7.23.2004

Novo trabalho paga menos que R$ 260

Maioria das novas vagas tem remuneração inferior a um salário mínimo

DA SUCURSAL DO RIO

O crescimento do emprego nas seis maiores regiões metropolitanas do país em junho deu-se basicamente por meio da criação de vagas com uma remuneração inferior a um salário mínimo (R$ 260), segundo os dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Em junho deste ano, foram criadas 589 mil novas vagas nas seis áreas abrangidas pela pesquisa em relação a junho do ano passado- um aumento de 3,3% no total de trabalhadores.
Entretanto, 454 mil destes novos empregados tinham remuneração menor do que um salário mínimo/hora por hora trabalhada. Isso significa que 77,1% daqueles que conseguiram um emprego no período receberam menos de um salário mínimo proporcionalmente às horas que trabalharam.
Na avaliação do diretor do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), João Sabóia, este fenômeno explica o fato de a renda ainda estar em queda, embora em trajetória de recuperação.
Em junho deste ano, a renda média caiu 0,5% em relação a junho do ano passado, já descontada a inflação do período -a menor redução já apurada desde o início da série histórica do indicador, em março de 2003.
Na média, cada trabalhador recebeu o equivalente a 3,5 salários mínimos (R$ 886,60). Em relação a maio, a renda média aumentou 1,8%, após ter caído nos dois meses anteriores.O contingente de trabalhadores que não chegou a receber um salário mínimo também aumentou em relação ao total de ocupados.
Este grupo passou a responder por 15,5% do total de trabalhadores em junho deste ano. No mesmo período do ano passado, eles eram 13,5%.O salário mínimo subiu para R$ 260 em 1º de maio deste ano. Em 2003, o mínimo foi reajustado em 20% e passou de R$ 200 para R$ 240. (APG)
FSP, 23/07/2004

Problemas financeiros e de saúde aumentam suicídios no Japão

Por Natasha Brereton

TÓQUIO (Reuters) - O número de suicídios no Japão aumentou 7 por cento, alcançando o recorde de quase 35.000 pessoas no ano passado. Um número crescente de pessoas tirou a própria vida por causa de problemas financeiros, disse a Agência Nacional de Polícia.
Problemas de saúde foram o motivo mais comum, responsáveis por quase 45 por cento dos 34.427 suicídios em 2003. Mas os que cometeram suicídio para fugir de dívidas ou de outras preocupações econômicas totalizaram mais de um quarto dos casos, segundo um relatório da agência divulgado pela mídia japonesa na sexta-feira.
Alguns especialistas, no entanto, disseram que uma reviravolta na economia há tempos estagnada do Japão poderia reverter o cenário neste ano.
"Agora é provavelmente o pico", disse Yukio Saito, chefe do hotline "Inochi no Denwa" (Telefone da Vida), acrescentando que ainda levará um tempo antes que a recuperação econômica se reflita em números.
O aumento eleva a taxa de suicídio do Japão para 27 em cada 100 mil pessoas -- uma das mais altas do mundo.
Uma constatação inquietante foi que o suicídio entre alunos do ensino básico aumentou 60 por cento, para 93 casos, enquanto entre alunos do ensino médio houve um salto de 30 por cento, para 225 casos.
"As crianças são muito facilmente influenciadas pelo ambiente que as cerca", disse Saito. "Se o suicídio entre os adultos aumenta, o suicídio infantil também cresce".
A cobertura da mídia de suicídios cometidos por crianças ou astros também provoca imitações, afirmou.
Um aumento agudo de suicídios foi registrado entre adultos que não conseguiram encontrar trabalho. Mais de 70 por cento das vítimas de suicídio eram homens.
Não há proibição religiosa contra o suicídio no Japão e tirar a própria vida costuma ser visto como um modo de escapar do fracasso ou de poupar entes queridos do constrangimento.
O número de suicidas japoneses é praticamente igual ao dos norte-americanos, mas os Estados Unidos têm o dobro da população do Japão.

UOL ÚLTIMAS NOTICIAS, 23/07/2004

7.16.2004

Brasileiro relata morte em jornada aos EUA

Em entrevista à Folha, imigrante ilegal conta como um dos companheiros de travessia morreu


FABIANO MAISONNAVE
DA REDAÇÃO

Um companheiro morto, seis horas enclausurados dentro de um caminhão sob o sol do deserto e mais oito dias preso em cadeias americanas sem falar inglês. Esse é o saldo da desastrada jornada de um grupo de 29 imigrantes brasileiros rumo ao sonho americano, com escala na fronteira mexicana.
Em entrevista à Folha ontem, por telefone, o mineiro Tiago (nome fictício), 41, relata a trajetória desde o contato com os agenciadores no Brasil até a libertação pela imigração americana, no Texas.
Emocionado, ele conta em detalhes como ocorreu a morte do paulista Ricardo Luiz Ignacio, 31, perto da cidade de El Paso (Texas), na fronteira com o México. Foi o terceiro brasileiro a morrer tentando chegar aos EUA dessa forma nas últimas semanas.Seu corpo foi encontrado no último dia 3 pela polícia americana, mas não se sabia que ele pertencia ao grupo de 28 imigrantes ilegais brasileiros presos na mesma região dias depois.
Arrependido, Tiago não quis aproveitar uma oportunidade rara: em vez de ficarem presos até serem deportados, como ocorre normalmente, os brasileiros ilegais foram soltos com o compromisso de comparecer a uma audiência dentro de 30 dias.Vinte e três brasileiros aproveitaram a brecha e seguiram em direção a Boston, conforme haviam planejado. Outros três não foram soltos por serem reincidentes.
Tiago e um amigo, porém, pediram às autoridades americanas autorização que ficassem presos até serem deportados. Não conseguiram. "Expulsos" da cadeia anteontem, tentam agora reunir dinheiro para voltar ao Brasil.
Pai de três filhos entre 9 e 15 anos, o pequeno comerciante de Mendes Pimentel (MG) disse que não desembolsou um centavo pela viagem -os US$ 10 mil seriam pagos em dez parcelas mensais com o dinheiro ganho nos EUA.Tiago disse que não havia outra forma, pois seu ganho mensal no Brasil não chegava a R$ 300.
Para o historiador da USP José Carlos Meihy, autor do recém-lançado "Brasil Fora de Si", sobre imigrantes brasileiros em Nova York, trata-se de um esquema recente e perigoso: "O que acontece é que as "agências" passam a financiar passagens e estabelecem um acordo que envolve inclusive casas de envio de dinheiro dos EUA para o Brasil. É um novo sistema de dependência que pode ser equiparado à escravidão, pois as pessoas se endividam até em 60 meses para pagar aos "mediadores", e seus familiares, no Brasil, ficam como verdadeiros reféns".
A DECISÃO - Eu tenho amigos que foram para lá [Boston], então eu queria ir para ver se eu melhorava a vida, sabe? Sou casado, tenho três filhos, eu queria dar uma vida melhor para eles.
PAGAMENTO - O pagamento era parcelado: US$ 1.000 por mês, durante dez meses, para entregar na casa da família. Em alguns casos são nove meses; no meu caso, eram dez. Se não acontecer, não paga nada, ninguém vai pagar, porque não entregou. A gente tinha de trabalhar, tirar os mil deles, e o resto pra gente. Acho que é bastante sofrimento trabalhar ralando para pagar US$ 1.000 por mês, fora gastos, telefone, aluguel.A gente entra em contato por telefone, não sabe quem é nem nome de guia nem nada, não. Eles me deram US$ 1.500 na mão para a viagem. Mas isso é prejuízo deles, a gente não paga nada, não.Quando a pessoa tem dinheiro, chega ao lugar [nos EUA] e manda a família entregar. Não é o meu caso. Se a pessoa não passa, ela já liga para família e avisa: "Ó, não paga não, que eu não cheguei". Aí eles ficam no prejuízo também.
A MORTE DO BRASILEIRO - Era um pretinho, fortinho. Ele passou mal e não teve jeito. Eu fiquei sabendo só dias depois. Foi assim: a gente saiu de uma casa na rua e foi correndo. Ele correu bem na primeira vez, foram uns 20 minutos correndo, uns 20 minutos andando, era uma areia, a gente pisa e volta para trás, sabe? Mas os guias falaram: "Voltem pra trás". Tinha "sujado", o ônibus que ia pegar a gente passou direto.
Ele voltou e cansou. E toca a correr de novo.Aí ele desmaiou, trincando as mãos, os dentes, e ficou num canto lá onde um colega dele o colocou porque não tinha como carregar. Fizeram respiração boca-a-boca, mas não teve jeito. Não tinha como socorrer, a gente já estava longe, não tinha carro. Eu também estava passando mal demais, mas venci, graças a Deus. Ficaram dois colegas com ele. Depois de uns dias, eles chegaram à casa onde estávamos e disseram: "O pretinho morreu".
O CAMINHÃO-BAÚ -Eram umas três da madrugada quando nós subimos num baú. Eles disseram que seria só por duas horas, que depois íamos passar para uma cabine, mas não aconteceu, não. Foi terrível. O caminhão tinha umas 33 pessoas, quase todas desmaiando para morrer, e estava lotado de caixas. Na parte de cima só havia um metro para a gente ficar sentado, com um calor terrível. Nós ficávamos sentados com as pernas dobradas para cima.
Nós andamos por seis horas direto, sem ar nenhum. Teve uma hora em que ele abriu uma brechinha e trancou a porta de novo; andou mais um tempo e abriu mais um pouquinho. Eu comecei a chutar forte para ver se ele abria a porta. Demos chutes no caminhão até que ele abrisse. Abriu a porta. Você tinha de ter visto uma mulher passando mal lá no meio, ela estava arrancando a roupa.
A PRISÃO - Quando fomos presos, nós estávamos num mato para onde o motorista tinha mandado correr. O caminhão tentou correr, mas a polícia foi atrás e prendeu o motorista. Ele pegou uma prisão perpétua. Mas nós fomos muito bem tratados, eles são legais demais. Só a comidinha que é diferente da da gente, né? A comidinha lá é meio difícil. Mas o tanto que a gente andou de cadeia em cadeia, nossa, "não tá no gibi", eram quatro horas de viagem, eram duas horas de viagem, uma transferência de cadeia. Fomos transferidos umas quatro ou cinco vezes. Até numa detenção a gente foi parar.
A DESISTÊNCIA - A gente não quis seguir viagem. Eu queria ficar preso até conseguir uma deportação. Deixaram ficar só mais um dia, aí a gente saiu e procurou o consulado brasileiro. Nós estamos voltando neste domingo agora. Eu sofri demais, pelo amor de Deus! Ainda mais depois que um colega morreu. Estou com saudades demais da minha família. Já chorei muito, já liguei para lá hoje [ontem]. Eu já contei o caso para minha mulher, ela até chorou também.

