Estresse acelera o processo de envelhecimento
Cientistas dos EUA relacionam sofrimento psíquico à idade biológica
Benedict Carey
Em Nova York
Alguns eventos estressantes parecem deixar uma pessoa grisalha do dia para a noite. Agora, uma equipe de pesquisadores descobriu que o sofrimento emocional severo --por uma experiência de divórcio, de demissão ou pelos cuidados com um membro doente da família-- podem acelerar o envelhecimento das células do corpo em um nível genético.
As descobertas, divulgadas nesta terça-feira (30/11), são as primeiras a ligar o estresse psicológico tão diretamente à idade biológica.
Os pesquisadores descobriram que, geneticamente, as células brancas do sangue de mulheres que passaram muitos anos cuidando de uma criança enferma eram cerca de uma década mais velhas do que as de outras mulheres, que tiveram muito menos experiências desse tipo.
O estudo, que será publicado pela "Proceedings of the National Academy of Sciences", também sugere que o fato de a pessoa se ver estressada pode acrescentar anos a sua idade biológica.
Os médicos já associaram o estresse psicológico crônico com o enfraquecimento da função imune, gerando maior risco de resfriados, entre outras coisas. No entanto, eles ainda estão tentando compreender como a tensão danifica ou enfraquece os tecidos. A pesquisa sugere como tal dano pode ocorrer e abre uma possibilidade de o processo ser revertido.
"Esta é uma descoberta nova e significativa", disse Bruce McEwen, diretor do laboratório de neuroendocrinologia da Universidade Rockefeller, em Nova York.
McEwen disse que a pesquisa forneceu as evidências mais claras até hoje "do preço de desgaste nos tecidos que todo mundo com uma vida estressante paga."
"Sabemos que, quando ficamos mais velhos, temos maior tendência a engordar e desenvolver doenças cardíacas e diabetes", prosseguiu.
No experimento, Elissa Epel e Elizabeth Blackburn, da Universidade da Califórnia em San Francisco, lideraram uma equipe de pesquisadores que analisaram amostras de sangue de 58 mães jovens e de meia idade; 39 delas cuidavam de uma criança com um distúrbio crônico, como autismo ou paralisia cerebral. Usando técnicas eletrônicas, os médicos examinaram o DNA das células brancas do sangue, que são centrais à resposta imune do corpo à infecção.
Os pesquisadores concentraram-se em um pedaço de DNA chamado telômero, na ponta dos cromossomos de cada célula. O telômero se encurta cada vez que a célula se divide. As células podem se reproduzir muitas vezes durante a vida, para reparar e consertar órgãos, para crescer ou combater doenças. Uma enzima chamada telomerase ajuda a restaurar o telômero a cada divisão.
No entanto, depois de 10 a 50 divisões --o número varia com o tipo e a saúde do tecido, e os biólogos não entendem bem o sistema-- o telômero fica mais curto, e a célula é efetivamente aposentada, incapaz de replicar-se.
Quem nasce com uma doença genética chamada disqueratose congênita, que causa o encurtamento acelerado dos telômeros, morre cedo, em geral na meia-idade, frequentemente como resultado de complicações causadas pela baixa imunidade.
Resumindo, o tamanho relativo do telômero serve como medida bruta da idade da célula, de sua vitalidade.
Quando os pesquisadores compararam o DNA de mães que cuidavam de crianças deficientes, encontraram uma tendência marcante: levando em conta a idade de cada uma, calcularam que, quanto mais tempo a mulher tomou conta de seus filhos, mais curtos eram seus telômeros e a atividade de sua telomerase. Algumas das mães mais experientes eram anos mais velhas que sua idade cronológica, segundo a medição de suas células brancas do sangue.
"Quando as pessoas estão sob estresse, parecem emaciadas; é como se envelhecessem a olhos vistos. Aqui temos algo no nível molecular", que reflete essa impressão, disse Blackburn, professora de bioquímica e biofísica.
Os pesquisadores também deram um questionário às mulheres, pedindo que estimassem, em uma escala de três pontos, como se sentiam em suas vidas diárias, se eram sobrecarregadas, e quantas vezes não conseguiam controlar aspectos importantes de suas vidas.
As mulheres que disseram que estavam sob estresse pesado também apresentaram telômeros encurtados, em relação às que se sentiam mais relaxadas --com ou sem filhos deficientes.
"Algumas das mães que tinham muito estresse objetivo e verdadeiro também tinham uma percepção baixa de seu próprio estresse. O próximo passo é tentar compreender o que promove esse tipo de resistência", disse Epel.
