarta-feira da próxima semana o Comitê de Mercado Aberto do Federal Reserve analisará a situação do emprego, a inflação e as perspectivas econômicas e os analistas esperam outro ajuste da política monetária que deve subir de 1,75% para 2% a taxa de juros interbancária.O relatório sobre o desemprego sustenta a opinião do Fed que a economia segue crescendo em um ritmo razoável e não será interrompido por outro aumento nos juros que, no entanto, pode contribuir para diminuir o risco de um impulso inflacionário.O crescimento do emprego teve uma média de 225.000 postos nos últimos três meses, comparado com uma média de 141.000 nos três meses até setembro.Os economistas calculam que o país deve criar pelo menos 150.000 empregos mensais para acompanhar o crescimento da população.Além disso, as cifras do Departamento de Trabalho indicam que, depois dos furacões que afetaram a Flórida e outras regiões do sul do país em agosto e setembro passados, houve um aumento da contratação de trabalhadores em trabalhos vinculadas à construção.Outro relatório do Departamento de Trabalho divulgado nesta quinta-feira mostrou que a produtividade cresceu, durante o trimestre de julho a setembro, no ritmo mais baixo em três anos, o que indica que as empresas chegaram quase ao limite do que podem obter de sua força de trabalho e em breve teriam que começar a contratação de mais trabalhadores para atender à demanda.Nos doze meses anteriores a setembro, a economia dos Estados Unidos criou 1,98 milhões de empregos, um dado repetido pelo presidente George W. Bush durante a campanha eleitoral que lhe deu um segundo mandato na Casa Branca.Mesmo assim, ainda fica um saldo negativo de 371.000 empregos perdidos desde que Bush chegou à Casa Branca em janeiro de 2001.Os furacões no sudeste durante setembro causaram um aumento de 71.000 empregos na construção, o maior salto desde março de 2000, da mesma forma que outros empregos vinculados à limpeza.O emprego no setor de serviços, que inclui o comércio varejista, os bancos e as agências do governo, aumentou em 272.000 no mês passado, depois de um aumento de 143.000 em setembro, o maior desde abril.O setor de manufatura perdeu 5.000 empregos durante outubro, após um diminuição de 14.000 no mês anterior.Em outubro, a remuneração horária média subiu cinco centavos ou 0,3% e ficou em 15,83 dólares. Os salários média subiram 2,6% no último ano, o maior avanço em quatorze anos, mas isto significa que apenas se mantêm acompanhando a inflação.