FSP, 16/07/2004

7.15.2004

Dados mostram recuperação do emprego

Índústria em SP teve contratação recorde em junho; construção recupera postos fechados em 2003, e vagas formais crescem
CLAUDIA ROLLI
DA REPORTAGEM LOCAL
O mercado de trabalho já reage ao sinais de retomada da economia e mostra uma forte recuperação, segundo três indicadores que medem o emprego com carteira assinada divulgados ontem.
A indústria paulista de transformação chegou ao recorde de contratações em junho, com a criação de 12.124 postos de trabalho. Foi o melhor resultado mensal desde que a pesquisa de nível de emprego da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) foi iniciada, em 1994.
A construção civil brasileira também conseguiu recuperar os postos de trabalho perdidos no ano passado, com a abertura de 56,8 mil vagas de janeiro a maio deste ano, segundo informaram o Sinduscon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo) e a consultoria GVconsult, a partir de dados oficiais do Ministério do Trabalho.Além disso, o ministro do Trabalho, Ricardo Berzoini, disse ontem que o país deve fechar o mês de junho contabilizando aproximadamente 1 milhão de empregos formais criados no primeiro semestre. A estimativa foi feita com base nos dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), a partir de informações enviadas mensalmente pelas empresas de todo o país.
Recorde histórico
A criação de vagas na indústria paulista também foi recorde para o período de janeiro a junho. No primeiro semestre deste ano, o nível de emprego aumentou 1,97% -ou 30.091 postos criados. Esse número supera os 27.416 registrados em todos os meses de 2000, considerado um dos melhores anos para o emprego no país.
Para a Fiesp, as comparações dos resultados obtidos pela indústria de transformação devem ser feitas a partir de 2000. Isso porque houve uma mudança significativa no perfil industrial depois do ajuste cambial, em 1999.
A antecipação de contratações sazonais -principalmente no setor de sucos e sorvetes (congelados e supercongelados)- e o desempenho positivo de atividades ligadas às exportações explicam o crescimento do emprego em junho, segundo informa a federação das indústrias paulistas.
"Segmentos da indústria que tradicionalmente contratam em julho e agosto anteciparam as admissões para junho", afirmou Claudio Vaz, diretor do Departamento de Pesquisas Econômicas da Fiesp. Essa antecipação ocorreu com mais intensidade no setor de sucos -em especial o de laranja, produzido nas cidades de Araraquara, de Bebedouro, de Limeira e de Matão.
Segundo o empresário, as admissões antecipadas também são motivadas pelo crescimento das exportações. "Não podemos afirmar que as empresas estão apostando na melhora do mercado interno. Não sabemos se é uma preparação para circunstâncias melhores [da economia] ou se houve uma antecipação da safra", disse.
Apenas no setor de congelados e de supercongelados, o nível de emprego cresceu 18,28% em junho, o que equivale à abertura de cerca de 3.500 vagas. "As contratações feitas em junho foram suficientes para repor as vagas que até então estavam sendo fechadas nesse segmento. Com isso, esse setor registra 2% de crescimento no ano", diz o empresário.
Entre os setores que contrataram mais do que demitiram, impulsionados pelas exportações, estão o de curtimento de couros e peles (3,34%), o de calçados de Franca (2,78%) e o de fiação e tecelagem (2,59%). "São segmentos essencialmente ligados às exportações. A reação ainda é pequena nos setores voltados para o mercado interno", disse Vaz.
Emprego na construção
O nível de emprego na construção civil brasileira subiu 1,33% em maio em comparação a abril, com a abertura de quase 15,9 mil vagas. Foi o quinto mês consecutivo de crescimento no setor.
Só em dezembro de 2003 a construção civil havia fechado 42 mil vagas. Na comparação dos cinco primeiros meses deste ano com igual período do ano passado, o emprego no setor registra aumento de 0,64% -o equivalente a 7.500 postos de trabalho.Em maio, trabalhava com carteira assinada na construção civil 1,21 milhão de empregados no país. Desse total, 363 mil estavam no Estado de São Paulo.
Em São Paulo, o nível de emprego no setor também subiu em maio, com um aumento de 0,82% ou cerca de 2.900 vagas a mais, comparado a abril.Em relação a maio de 2003, houve crescimento de 2,13% ou de 7.600 vagas.O segmento de edificações foi responsável por 55% das vagas criadas da construção paulista, que teve ganho de 1,12% no número de vagas em maio, o equivalente à abertura de 2.225 postos.
FSP, 15/07/2004

