3.21.2005

Rotatividade elevada impede que o trabalhador ganhe experiência

DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Os números da rotatividade no mercado de trabalho formal brasileiro impressionam. Em períodos de crescimento econômico ou não, metade da força de trabalho com registro em carteira mudou de posição a cada ano, de acordo com informações do Ministério do Trabalho e Emprego.
Em 2004, enquanto 11,3 milhões de trabalhadores foram contratados, 9,8 milhões foram demitidos. "A maioria desses trabalhadores está na população de baixa renda, com menor qualificação e menores salários. A rotatividade é muito grande, olhando sob qualquer ponto de vista", avalia a coordenadora do Observatório do Mercado de Trabalho, Paula Montagner. O órgão faz parte do MTE.
Na avaliação da especialista, um dos principais efeitos do entra-e-sai de trabalhadores é a dificuldade de os profissionais acumularem conhecimento, já que uma parte da formação profissional deriva do nível de escolaridade e a outra, do acúmulo de experiência.
"Se o trabalhador não fica muito tempo em um emprego, como vai adquirir experiência?", questiona Montagner. Dados do Observatório mostram que o tempo médio de permanência de 50% dos trabalhadores brasileiros em um cargo é de dois anos. No Japão, a média fica entre 12 e 15 anos. Na Europa, dez anos.
Segundo a coordenadora, sem trabalhadores com acúmulo de conhecimento, a economia se ressente, pois a produtividade das empresas cai.

Sem criatividade
Entre outros fatores, o trabalhador que não se estabiliza em uma função não é capaz de desenvolver soluções criativas para problemas. As empresas também deixam de investir na formação dessa mão-de-obra instável. "E a produtividade obtida no final é espúria, porque passa pelo não-aumento dos salários", afirma ela.
A alta rotatividade também afeta a elaboração de políticas públicas de capacitação. Exemplo: um vendedor de biscoitos, que passa a trabalhar na construção civil e, em seguida, vai para atividades de suporte na área de transporte. Qual a habilidade desse trabalhador? Que tipo de capacitação ele precisa?
De acordo com Montagner, a discussão sobre a rotatividade no mercado brasileiro não é nova. Trata-se de uma característica que começou a ser discutida na década de 70, quando houve forte migração de trabalhadores do campo para áreas urbanas.
"Mas, naquele tempo, havia um entendimento de que a rotatividade fosse diminuir ao longo dos anos, pois a migração teria sido superada, o setor urbano estaria mais assentado e a indústria consolidada. Não foi o que aconteceu", relata a pesquisadora.
O ritmo da rotatividade continua crescente e começa a se espalhar por outros setores do mercado de trabalho. "Já se alastrou entre os trabalhadores com segundo grau. Especialistas dizem que já está atingindo também trabalhadores com terceiro grau completo." (JS)

FOLHA DE SÃO PAULO