Ela disse que o grupo tinha planos de testar o efeito da meditação, do treinamento da mente e da ioga na percepção do próprio estresse e no tamanho do telômero. Uma forma de aconselhamento chamada terapia cognitiva, na qual as pessoas aprendem a moderar suas respostas ao estresse, também pode ajudar, segundo os psicólogos.
A personalidade e a criação quase certamente são responsáveis por parte dessa diferença, entretanto. Em 2003, pesquisadores que acompanharam 850 neozelandeses do nascimento até os 26 anos de idade viram que variações em um único gene ajudavam a prever quais crianças seriam mais suscetíveis à depressão depois de eventos estressantes como divórcio e desemprego.
Pesquisadores dos Institutos Nacionais de Saúde mostraram, em macacos, que a criação calorosa e atenciosa dos filhos pode proteger os jovens animais precisamente dessa variação genética, promovendo resistência em indivíduos geneticamente vulneráveis. Uma criação fria ou abusiva, dizem os psiquiatras, pode ter o efeito oposto.
"Todos esses fatores se combinam e modulam a forma como a pessoa lida com o estresse", disse Ronald Glaser, diretor do Instituto de Pesquisa de Medicina de Comportamento da Universidade Estadual de Ohio.
Junto com sua esposa, Janice Kiecolt-Glaser, ele documentou o efeito do estresse na função imune. "Agora temos evidências, vindas de vários campos de estudo --de cura de feridas, de inflamações, de vacinas e de idade celular-- que realmente corroboram" que o estresse pode causar verdadeiro dano.
Especialistas advertem que o estudo do telômero precisa ser duplicado e que ninguém ainda mostrou de forma convincente que o estresse psicológico pode encurtar significativamente a vida das pessoas. Além disso, está longe de claro como uma preocupação com uma dificuldade de aprendizado de uma criança, por exemplo, poderia levar a um encurtamento dos telômeros dos pais antes do tempo.
Apesar de os pesquisadores saberem que tensão emocional desse tipo promove a liberação de hormônios de estresse, como o cortisol, que com o tempo pode prejudicar as células, ninguém sabe como esses hormônios e outras toxinas relacionadas ao estresse afetam os telômeros.
"Nesse instante, essa é a caixa preta", disse Blackburn, "e é isso que vamos estudar agora".
Tradução: Deborah Weinberg
The New York Times
Benedict Carey
Em Nova York
Alguns eventos estressantes parecem deixar uma pessoa grisalha do dia para a noite. Agora, uma equipe de pesquisadores descobriu que o sofrimento emocional severo --por uma experiência de divórcio, de demissão ou pelos cuidados com um membro doente da família-- podem acelerar o envelhecimento das células do corpo em um nível genético.
As descobertas, divulgadas nesta terça-feira (30/11), são as primeiras a ligar o estresse psicológico tão diretamente à idade biológica.
Os pesquisadores descobriram que, geneticamente, as células brancas do sangue de mulheres que passaram muitos anos cuidando de uma criança enferma eram cerca de uma década mais velhas do que as de outras mulheres, que tiveram muito menos experiências desse tipo.
O estudo, que será publicado pela "Proceedings of the National Academy of Sciences", também sugere que o fato de a pessoa se ver estressada pode acrescentar anos a sua idade biológica.
Os médicos já associaram o estresse psicológico crônico com o enfraquecimento da função imune, gerando maior risco de resfriados, entre outras coisas. No entanto, eles ainda estão tentando compreender como a tensão danifica ou enfraquece os tecidos. A pesquisa sugere como tal dano pode ocorrer e abre uma possibilidade de o processo ser revertido.
"Esta é uma descoberta nova e significativa", disse Bruce McEwen, diretor do laboratório de neuroendocrinologia da Universidade Rockefeller, em Nova York.
McEwen disse que a pesquisa forneceu as evidências mais claras até hoje "do preço de desgaste nos tecidos que todo mundo com uma vida estressante paga."
"Sabemos que, quando ficamos mais velhos, temos maior tendência a engordar e desenvolver doenças cardíacas e diabetes", prosseguiu.
No experimento, Elissa Epel e Elizabeth Blackburn, da Universidade da Califórnia em San Francisco, lideraram uma equipe de pesquisadores que analisaram amostras de sangue de 58 mães jovens e de meia idade; 39 delas cuidavam de uma criança com um distúrbio crônico, como autismo ou paralisia cerebral. Usando técnicas eletrônicas, os médicos examinaram o DNA das células brancas do sangue, que são centrais à resposta imune do corpo à infecção.