Relatório aponta 831 milhões de pessoas subnutridas no mundo

ONU estima que 1,1 bilhão de pessoas vivem com menos de US$ 1 por dia

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA SUCURSAL DO RIO
O Relatório do Desenvolvimento Humano 2004, que será lançado hoje em Bruxelas (Bélgica) pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), mostra que, apesar dos avanços verificados no século 20, há 831 milhões de pessoas no mundo subnutridas e aponta tendências preocupantes para o futuro.Citando estatísticas do Banco Mundial e da Unesco, estima que 1,1 bilhão de pessoas vivem no mundo com menos de US$ 1 por dia (levando em conta o poder de compra da moeda em cada país) e que 2,7 bilhões de habitantes vivem sem saneamento adequado.A maior preocupação citada no relatório está na tendência para os próximos anos. O documento prevê que, se o ritmo de avanço em alguns indicadores não melhorar, vários países terão dificuldade para cumprir as metas assumidas com a ONU em 2000 de redução da pobreza e melhoria das condições de vida.O relatório detecta tendência de piora nas condições para atingir as metas até 2015 justamente na África subsariana, região com pior IDH, nos indicadores de pobreza, fome e acesso a saneamento. Essa região só cumprirá metas de educação e mortalidade na infância depois de 2100, caso o ritmo de mudanças não se altere.
Metas difíceis
Na média mundial, o relatório aponta que os países terão dificuldade para cumprir até 2015 as metas de redução da fome, de educação, de mortalidade na infância e de acesso a saneamento.Entre as metas assumidas, estão reduzir à metade da parcela da população mundial com rendimento menor que US$ 1 por dia, assegurar que as crianças tenham acesso ao ensino primário e diminuir em dois terços a taxa de mortes dos menores de cinco anos."Sem mudanças significativas, os países que experimentam reversões ou estagnação têm poucas probabilidades de atingir os seus objetivos", diz o relatório.Os dados do relatório da ONU mostram que o IDH recuou em 20 países, 13 deles da África subsaariana, durante a década de 90. Pela primeira vez, essa situação foi registrada em tantos países: na década de 80, apenas três entre 113 países com dados disponíveis viram o índice cair.
Prioridade máxima
O retrocesso na África se deve em grande parte, segundo o relatório, à Aids, que atinge mais pessoas em idade produtiva. A doença reduziu a expectativa de vida dessas populações, chegando a baixar para 40 anos ou menos em sete casos (Angola, República Centro-Africana, Lesoto, Moçambique, Serra Leoa, Suazilândia e Zimbábue).Esse quadro, aliado à estagnação de desenvolvimento em outras localidades, levou o Pnud a considerar 54 países como prioridade máxima ou alta -o que significa que têm necessidade de mais atenção, verbas e compromisso internacional ou apresentam progresso insuficiente para atingir as Metas de Desenvolvimento do Milênio. Dos 54, 24 apresentaram queda dos rendimentos durante a década.O texto registra ainda que, nos 27 países enquadrados na prioridade máxima, o desenvolvimento pode fracassar em todos os aspectos. Estão nesse grupo 21 países da África subsaariana, três árabes, um da Ásia oriental, outro do sul da Ásia e um do Caribe.Noruega e Suécia aparecem no topo do ranking do IDH como os países com melhor índice de desenvolvimento entre os 177 territórios analisados -0,956 e 0,946, respectivamente. Em terceiro lugar, com o mesmo IDH da Suécia, está a Austrália, país que apresentou um índice de expectativa de vida um pouco menor (diferença de 0,02 entre os dois).No total, 55 países aparecem no Relatório de Desenvolvimento Humano 2004 na classificação de IDH elevado, isto é, igual ou superior a 0,800. Também estão nessa faixa países como Estados Unidos (8º lugar), Japão (9º), Itália (21º), Argentina (34º) e Uruguai (46º).

7.12.2004

HIV atinge 26 milhões de trabalhadores

Segundo a OIT, o dado se refere aos 50 países com maior incidência da epidemia; 2 milhões deixarão de trabalhar em 2005
AURELIANO BIANCARELLI
DA REPORTAGEM LOCAL
Cerca de 26 milhões de trabalhadores entre 15 e 49 anos estão com HIV -2 milhões deles não terão mais condições de trabalhar ao longo do próximo ano. Esse cenário assustador se refere ao conjunto dos 50 países mais afetados pela epidemia, 35 deles na África abaixo do Saara, cinco na Ásia, oito na América Latina e Caribe, além da Rússia e dos EUA.
Até 2015, contando do início da epidemia, a Aids terá tirado do mercado de trabalho cerca 74 milhões de pessoas no mundo.O levantamento foi divulgado ontem em todo o mundo pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) e se transformou no principal tema de debate da abertura, neste domingo, da 15ª Conferência Mundial de Aids, em Bancoc, na Tailândia. Para realizar o estudo, a OIT se valeu de informações da Unaids, instituição das Nações Unidas para a Aids, e de organismos nacionais e internacionais dos países envolvidos.
A Unaids estima que nos 50 países estudados pela OIT existam 35,7 milhões de pessoas vivendo com HIV (aquelas nas quais a doença Aids ainda não se manifestou). Se forem considerados os menores de 15 anos e os acima de 49 anos que exercem alguma atividade, o número de pessoas vivendo com o vírus e exercendo alguma atividade produtiva subiria para mais de 33 milhões.
A OIT também não considerou os cerca de 7,1 milhões doentes de Aids (aqueles que já manifestaram a doença), muitos dos quais continuam trabalhando, observa Paulo Teixeira, que coordenou o programa de Aids da Organização Mundial da Saúde.O estudo da OIT estimou que a epidemia vem provocando no conjunto dos 50 países estudados queda de 0,2% no PIB (Produto Interno Produto) e redução de US$ 5 na renda per capita anualmente. Só em 1995, a perda no PIB (soma de bens e serviços produzidos) teria sido de US$ 25 bilhões.
O levantamento não contabiliza as "perdas sociais" já provocadas pelas mortes pela Aids, número estimado no mundo entre 17 milhões e 20 milhões.
Vários países da África estão com mais de um quinto de sua população em idade produtiva vivendo com HIV. Na Suazilândia, 38,8% das pessoas entre 15 e 49 anos estão com o vírus. Em Botsuana, são 37,3%; no Lesoto, 28,9%; no Zimbábue, 24,6%; na Namíbia, 21,3%. No Brasil, estima-se que existam 540 mil pessoas com HIV. Outras 310 mil já caíram doentes desde o início da epidemia, 160 mil delas já morreram, 140 mil estão em tratamento.
O mais preocupante, segundo os especialistas, é que os países com maior número de pessoas com o vírus são também aqueles que não têm acesso aos medicamentos contra a Aids. Vivendo em maior pobreza, eles adoecem mais facilmente. Sem os medicamentos para a Aids, acabam morrendo. Diferentemente do Brasil -lembra Teixeira-, onde mesmo os pacientes que já sofreram doenças oportunistas estão podendo retornar ao trabalho, graças aos medicamentos.
Outro reflexo nos países pobres é a queda na expectativa de vida. Segundo dados da OIT/ Unaids, enquanto no Brasil a esperança de vida ao nascer é de 68 anos e nos EUA, de 77, no Zimbábue é de 33. Na maioria dos países africanos, a expectativa de vida caiu em mais de dez anos por causa da Aids. Em oito dos 35 países estudados, a esperança de vida está abaixo dos 40 anos. Só em seis a expectativa de vida está acima dos 50.
FSP, 12/07/2004

7.10.2004

Brasileiros ilegais nos EUA batem recorde

Nos últimos dez anos, o total de presos ao atravessar a fronteira com o México cresceu dez vezes