11.03.2004

Lojas repõem emprego com temporários e renda menor

Vagas para o Natal devem crescer até 75% neste ano em relação a 2003

CLAUDIA ROLLI
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL

O emprego temporário no comércio para atender a demanda de final de ano crescerá de forma significativa neste ano em relação ao fraco ano passado por conta da recuperação da economia. Nas lojas de shoppings, a expectativa é de aumento de até 75%.
O que parece ser mais um bom indicador econômico esconde, entretanto, uma má notícia. As lojas reduziram muito os seus funcionários e agora precisam contratar temporários para repor os empregos liqüidados. Foram extintos 40 mil postos de trabalho na cidade de São Paulo nos últimos quatro anos, considerando o mesmo número de lojas.
Para repor parte dessas demissões, os lojistas estão contratando temporários que ganham menos do que os funcionários com carteira e impondo jornadas de trabalho mais longas. Pior: eles não têm planos para que os temporários sejam efetivados em 2005, segundo a Folha apurou.
Os comerciantes de São Paulo devem contratar 35 mil temporários -8,5% do total de empregos do comércio na cidade- neste final de ano no município de São Paulo. Isso significa 75% a mais do que em igual período do ano passado, segundo levantamento do Sindicato dos Empregados no Comércio de São Paulo. A Casas Bahia, por exemplo, abriu na semana passada 2.000 vagas para temporários. O grupo Pão de Açúcar, 6.000. O melhor ano para o comércio de São Paulo foi 2000, quando foram criadas 80 mil vagas temporárias no final de ano.
Os lojistas de shopping centers estimam que serão abertas 70 mil vagas temporárias em 58.630 lojas espalhadas por 572 estabelecimentos do país. Em 2003, foram criadas 40 mil vagas. Mas boa parte desse crescimento se deve à abertura de 18 shopping centers no país. "Essas vagas surgiram mais em função dos novos estabelecimentos do que pela recuperação econômica", diz Nabil Sahyoun, presidente da Alshop (associação dos lojistas de shoppings).
Na tentativa de reduzir custos e se tornar mais competitivo, o comércio trocou empregos com salários mais altos por mais baixos.
"No comércio, a maioria dos demitidos está na faixa salarial de R$ 1.100 a R$ 1.200. Já os contratados, na faixa de R$ 600 a R$ 700. Isso ocorreu principalmente de junho de 2003 até maio deste ano em todos as funções. Essa tendência só foi interrompida porque o frio mais intenso melhorou as vendas neste ano", afirma Ricardo Patah, presidente do sindicato.
Segundo o sindicalista, a situação do emprego no comércio só não é pior porque os supermercados abriram mais lojas e multinacionais entraram nas vendas de materiais de construção e produtos de decoração e jardinagem.
Ganhando menos do que o trabalhador registrado e mais "precavido" com o dinheiro no bolso, o empregado temporário vai usar o salário para quitar dívidas e não para consumir, segundo economistas consultados pela Folha.
"O temporário não vai fazer um crediário nem torrar o salário em um mês se já sabe que em janeiro não tem mais emprego. Por isso, o impacto dessas contratações para a economia é muito pequeno", afirma Clemente Ganz Lúcio, diretor-técnico do Dieese.
"O emprego temporário não vai se sustentar porque a recuperação da renda do trabalhador e da massa salarial [soma de todos os salários dos trabalhadores] é tímida", diz o economista Claudio Dedecca, professor do Instituto de Economia da Unicamp.
Ele cita como exemplo a massa de rendimento dos trabalhadores ocupados na Grande São Paulo. Em janeiro deste ano foi de R$ 6,13 bilhões. Em agosto foi de R$ 6,39 bilhões -se manteve praticamente estável. Ou seja, apesar do aumento do emprego, a massa salarial pouco se alterou.
"Para que o emprego temporário do final do ano pudesse ser mantido no início de 2005, seria necessário que essa massa salarial tivesse um crescimento de, no mínimo, 10% neste ano. A renda tem de crescer em um ritmo maior do que o do emprego. Mas hoje não é isso o que ocorre", diz Dedecca.

Na indústria
As contratações de temporários na indústria foram mais concentradas no início do segundo semestre, já que as empresas precisam se preparar antes para atender as encomendas do comércio. A estimativa é que o aumento foi de 4% a 5% sobre o ano passado.
"As vagas temporárias na indústria ocorreram principalmente nos setores sazonais, como bebidas e alimentos [produtos natalinos]", diz Claudio Vaz, presidente do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo).
Contratos por tempo determinado também ocorreram em setores que tiveram bom desempenho por causa das exportações -caso das indústrias de automóveis e agronegócios.
A DaimlerChrysler (Mercedes-Benz) anunciou na semana passada a contratação de 650 trabalhadores pelo prazo de um ano para a fábrica de São Bernardo, onde produz caminhões e ônibus.
No ABC paulista, a agência de emprego Adecco recebeu nos últimos dois meses pedido das indústrias para contratar trabalhadores temporários para o setor de cosméticos e de embalagens.
"São vagas com base na lei nº 6.019, que regula o trabalho temporário. O salário é de R$ 550. Por dia, recebemos cerca de 40 candidatos interessados em uma vaga temporária", diz Renato Frausto, gerente de uma filial da Adecco.
A lei citada, de 1974, autoriza admissão de temporários por aumento da produção e da demanda e em substituições legais (férias e licença-maternidade).

FOLHA DE SÃO PAULO