Os pesquisadores concentraram-se em um pedaço de DNA chamado telômero, na ponta dos cromossomos de cada célula. O telômero se encurta cada vez que a célula se divide. As células podem se reproduzir muitas vezes durante a vida, para reparar e consertar órgãos, para crescer ou combater doenças. Uma enzima chamada telomerase ajuda a restaurar o telômero a cada divisão.
No entanto, depois de 10 a 50 divisões --o número varia com o tipo e a saúde do tecido, e os biólogos não entendem bem o sistema-- o telômero fica mais curto, e a célula é efetivamente aposentada, incapaz de replicar-se.
Quem nasce com uma doença genética chamada disqueratose congênita, que causa o encurtamento acelerado dos telômeros, morre cedo, em geral na meia-idade, frequentemente como resultado de complicações causadas pela baixa imunidade.
Resumindo, o tamanho relativo do telômero serve como medida bruta da idade da célula, de sua vitalidade.
Quando os pesquisadores compararam o DNA de mães que cuidavam de crianças deficientes, encontraram uma tendência marcante: levando em conta a idade de cada uma, calcularam que, quanto mais tempo a mulher tomou conta de seus filhos, mais curtos eram seus telômeros e a atividade de sua telomerase. Algumas das mães mais experientes eram anos mais velhas que sua idade cronológica, segundo a medição de suas células brancas do sangue.
"Quando as pessoas estão sob estresse, parecem emaciadas; é como se envelhecessem a olhos vistos. Aqui temos algo no nível molecular", que reflete essa impressão, disse Blackburn, professora de bioquímica e biofísica.
Os pesquisadores também deram um questionário às mulheres, pedindo que estimassem, em uma escala de três pontos, como se sentiam em suas vidas diárias, se eram sobrecarregadas, e quantas vezes não conseguiam controlar aspectos importantes de suas vidas.
As mulheres que disseram que estavam sob estresse pesado também apresentaram telômeros encurtados, em relação às que se sentiam mais relaxadas --com ou sem filhos deficientes.
"Algumas das mães que tinham muito estresse objetivo e verdadeiro também tinham uma percepção baixa de seu próprio estresse. O próximo passo é tentar compreender o que promove esse tipo de resistência", disse Epel.
Ela disse que o grupo tinha planos de testar o efeito da meditação, do treinamento da mente e da ioga na percepção do próprio estresse e no tamanho do telômero. Uma forma de aconselhamento chamada terapia cognitiva, na qual as pessoas aprendem a moderar suas respostas ao estresse, também pode ajudar, segundo os psicólogos.
A personalidade e a criação quase certamente são responsáveis por parte dessa diferença, entretanto. Em 2003, pesquisadores que acompanharam 850 neozelandeses do nascimento até os 26 anos de idade viram que variações em um único gene ajudavam a prever quais crianças seriam mais suscetíveis à depressão depois de eventos estressantes como divórcio e desemprego.
Pesquisadores dos Institutos Nacionais de Saúde mostraram, em macacos, que a criação calorosa e atenciosa dos filhos pode proteger os jovens animais precisamente dessa variação genética, promovendo resistência em indivíduos geneticamente vulneráveis. Uma criação fria ou abusiva, dizem os psiquiatras, pode ter o efeito oposto.
"Todos esses fatores se combinam e modulam a forma como a pessoa lida com o estresse", disse Ronald Glaser, diretor do Instituto de Pesquisa de Medicina de Comportamento da Universidade Estadual de Ohio.
Junto com sua esposa, Janice Kiecolt-Glaser, ele documentou o efeito do estresse na função imune. "Agora temos evidências, vindas de vários campos de estudo --de cura de feridas, de inflamações, de vacinas e de idade celular-- que realmente corroboram" que o estresse pode causar verdadeiro dano.
Especialistas advertem que o estudo do telômero precisa ser duplicado e que ninguém ainda mostrou de forma convincente que o estresse psicológico pode encurtar significativamente a vida das pessoas. Além disso, está longe de claro como uma preocupação com uma dificuldade de aprendizado de uma criança, por exemplo, poderia levar a um encurtamento dos telômeros dos pais antes do tempo.
Apesar de os pesquisadores saberem que tensão emocional desse tipo promove a liberação de hormônios de estresse, como o cortisol, que com o tempo pode prejudicar as células, ninguém sabe como esses hormônios e outras toxinas relacionadas ao estresse afetam os telômeros.
"Nesse instante, essa é a caixa preta", disse Blackburn, "e é isso que vamos estudar agora".
Tradução: Deborah Weinberg
The New York Times
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