RAFAEL CARIELLO
DE NOVA YORK
Márcia, uma imigrante ilegal que deixou o Brasil em 2002 e hoje mora em Nova York, diz que tentou por três vezes conseguir o visto de turista para entrar nos EUA - com a intenção de permanecer para trabalhar. "Antigamente era mais fácil. Fui lá com toda a documentação, não deu. Aí resolvi vir pelo México."
Ela faz parte da face oculta de números conseguidos pela Folha que mostram que a quantidade de brasileiros presos após atravessar a fronteira do México para entrar nos EUA aumentou mais de dez vezes em quatro anos -passou de 488, em 1999, para 5.008, no ano passado.
Não há contabilidade precisa dos que tentam nem dos que conseguem entrar, pela razão óbvia de se tratar de uma atividade ilegal. Mas o governo americano reconhece que a quantidade dos que se arriscam é proporcional à dos que são pegos, e especialistas apostam numa relação de três casos bem-sucedidos para cada tentativa frustrada pelas autoridades dos EUA.
Márcia é, portanto, um exemplo do número crescente de brasileiros que têm trocado o visto de turista e a viagem aérea direta para os EUA por uma travessia que pode custar até US$ 10 mil -pagos às quadrilhas que têm ramificações no Brasil e no México- e, na melhor das hipóteses, implicará passar dias no deserto ou cruzar rios a nado.
A pedido da Folha, a Patrulha de Fronteira, vinculada ao Departamento da Segurança Interna (órgão do governo americano que unifica as funções de controle de imigração, fiscalização de fronteiras e prevenção ao terrorismo), levantou o número de brasileiros e o total de pessoas detidas ao tentar cruzar ilegalmente a "fronteira sudoeste" -divisa com o México.
Em 1999, foram 488 brasileiros detidos. Em 2000, 1.241; em 2001, 3.105; em 2002, 2.946; e em 2003, 5.008.
Os números são contabilizados entre o dia 1º de outubro do ano anterior e o dia 30 de setembro do ano a que se referem.
Neste ano, até a terceira semana de junho, 4.401 brasileiros já haviam sido detidos. Segundo Mario Villarreal, porta-voz da Patrulha de Fronteira, o total de detidos deve se manter no patamar do ano passado, ultrapassando por pouco os 5.008 de 2003. Os números de brasileiros detidos são ainda mais significativos se comparados ao total de pessoas paradas pela patrulha nos mesmos anos. A tendência é inversa, havendo declínio entre 2000 e 2003, com novo aumento em 2004 -insuficiente, no entanto, para representar um aumento geral no mesmo período.
Em 1999, 1,537 milhão de pessoas foram detidas na fronteira. Em 2000 foram 1.643.679; em 2001, 1.235.717; em 2002, 929.809; e em 2003, 905.065. Logo, enquanto o número de brasileiros detidos entre 1999 e 2003 aumentou 926%, o número total de ilegais presos pela patrulha de fronteira caiu 41% no mesmo período.
Neste ano, até a terceira semana de junho, 825.305 pessoas haviam sido detidas, no total, na fronteira sul. Faltando ainda 1/4 do período a ser contabilizado (até 30 de setembro), é razoável supor que o número ultrapassará o do total de 2003. Mas é bastante improvável que supere o de 1999.
Ou seja, o aumento no número de detenções de brasileiros não se deve a um simples recrudescimento maior da vigilância na divisa com o México -o que deveria provocar um aumento proporcional, caso esse fosse o único fator em questão, no número de brasileiros e no número total de detidos.
Segundo John Keeley, do Centro para Estudos de Imigração, para cada pessoa detida ao tentar entrar, estima-se que três consigam entrar ilegalmente nos EUA. Mario Villarreal, da patrulha de fronteira, diz preferir não especular sobre o número dos bem-sucedidos, mas afirma que há "proporção" entre prisões e casos de entrada ilegal.
Ele enumera, entre as causas gerais para aumento de imigrantes desse ou daquele país, "crises econômicas, mudanças de administração, desvalorizações das moedas locais, desastres naturais".
Mas os brasileiros ilegais entrevistados pela Folha em Nova York dizem todos que a crescente dificuldade para conseguir o visto de turista é o principal incentivo para a opção pela travessia a partir do México, onde a entrada é mais fácil.
O advogado Moisés Apsan, que trabalha há mais de 20 anos nos EUA com causas de imigrantes, concorda. "Os brasileiros aprenderam como entrar neste país. Não tem outro jeito, porque eles vão ao consulado e não conseguem visto", diz.
Apsan fala que os riscos estão muitas vezes associados aos responsáveis pela empreitada -que cobram para realizar a travessia-, conhecidos como "coiotes". Há diferentes quadrilhas, que competem entre si, denunciando grupos liderados por adversários às autoridades americanas no momento da tentativa de cruzar a fronteira. "Há os que fazem o serviço bem feito, e outros que podem até matar ou deixar alguém no caminho sem água."
Um "coiote" brasileiro contatado pela Folha em Governador Valadares (MG) -que concordou em falar sob a condição de não ter seu nome revelado- bota a culpa nos Estados Unidos: "Se o governo americano fosse mais flexível, não teria esse fluxo de gente entrando pelo México".
Corpo de Ricardo Ignacio, que morreu após cruzar fronteira com México, foi achado no dia 3, em El Paso
Outro brasileiro morre no deserto dos EUA

Jefferson Coppola/Folha Imagem
Foto de Ricardo Luiz Ignacio, que morreu nos EUA, com brinquedos dos filhos em sua casa em SP

RAFAEL CARIELLO
DE NOVA YORK
BERTA MARCHIORI
DA REDAÇÃO
O paulista Ricardo Luiz Ignacio, 31, foi achado morto há uma semana, no dia 3, na cidade de El Paso (Texas), após cruzar ilegalmente a fronteira do México com os EUA. Ignacio foi o terceiro brasileiro que morreu nos últimos 36 dias durante a travessia. Ignacio morreu por causa do excesso de calor enquanto atravessava o deserto, disse a médica americana que o examinou, Corinne Stern. Segundo ela, o brasileiro deve ter morrido um ou dois dias antes de ser achado, a menos de 2 km do rio que separa os dois países, por um homem que passeava com seu cachorro.
A família de Ignacio, que mora em Santo Amaro (zona sul de São Paulo), recebeu a notícia de sua morte no dia 2 de julho, supostamente por um companheiro de viagem, que não se identificou. Foi a primeira informação que teve desde que Ignacio deixou o Brasil, em 27 de junho.
O colega não entrou em detalhes, só disse que já haviam chegado aos EUA, que o sol estava muito forte e que Ignacio "não tinha agüentado a viagem", declarou Silvia Cristina da Silva, 28, com quem Ignacio vivia há 11 anos. Eles tinham dois filhos, de dez e cinco anos de idade.
Quando foi encontrado, Ignacio estava sem camisa e tinha um passaporte brasileiro no bolso. O detetive John Greer, da polícia de El Paso, confirmou que o brasileiro era um imigrante ilegal. "Não sabemos por que escolheu esse caminho", disse Stern sobre o fato de Ignacio ter cruzado o deserto quando poderia ter chegado aos EUA atravessando um rio.
Stern afirma que, apesar da pouca idade, não estranha o fato de Ignacio ter morrido. "As temperaturas eram muito altas, e não sabemos por quanto tempo andou no deserto." Segundo a família, Ignacio não tinha nenhum problema de saúde.Ignacio estava desempregado havia cinco meses quando decidiu ir para os EUA "em busca de uma vida melhor". Antes, trabalhava em uma firma de equipamentos hospitalares. Sua mulher está desempregada há dois anos.
Quando informou a sua decisão, seus familiares tentaram fazê-lo desistir. "Desiste disso. A gente dá um jeito aqui. Fome ninguém vai passar", disse Silvia ao marido. Segundo ela, Ignacio disse que iria se juntar a um grupo de Governador Valadares (MG) que seria levado aos EUA por um "coiote" mexicano (pessoa que transporta ilegalmente imigrantes do México para os EUA).
O consulado brasileiro entrou em contato com a família de Ignacio em São Paulo. A previsão é que o corpo chegue ao país em uma semana.
Porém as dificuldades não esbarram somente na falta de ajuda e de informação. Sem recursos, a família está pedindo dinheiro a parentes e vizinhos para conseguir trazer o corpo. Silvia não sabia ao certo, mas achava que o custo do transporte girasse em torno de "US$ 4 mil e US$ 5 mil".
Questionados sobre se o governo deveria promover campanhas a fim de alertar dos riscos da imigração ilegal, todos foram unânimes. "O governo tem que dar é emprego. Entra governo, sai governo, e nada muda. Está cada vez pior", declarou Silvia.No último domingo, a Folha mostrou que houve aumento de 926% no número de brasileiros detidos ao tentar entrar nos EUA pela fronteira com o México entre 1999 e 2003 -de 488 para 5.008. Segundo o Itamaraty, cerca de 2,5 milhões de brasileiros vivem hoje fora do país. O contingente é o maior já registrado.

FSP, 10/07/2004

7.08.2004

Europa agora aumenta jornada de trabalho

Concorrência de outros países e baixa produtividade fazem europeus inverterem tendência de queda de horas trabalhadas
Boris Horvat/France Presse - 4.jul.2003
Greve em Avignon, na França, contra perda de benefícios
MARK LANDLER
DO "NEW YORK TIMES", EM FRANKFURT
Para Michael Stahl, técnico de uma fábrica de telefones sem fio na cidade de Bocholt, na Alemanha, o verão costuma ser uma estação de descanso, marcada por longos finais de tarde passados em seu jardim e por férias ainda mais compridas. Sua escolha mais difícil é decidir para onde levar a mulher e seus três filhos em sua viagem anual de férias.Há duas semanas, porém, Stahl levou um susto: seu sindicato assinou um contrato coletivo com sua empresa, a Siemens, ampliando a semana de trabalho na fábrica de Bocholt de 35 para 40 horas semanais. Os salários semanais permanecem iguais. O novo contrato também acaba com os abonos anuais para ajudar nas despesas com o Natal e as férias.
"Vou ter que me virar com menos. A maior prejudicada será a família", diz o operário de 42 anos que começou a trabalhar adolescente, como aprendiz de ferramenteiro. Hoje, após quase 27 anos na Siemens, acha que não tem outra escolha senão trabalhar as horas extras exigidas. Como milhões de compatriotas, se esforça para encarar a nova e dura realidade na economia globalizada: os alemães estão tendo que aumentar sua carga de trabalho.
E não são apenas os alemães. Os franceses, que em 2000 reduziram sua carga horária de trabalho semanal para 35 horas, na esperança de gerar mais empregos, agora falam em ampliá-la outra vez, temendo que o horário menor esteja prejudicando a economia. No Reino Unido, segundo um estudo de 2002, mais de um quinto da força de trabalho trabalha mais do que o limite aceito na União Européia, 48 horas por semana.A longa sesta européia parece ter finalmente chegado ao limite -vítima da estagnação econômica crônica, da deterioração das finanças públicas e da concorrência dos países da Ásia e da União Européia ampliada nos quais os salários são mais baixos. O mais importante, entretanto, é que muitos europeus hoje pensam que o horário de trabalho menor, antes visto como maneira de garantir trabalho a mais pessoas, não ajudou a reduzir o desemprego."
Enquanto os EUA criaram uma sociedade do trabalho, nós criamos uma sociedade do lazer", disse Klaus F. Zimmermann, presidente do Instituto Alemão de Pesquisas Econômicas. ""Mas nosso modelo não funciona mais."
Desde os anos 1970 até pouco tempo atrás, a Europa adotou uma filosofia de "menos é mais" no que diz respeito ao trabalho. O resultado é que os europeus trabalham em média dez horas por ano menos do que os americanos. Os alemães, que têm o horário mais leve, trabalham 18 horas menos do que os americanos.
O argumento da criação de empregos acompanhava o valor social maior atribuído pelos europeus ao lazer. Na terra do rush das 16h e das férias de verão de um mês, se tem a idéia de que, como diz o clichê, os europeus trabalham para viver, enquanto os americanos vivem para trabalhar.
Mas a Siemens jogou essa visão por terra quando ameaçou transferir sua produção de telefones celulares e sem fio para a Hungria. Teria sido o fim de cerca de 2.000 postos de trabalho em um país com índice de desemprego já de 10%. "Precisamos reduzir o custo da mão-de-obra", disse Peter Gottal, porta-voz da Siemens, sediada em Munique. "Quando competimos em nível mundial, 35 horas deixa de ser um padrão viável. Precisamos de mais horas."
A Siemens e seu sindicato insistem que o contrato selado entre eles não servirá de modelo para o resto do setor industrial alemão, mas é assim que vem sendo visto. Uma pequena maioria do público alemão também pensa que a semana de trabalho mais longa pode ajudar a preservar empregos, segundo uma pesquisa recente conduzida para a revista econômica "WirtschaftsWoche".
A carga de trabalho está aumentando até mesmo no setor público alemão. O Estado da Bavária aumentou a semana de trabalho de 40 horas para 42. O chanceler (premiê) Gerhard Schröder quer aumentar a carga horária dos funcionários públicos federais de 38,5 para 40 horas semanais.
As principais causas do recém-descoberto ""amor pelo trabalho" ao nível do Estado são a queda da receita tributária e o aumento dos déficits orçamentários. Na França, porém, o governo afirma, além disso, que a semana de trabalho de 35 horas, que se aplica aos empregos nos setores público e privado, está sufocando o crescimento econômico nacional."
Nunca me convenci do efeito positivo da semana de 35 horas", declarou recentemente o presidente Jacques Chirac. "Acho que ela tem refreado o desenvolvimento econômico e, portanto, o índice global de emprego."
Chirac está se sentindo pressionado pelo ministro das Finanças, o intempestivo Nicolas Sarkozy, que vem pedindo que os funcionários franceses tenham o direito de trabalhar mais de 35 horas por semana, se isso engordar seus salários. O apelo de Sarkozy ao livre mercado, embora seja malvisto entre os sindicatos franceses, sugere que o equilíbrio básico que os europeus criaram entre trabalho e lazer pode estar mudando.Desde os anos 1970 os europeus se mostram dispostos a aceitar aumentos salariais menores em troca de uma carga de trabalho menor e férias mais longas. Os franceses têm em média 25 dias de férias por ano, e os alemães, 30. Enquanto isso, a média no Japão é de 18 dias de férias. Nos EUA, 12.
Durante muito tempo o preço pago por tudo isso não foi muito alto, já que a Europa antigamente apresentava grande dianteira em termos de produtividade de sua mão-de-obra, o que contribuía para o aumento de suas exportações, o crescimento de sua economia e os aumentos salariais.Mas quase todas essas tendências se tornaram negativas nos anos 1990, quando os índices de aumento de produtividade caíram, especialmente comparados aos dos EUA. Há dez anos a Europa se vê atolada num período de crescimento cronicamente lento.

Famílias dos EUA trabalham mais hoje do que em 75

DA REDAÇÃO
Embora o número de horas semanais de trabalho não tenha subido muito nas últimas três décadas nos EUA em termos brutos (só 3,1% em média), um novo estudo do Instituto para Política Econômica, de Washington, mostra que, contados todos os seus membros, as famílias americanas trabalham hoje 11% mais semanalmente do que em 1975.Segundo Jared Bernstein, economista sênior do IPE e autor do estudo, a diferença existe porque mais mulheres fazem parte atualmente do mercado de trabalho do que há três décadas. O economista afirma ainda que isso tem gerado um grave declínio na qualidade de vida das famílias americanas.
FSP, 08/07/2004

7.07.2004

Ter status é bom e ainda prolonga a vida

Estudo de pesquisador inglês mostra que posição hierárquica em grupo social afeta a saúde e a longevidade

FERNANDA MENAD
A REPORTAGEM LOCAL

Dinheiro, escolaridade e acesso a atendimento médico são apenas parte dos fatores que prescrevem a condição de saúde de alguém. É o status o que pode determinar o número de anos a mais ou a menos que se vive.
Essa é a teoria apresentada na obra "Status Syndrome - How your Social Standing Directly Affects your Health and Life Expectancy" ("Síndrome do Status - Como sua Posição Social Afeta sua Saúde e Expectativa de Vida", Bloomsbury Publish, US$ 18), um estudo de 30 anos do epidemiologista britânico Michael Marmot, diretor do Centro Internacional de Saúde e Sociedade da University College London, lançado no mês passado na Europa.
O livro traça a relação entre a posição das pessoas na hierarquia de determinado grupo social e sua expectativa de vida e susceptibilidade a doenças. O cientista estudou milhares de servidores públicos britânicos e constatou que, mesmo bem pagos e com igual acesso a atendimento médico, quanto mais alto o cargo onde estavam, mais tempo viviam.
O mesmo se aplica ao estudo que apontou que atores vencedores do Oscar vivem, em média, quatro anos a mais que os que foram apenas indicados ao prêmio.Do mesmo tipo de status gozam os imortais da Academia Brasileira de Letras. Os últimos eleitos a tomar posse das 40 cadeiras dos chás da ABL ocuparam vagas deixadas por escritores que morreram, em média, com 83,5 anos. Na última década, segundo levantamento do Pro-Aim (Programa de Aprimoramento das Informações de Mortalidade) da Prefeitura de São Paulo, os escritores da cidade morreram em média aos 72. A expectativa de vida do brasileiro hoje ao nascer é de 71 anos.
Autonomia
A pesquisa de Marmot sugere que não só a condição econômica mas também -e especialmente- as conquistas, o prestígio e a auto-estima são elementos determinantes da duração da vida."
Os cuidados médicos, o cigarro, os exercícios e a alimentação são importantes, mas são apenas parte da história. Assim como a questão da riqueza", afirma ele.Nos EUA, o país mais rico do mundo, a expectativa de vida é de 76,9 anos. Em Cuba, um dos mais pobres, a expectativa é quase idêntica: 76,5 anos."
Se pegarmos duas comunidades pobres, aquela que tiver melhor estrutura de apoio social, com famílias mais bem estruturadas, tem menor ocorrência de doenças e maior expectativa de vida", afirma Luis Jacinto da Silva, superintendente de controle de endemias da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e professor da Unicamp."Há uma série de evidências de que, quanto mais autonomia, melhor a qualidade de vida, a vulnerabilidade e a longevidade", confirma Moisés Goldbaum, presidente da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).
"Síndrome do Status" aponta as questões da autonomia e da inclusão social como índices de longevidade e saúde. Quanto maior o status, maior a autonomia e a sociabilização. E a chave do sucesso desse casamento entre status e saúde é a auto-estima."
A auto-realização e o prestígio promovem um bem-estar que tem impacto importante e positivo do ponto de vista da saúde do indivíduo", diz Silva.
No outro extremo, na base da pirâmide social, há pouca autonomia e muita desagregação social, segundo Marmot, e isso é um fator de estresse. "Quanto mais sujeitas ao estresse, mais propensas as pessoas estão a algumas doenças, como hipertensão, infarto e até mesmo alguns tipos de câncer", explica Rui Laurentis, do Departamento de Saúde Pública da USP e consultor da Organização Mundial da Saúde.
A relação entre pobreza e más condições de saúde é uma velha conhecida. A novidade, segundo o cientista britânico, é que a desigualdade relativa de uma sociedade está diretamente relacionada às diferenças na saúde de sua população. Quanto mais socialmente coerente, menor a gradação da expectativa de vida da população.
"O importante dessa pesquisa é que ela contesta os pressupostos do individualismo. O problema da desigualdade ocorre quando ela afeta nossa dignidade. Por isso a exclusão ou a inferioridade em relação a nossos semelhantes - em termos de condição social, cultura, parentesco etc.- é mais sofrida do que a desigualdade em relação a grupos sociais muito distantes do nosso. Pois é na comparação com nossos semelhantes próximos que nos medimos e que medimos nosso valor", avalia a psicanalista Maria Rita Kehl.
No Brasil, em que, segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, 10% dos domicílios mais ricos têm uma renda 70 vezes maior do que a dos 10% de domicílios mais pobres, dá para imaginar as variações de saúde e de longevidade. Dados levantados pelo Pro-Aim mostram que a idade média de morte de advogadas em São Paulo no ano passado por causas naturais foi de 68 anos. No mesmo ano, a idade média de morte das empregadas domésticas da cidade foi 45 anos. Das pessoas sem identificação (possíveis indigentes), foi 38,5.

FSP, 04/07/2004

7.05.2004

Branco ganha 105% a mais que negro e pardo

IBGE aponta diferenças no rendimento médio e na taxa de desemprego de acordo com a cor do trabalhador

ANTÔNIO GOIS
DA SUCURSAL DO RIO
O drama do desemprego e da renda precária também tem nuances de cor. Que o diga Marinete do Espírito Santo Filha, 32, mulher negra que há sete meses procura um emprego no Rio de Janeiro para melhorar a renda de sua família, dependente hoje exclusivamente dos R$ 400 que seu marido recebe.Uma pesquisa divulgada ontem pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostra que pardos e negros, como Marinete, têm taxa de desemprego maior e renda menor quando comparados com a população branca.Segundo a pesquisa, a renda média de um trabalhador branco, de R$ 1.096 mensais, é 105% maior do que a de um negro ou pardo, de R$ 535 mensais. A taxa de desemprego também é maior entre negros e pardos. Nesse grupo, 15,3% da população procurava emprego. Entre brancos, a proporção é de 11,1%, enquanto no total da população ela é de 12,8%.O cruzamento foi feito a partir de dados de março deste ano da PME (Pesquisa Mensal de Emprego), que analisa a situação do trabalho nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador, Recife e Porto Alegre.Se, assim como Marinete, a pessoa for negra e mulher, a desigualdade é dupla. As mulheres negras e pardas, segundo o IBGE, estão no degrau mais baixo da pirâmide salarial brasileira, com rendimento por hora de trabalho de R$ 2,78. Acima delas estão os homens negros e pardos (R$ 3,45), as mulheres brancas (R$ 5,69) e, por último, os homens brancos (R$ 7,16)."O estudo mostra que a desigualdade é latente. Após 116 anos de abolição da escravidão, a desigualdade racial continua evidente no mercado de trabalho", afirma Cimar Azeredo Pereira, gerente da PME.Pereira comenta que a pesquisa deixa evidente que a desigualdade racial tem um peso muito maior no mercado de trabalho do que a desigualdade de gênero."O homem tem rendimento médio maior do que a mulher, desde que ele não seja negro ou pardo e que ela não seja branca", afirma.As diferenças entre negros e brancos vão ficando ainda mais agudas quando a PME compara o perfil da ocupação entre os dois grupos populacionais. A presença de negros e pardos é muito maior em ocupações que exigem menos qualificação e pagam salários mais baixos.Da população negra ou parda ocupada, 11% estavam empregados em março em serviços domésticos e 10% na construção civil. Entre os brancos, essas porcentagens eram, respectivamente, de 5% e 6%.Outra maneira de constatar essa desigualdade no perfil do trabalho é comparar a taxa de pessoas subocupadas, ou seja, brasileiros que trabalhavam habitualmente menos de 40 horas semanais e que declararam que desejavam trabalhar mais. Entre negros e pardos, a taxa é de 5,4%, ante 4,3% entre brancos.
Brancos têm mais tempo de estudo do que negros e pardos na média, o que é valorizado pelo mercado de trabalho
Para IBGE, escolaridade explica diferenças

DA SUCURSAL DO RIO
Sempre quando se compara a situação no mercado de trabalho de negros, pardos e brancos, a maior dificuldade dos pesquisadores é determinar se a desigualdade é mais bem explicada pelo preconceito ou pela diferença na escolaridade.Os dados do IBGE indicam que muito dessa diferença é explicada pela escolaridade. A pesquisa mostra que brancos têm, em média, 2,1 anos de estudo a mais do que negros e pardos, quando se analisa a população ocupada, e 1,5 ano de estudo a mais entre os desempregados.Entre os ocupados, a média de escolaridade é de 9,8 anos de estudo para brancos e de 7,7 para negros e pardos. Quando se analisa esse mesmo dado na população desempregada, brancos aparecem com 9,5 anos de estudo, enquanto negros e pardos têm, em média, 8 anos de estudo.A comparação pode ser feita também analisando toda a população em idade ativa (com dez anos ou mais de idade). Entre os brancos, 42,9% possuíam ao menos um diploma de ensino médio completo. Entre os negros, essa proporção caía para 24,9%.Para Marcelo Paixão, pesquisador do Instituto de Economia da UFRJ, que defende ações afirmativas para beneficiar negros e pardos no mercado de trabalho, a desigualdade racial não pode ser explicada por uma simples relação de causa e efeito."Existe preconceito e discriminação no mercado de trabalho, mas há também um histórico de desvantagens acumuladas pelos negros e pardos no Brasil", diz Paixão.Ele diz que a desigualdade racial de hoje é explicada por um círculo vicioso que vem se perpetuando ao longo de várias gerações. "Desde o período da escravidão, a situação de pobreza é maior na população negra. Essa pobreza gera baixa instrução, que gera mais pobreza para a geração seguinte. O perfil da desigualdade persiste de maneira contínua. Há uma inércia muito grande para romper esse círculo e ele ajuda a explicar a desigualdade detectada pela pesquisa do IBGE."Uma das maiores diferenças encontradas na pesquisa foi na taxa que compara a proporção de pessoas que recebem menos de um salário mínimo mensal por jornada de 40 horas semanais de trabalho. Entre negros e pardos, a porcentagem é de 18,2%, mais do que o dobro da encontrada entre brancos, que é de 7,5%.Segundo Cimar Pereira, gerente da Pesquisa Mensal de Emprego, a comparação dos dados do IBGE desde 2002 (foi possível fazer o mesmo cruzamento nos últimos 30 meses) mostra que a desigualdade racial tem ficado estável em todos os itens comparados. "O quadro praticamente não mudou nestes quase três anos", afirma.Esse quadro de estabilidade nos números da situação precária do emprego para negros e pardos é comprovado na vida real. "Já fiz muita ficha de emprego, entrei em várias filas e estou aguardando uma oportunidade há sete meses. Eu corro, corro e corro atrás, mas a situação está difícil mesmo", afirma a carioca Marinete do Espírito Santo Filha.

Salvador tem a maior diferença racial no trabalho

DA SUCURSAL DO RIO
Na comparação entre as seis regiões metropolitanas pesquisadas na PME (Pesquisa Mensal de Emprego), a de Salvador é a que aparece com as maiores diferenças raciais no mercado de trabalho. Na região, o rendimento médio da população branca ocupada é de R$ 1.550, 179% superior ao de negros e pardos, que é de R$ 556.A região metropolitana de Salvador é a que apresenta também maior diferença na taxa de desemprego entre negros, pardos e brancos. A proporção de desempregados entre negros e pardos, 18,3%, é quase o dobro da encontrada na população branca, de 9,3%.A região metropolitana de Salvador é justamente aquela em que os negros e pardos são mais presentes na população em idade ativa. Dos 2,7 milhões de pessoas que vivem na região, 87% (ou 2,3 milhões) declararam ser negros ou pardos.A menor diferença salarial entre os dois grupos foi encontrada em Porto Alegre, onde os brancos têm rendimento médio de R$ 905, 73% a mais do que negros e pardos, com R$ 523. Em compensação, Porto Alegre é a região metropolitana com menor número de negros ou pardos na população em idade ativa. Eles são 11,7% (369 mil) do total de 3,2 milhões de moradores.
FSP, 05/07/2004

7.04.2004

Brasil bate marca de 8.000 doutores por ano

Previsão do governo é chegar a 10 mil em 2006, mas iniciativa privada não absorve demanda
BRUNO LIMA
FREE-LANCE PARA A FOLHA
São poucos os profissionais com título de doutor atuando em empresas do país nas áreas de pesquisa e desenvolvimento.
Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) revelam que são cerca de 41 mil as pessoas ocupadas com pesquisa e desenvolvimento em empresas brasileiras. Dessas, segundo projeções de especialistas, apenas cerca de 750 têm doutorado - número equivalente à média anual de doutores contratados por empresas na Inglaterra. Enquanto isso, não pára de crescer o número de doutores formados no país. Em 2003, o Brasil formou 8.094 novos doutores, número 18,3% maior do que o alcançado em 2002. Até 2006, segundo o Ministério de Ciência e Tecnologia, o país deve passar a titular 10 mil doutores por ano.
De acordo com os especialistas, no entanto, não há excesso. "É um erro pensar que há doutores demais. O aproveitamento deles nas fábricas é que é muito baixo", diz o reitor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), Carlos Henrique de Brito Cruz. Pesquisa da Anpei (Associação Nacional de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia das Empresas Inovadoras) feita com 334 firmas que investem em pesquisa e desenvolvimento indica uma média de 0,8 doutor por empresa, número considerado baixo." Em países desenvolvidos, como EUA e Alemanha, 63% dos dispêndios em inovação tecnológica são feitos pelo setor empresarial. No Brasil, só 37% dos investimentos são feitos nas empresas. Com isso, o mercado de trabalho [em pesquisa] é bem menor", aponta Ronald Martin Dauscha, presidente da Anpei e diretor de gestão corporativa de tecnologia da Siemens no Brasil.
A preocupação com o número de doutores que conseguem uma colocação na iniciativa privada tem fundamento. Em média, a contratação de cada doutor cria entre dez e 15 outros empregos para pesquisadores mestres, bacharéis ou técnicos. Além disso, a entrada desses profissionais nas empresas é estratégica para que o investimento feito pelo país na formação deles possa ser revertido em crescimento econômico.O aumento da quantidade de doutores obedece às determinações do mercado de trabalho."
A exigência de titulação é cada vez maior. A graduação é uma obrigação. Um executivo de primeira linha precisa de especialização, de MBA e, se possível, de doutorado. Mas a qualificação é sempre um diferencial, nunca uma garantia", pondera Giovanna Mott de Arruda Fabrício, consultora da Manager Assessoria em Recursos Humanos.Larga escalaLevantamento feito pela Unicamp mostra que, sozinha, a USP (Universidade de São Paulo) formou, em 2002, mais do que o dobro de doutores que a campeã norte-americana de titulações. Foram 2.070 titulados contra 799 da Universidade da Califórnia em Berkeley. A Unicamp, com 743, vem logo em seguida.De acordo com o último censo, o Brasil tem 302 mil profissionais com título de mestrado ou doutorado. Desses, segundo o MEC, 136 mil estão nas instituições de ensino superior -51 mil são doutores, dos quais 63% estão na universidade pública.

Morte de ilegais bate recorde em fronteira dos EUA


TIMOTHY EGAN
DO "NEW YORK TIMES", EM COVERED WELLS, ARIZONA
No gargalo do contrabando humano que acontece aqui no deserto de Sonora, imigrantes ilegais vêm morrendo em número recorde quando tentam cruzar do México para os EUA, depois da proposta do governo Bush para anistiar imigrantes ilegais que é vista por muitos como um ímã."
A temporada da morte", definição de Robert Bonner, comissário da Patrulha de Fronteira americana, para os meses quentes do ano, mal começou, e 61 pessoas já morreram na região fronteiriça do Arizona de 1º de outubro para cá, segundo o Ministério do Interior mexicano -três vezes o total do ano anterior.
A Patrulha de Fronteira, que só computa os cadáveres que localiza, diz que o número de mortos é de 43, mais do que em qualquer outro ano no mesmo período.Leon Stroud, da patrulha, diz ter visto 34 corpos no ano passado. No jargão da Patrulha de Fronteira, um carro abandonado e um migrante morto são a mesma coisa -um "10-7"-, mas Stroud diz que não consegue se acostumar com as mortes."
A coisa mais difícil foi me sentar com um menino de 15 anos ao lado do corpo do pai dele", diz Stroud, texano fluente em espanhol. "O pai dele era cozinheiro. Era gordo demais para tentar cruzar a fronteira. Fizemos uma fogueira e tentamos consolar o garoto. Foi difícil".
Se o ritmo atual se mantiver, este terá sido o mais mortífero ano no mais movimentado corredor de contrabando humano dos EUA. "A situação não tem precedentes", disse o reverendo John Fife, presbiteriano de Tucson que participa ativamente dos esforços humanitários na fronteira. "Há dez anos quase não havia mortes na fronteira sudoeste do Arizona. O que eles fizeram foi criar esse corredor da morte. É darwinista -só os mais fortes sobrevivem".
Por anos, a morte dos que tentavam cruzar a fronteira acontecia em geral à noite, por atropelamento, em rodovias perto de áreas urbanas. Mas agora, com mais recursos técnicos e mais policiamento, os imigrantes ilegais se vêem forçados a tentar a travessia no sul do Arizona, um dos lugares mais inóspitos do planeta.
Eles morrem por causa do sol, calcinados no chão áspero do deserto de Sonora, onde a temperatura do solo chega a 55C antes ainda de começar o verão. Morrem congelados, nas alturas das pedras frias das montanhas Baboviquari, em noites sem lua. Morrem vítimas dos bandidos que os atacam, morrem devido a defeitos em seus carros, e morrem por problemas cardíacos.
O montanhoso deserto de Sonora, entre Yuma, no oeste, e Nogales, no leste, é o principal ponto de entrada ilegal ao longo dos 3.120 km de fronteira com o México, diz a Patrulha de Fronteira. Até o final de abril, as detenções de pessoas tentando cruzar a fronteira pelo deserto ao sul de Tucson aumentaram em 60% em relação ao ano anterior. Quase 300 mil pessoas foram apanhadas tentando entrar nos EUA pelo deserto desde 1º de outubro.
Depois de quatro anos de queda, as detenções - usadas pela Patrulha de Fronteira como referência para determinar o volume de contrabando humano- aumentaram em 30% ao longo do ano passado em toda a fronteira sul, com 825.305 presos entre 1º de outubro e o final de junho.
A travessia aqui, que envolve superar apenas uma cerca simples de arame farpado, é seguida por uma caminhada de dois ou três dias por 80 km de antigas trilhas em meio ao deserto, até a estrada mais próxima, que fica na reserva indígena da nação Tohono O'odham. A maior parte das pessoas viaja com menos de sete litros de água, em jarras plásticas.
O deserto fica recoberto de lixo garrafas plásticas vazias, roupas abandonadas, papel higiênico.
"Meus pés doem, tenho sede, mas vou tentar de novo, assim que descansar", disse Edmundo Saenz Garcia, 28, detido na reserva certa manhã, já perto do final de sua jornada. Os dedos de seus pés estavam inchados como salsichas e recobertos de bolhas. Ele usava botas de caubói.
Garcia disse ter ouvido sobre o novo plano de imigração de Bush, que concederia vistos de trabalho a milhões de imigrantes ilegais e a pessoas que provem ter emprego nos EUA, e não entendia por que tinha sido detido.
Os grupos que se opõem às fronteiras abertas dizem que o aumento no número de travessias e mortes foi causado pela proposta de Bush, bloqueada no Congresso e de aprovação improvável neste ano. Mas o plano criou interesse no México, afirmam.A fronteira sul agora está mais vulnerável do que em qualquer período histórico recente. "Criamos um incentivo para que as pessoas assumam riscos insensatos", disse Mark Krikorian, diretor do Centro de Estudos da Imigração, grupo de pesquisa que se opõe ao aumento da imigração. "Na prática, estamos dizendo que, se elas superarem aqueles obstáculos, poderão ficar aqui."
FSP, 04/07/2004

Negros e pardos são mais atingidos por desemprego e recebem menos

ANA PAULA GRABOIS
da Folha Online, no Rio
O desemprego atingiu mais negros e pardos do que brancos em março passado, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O levantamento foi feito com base na PME (Pesquisa Mensal do Emprego), realizada nas seis maiores regiões metropolitanas do país.A taxa de desemprego entre a população de cor preta ou parda chegou a 15,3%. Na população de cor branca, a taxa correspondeu a 11,1%. Na média das seis maiores regiões metropolitanas, a taxa de desemprego foi de 12,8%.A pesquisa também revela que negros e pardos receberam a metade da renda dos brancos. A renda média do branco correspondeu a R$ 1.096 em março mas a renda do pardo ou do negro foi de R$ 535.Em Salvador, onde 87% da população em idade ativa (de 10 anos ou mais) é de cor preta ou parda, a renda recebida por um trabalhador branco chega a superar em quase três vezes a recebida por um trabalhador negro ou pardo.O levantamento mostra ainda que a maioria (63,9%) de negros e pardos recebia até dois salários mínimos. Entre os empregados brancos, o percentual que recebeu até dois salários mínimos foi de 39,2%.Entre os trabalhadores com renda mais elevada (superior a 10 salários mínimos), a participação dos brancos é maior. Do total de trabalhadores brancos, 10,6% receberam mais que 10 salários mínimos. Entre pardos e negros, essa participação foi de apenas 1,7%.

FSP, 04/07/2004

7.03.2004

Economia dos EUA gera menos empregos do que o previsto

Houve forte queda no ritmo da expansão econômica, o que afeta a campanha de BushEduardo PorterEm Nova YorkO ritmo de crescimento na criação de empregos caiu fortemente em junho, informou o governo na sexta-feira (02/07). O resultado mostrou um recuo em relação a um período recente de forte queda no desemprego e lançou dúvidas quanto ao vigor da expansão econômica dos EUA.
O Departamento de Trabalho divulgou que foram criadas apenas 112.000 vagas em junho, menos da metade do aumento médio dos primeiros cinco meses do ano.
O aumento, que inclui ajustes estipulados para descontar as variações sazonais normais, ficou abaixo dos 150.000 empregos necessários para acompanhar o crescimento natural da força de trabalho. Também ficou bem abaixo da previsão de 250.000 dos economistas de Wall Street, que neste ano têm errado consistentemente as previsões de trabalho.
O índice de desemprego, que essencialmente não mudou o ano todo, continuou igual em maio, a 5,6%. "Está bem claro que a economia caiu em junho", disse Sung Won Sohn, economista do Wells Fargo & Co., em Minneapolis.
A fragilidade renovada nos índices de trabalho foi um golpe inesperado à campanha de reeleição do presidente Bush, que vem contando com a melhoria no mercado de trabalho para defender suas políticas econômicas. Além disso, o relatório ofereceu munição para o candidato Democrata, o senador John Kerry de Massachusetts, cujas críticas à política econômica de Bush tinham sido minadas pelo rápido ritmo de contratação do início do ano.
Vários economistas, entretanto, sugeriram que os números tímidos de junho foram um lapso, observando que as folhas de pagamento podem ser muito voláteis de mês a mês e previram que voltariam a crescer em julho.
"Vai precisar mais do que um mês fraco para nos convencer de que a economia está em dificuldades", disse Henry Willmore, economista da Barclays Capital.
Na Casa Branca, onde discursou para um grupo de pequenos empresários, Bush procurou explicar os novos dados em uma ótica otimista. "Os empregos aumentaram em 112.000 em junho, o que significa que tivemos um total de 1,5 milhão de novos empregos desde agosto", disse o presidente. "Para mim, isso é crescimento sustentado."
N. Gregory Mankiw, principal assessor econômico da Casa Branca, fez pouco do relatório, considerando-o uma aberração. Ele observou que outros indicadores econômicos - inclusive a confiança do consumidor e a pesquisa mensal de gerentes de compra- ainda apontam para uma recuperação econômica robusta.
"Não devemos exagerar o peso de nenhuma estatística mensal" específica, disse Mankiw. A queda na contratação ocorreu enquanto o índice de aprovação de Bush em questões econômicas parecia estar melhorando. Em uma pesquisa de opinião do Gallup no final de junho, 47% dos entrevistados disseram que aprovavam a forma que Bush vem lidando com a economia, contra 41% no início do mês.
O comitê de campanha de Kerry aproveitou os dados e emitiu um relatório ressaltando a fragilidade do mercado de trabalho desde que Bush assumiu a presidência, inclusive uma perda líquida de 1,8 milhão de empregos no setor privado.
"Vimos três meses de contratação decente nos últimos três anos e meio. Mas ainda estamos longe de recuperar os milhões de empregos perdidos com o presidente Bush", disse Jason Furman, diretor de política econômica da campanha de Kerry.
Apesar de muitos economistas acreditarem que a economia manterá um ritmo forte, uma variedade de sinais recentes sugere que a recuperação pode estar perdendo o gás.
Na semana passada, o governo cortou sua estimativa original de crescimento econômico no primeiro trimestre de 4,2% para 3,9%. Outras indicadores de debilidade no comércio varejista, na compra de automóveis e de bens duráveis também apontaram para uma retração no forte desempenho da economia dos últimos meses.
Os preços de ações caíram com o informe sobre o fraco desempenho do emprego. Os preços de bônus aumentaram fortemente, já que os dados tranqüilizaram temores que o crescimento econômico acelerado fosse alimentar a inflação. Isso ajudou a validar a estratégia do Federal Reserve, de aumentar as taxas de juros gradualmente. O dólar caiu diante das principais moedas estrangeiras com as expectativas de que as taxas de juros nos EUA permanecerão baixas por um longo período de tempo."
Faz o Fed parecer certo em sua abordagem", disse James W. Paulsen, estrategista de investimento da Wells Capital Management, em Minneapolis.Ian Shepherdson, diretor de economia americana do High Frequency Economics em Valhalla, Nova York, argumentou que os dados de empregos estavam fora de sincronia com outras evidências econômicas.
Shepherdson sugeriu que o novo método do Departamento de Estado para calcular o ajuste sazonal pode ser responsável pelo número inesperadamente baixo. Outros economistas mencionaram que os dados podem ter sido distorcidos porque muitos trabalhadores tiraram um dia de folga no funeral do ex-presidente Ronald Reagan, que ocorreu durante a semana em que foi feita a pesquisa de empregos. Isso poderia ter reduzido artificialmente o número registrado de horas trabalhadas."
A explicação menos provável é que a economia está virando", disse Shepherdson. "A economia dos EUA não implode espontaneamente.
"Mesmo assim, até que surjam novas evidências, o informe de emprego de junho deixou uma ampla impressão de fraqueza. Os salários de trabalhadores do setor privado, em cargos sem responsabilidade de supervisão -80% do emprego total- mal aumentaram, para US$ 15,65 (cerca de R$ 47) por hora. Isso representa meros 2% de aumento do ano passado, insuficiente para manter o poder de compra dos trabalhadores contra a inflação atual de cerca de 3%.
A média de horas de trabalho por semana caiu para 33,6 em junho, de 33,8 horas em maio. Como conseqüência, os vencimentos semanais dos trabalhadores privados sem responsabilidade de supervisão de fato caíram no mês, para US$ 525,84 (em torno de R$ 1.580), de US$ 528,29 (aproximadamente R$ 1.585) no mês anterior.
Talvez a mais ampla mortalha por cima da recuperação econômica sejam as horas totais semanais trabalhadas no setor privado. Como envolve todas as horas trabalhadas por todos os trabalhadores fornece uma boa medida do estado geral da economia e caiu de 100,2 em maio, para 99,6 em junho.
Alguns pontos que antes brilhavam, escureceram. A construção, que acrescentou 250.000 vagas nos 11 meses anteriores, estagnou. O crescimento em empregos de hotéis e restaurantes diminuiu. O florescimento breve de empregos na manufatura foi estancado, com o número de empregos na manufatura caindo em 11.000, depois de ter aumentado em 24.000 em maio.
Mesmo que a queda na criação de empregos aponte para uma desaceleração do crescimento econômico, os números recentes não marcam um fim da recuperação. "Isso não significa que a expansão acabou. Mas essa expansão nunca foi de céu totalmente azul. Isso reforça a sensação de insegurança em relação à expansão", disse Jared Bernstein, do Instituto de Política Econômica, instituto de pesquisa econômica que tende para a esquerda.
De fato, muitos economistas agora estarão esperando ansiosamente pelo próximo resultado de vagas. "Isso me deixa preocupado com a solidez da recuperação, que até agora parecia clara. Se tivermos um segundo mês fraco, isso vai começar a afetar minha opinião", disse Alan Blinder, economista de Princeton que é ex-vice-diretor do Federal Reserve e hoje é assessor da campanha de Kerry para assuntos econômicos.
Tradução: Deborah Weinberg
The New York Times, 03/07/2004