1.24.2005

Dois sindicalistas estão entre acusados de tortura

FEBEM

Dirigentes do sindicato dos empregados respondem a processo em liberdade

GILMAR PENTEADO
DA REPORTAGEM LOCAL

Dois dirigentes do sindicato que representa os empregados da Febem estão na lista de 201 funcionários e ex-funcionários da instituição na capital e na região metropolitana que respondem a processo em liberdade ou estão com prisão preventiva decretada por acusação de tortura.
O Sitraemfa (Sindicato os Trabalhadores em Entidades de Assistência ao Menor e à Família do Estado de São Paulo) é acusado por entidades do menor e de direitos humanos de defender torturadores. Desde 2000, 15 denúncias por tortura foram apresentadas pelo Ministério Público e aceitas pela Justiça da capital e da Grande São Paulo.
Na última sexta-feira, 27 funcionários tiveram a prisão preventiva (até o julgamento) decretada. A denúncia da Promotoria, que deve atingir um número maior de agentes e monitores, será apresentada entre hoje e amanhã.
Os nomes dos dirigentes do Sitraemfa aparecem nas denúncias anteriores. Edson Brito Silva, atual diretor de comunicação do sindicato, responde processo em liberdade por um incidente ocorrido em setembro de 1999, no extinto complexo Imigrantes.
Ele e mais 19 funcionários foram acusados de torturar 77 internos. O processo tramita desde 2002 na 13ª Vara Criminal de São Paulo. Está na fase de interrogatório. Cumpre ainda o estágio inicial por causa do grande número de vítimas e de réus.
Antônio de Souza Neves, também da diretoria do Sitraemfa, é outro que está na lista dos denunciados. Ele foi acusado por duas vezes pelo Ministério Público. Em uma delas, Neves e mais 22 funcionários foram denunciados por supostamente torturar 28 internos no cadeião de Pinheiros, zona oeste de São Paulo, onde os adolescentes foram colocados improvisadamente em 2000.
Em novembro passado, os 23 funcionários foram absolvidos por falta de provas. Dois internos que reconheceram Neves como autor de agressões no distrito policial não confirmaram a identificação na Justiça. Segundo relato da Promotoria no processo, talvez por medo de represálias.
Em outro processo, no entanto, Neves e outros oito funcionários da Febem foram acusados de torturar 29 internos da UI - 13 (complexo Tatuapé). O grupo acompanha em liberdade o processo que tramita na 24ª Vara Criminal de São Paulo desde 2002.
"Esse fato [dos dois dirigentes sindicais processados] é vergonhoso e mostra por que o sindicato acoberta torturadores e prioriza a defesa deles", afirmou Ariel de Castro Alves, coordenador estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos.
Segundo Alves, entidades do menor e de direitos humanos querem que a CUT (Central Única dos Trabalhadores) abra um processo de ética contra o Sitraemfa e o desfilie da central sindical. Eles também defendem que o sindicato seja investigado pelo Ministério Público por suposta incitação de rebeliões.
Em 2003, o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado do Ministério Público) denunciou oito funcionários das unidades 30 e 31 de Franco da Rocha -já desativadas-, na Grande São Paulo, por supostamente incitarem uma série de rebeliões no complexo. "Queremos que essa investigação continue", afirmou Alves.
O presidente da CUT, Luiz Marinho, disse que a central desconhece se algum dirigente do Sitraemfa esteja sendo processado por tortura. "Se isso ocorreu, o sindicato tem, no mínimo, que afastar a pessoa. Mas isso faz parte do foro do Sitraemfa."
O presidente da CUT disse que o Sitraemfa cometeu equívocos, como convocar uma greve após a prisão de funcionários da unidade 41, na Vila Maria, por suspeita de tortura. O ato foi suspenso, segundo Marinho, a pedido da CUT porque parecia uma defesa prévia dos supostos torturadores.

Sindicato diz que acusados são inocentes e teme "linchamento"

DA REPORTAGEM LOCAL

Para o Sitraemfa, os dois dirigentes processados por tortura são inocentes e qualquer represália contra eles seria um julgamento precipitado. "Linchamento antecipado é muito perigoso. Isso seria a barbárie", afirmou o ex-presidente e hoje diretor do sindicato Antonio Gilberto da Silva.
Questionado sobre as denúncias de tortura envolvendo membros do sindicato, Silva disse inicialmente que se falava do caso, mas ninguém apontava os nomes. Ao ser informado pela reportagem dos processos envolvendo os dirigentes, ele disse que os fatos ocorreram antes de os dois processados assumirem as funções na entidade. Os dois fazem parte da diretoria do Sitraemfa desde dezembro de 2001.
"Eles não têm coragem de matar uma mosca", afirmou Silva. Segundo ele, os processos contra os dois dirigentes "caminham para a absolvição". "Os dois receberam várias cartas de elogios devido ao bom trabalho junto aos internos. Isso ninguém fala", disse.
O dirigente Antônio de Souza Neves também salientou que o fato pelo qual ainda é acusado ocorreu antes de assumir o cargo no sindicato. Ele disse que é inocente das duas acusações.
No primeiro processo, de um suposto espancamento no cadeião de Pinheiros, Neves afirmou que os internos apresentaram lesões anteriores à chegada naquela unidade. Nesse caso, ele já foi absolvido pela Justiça.
No outro processo, que ainda tramita na Justiça, de suposta sessão de tortura na unidade 13 (complexo Tatuapé) da Febem, Neves afirmou que houve um confronto entre adolescentes e funcionários. "Houve necessidade de contenção. As entidades que denunciaram isso só ouviram um lado", disse o dirigente.
O diretor de comunicação, Edson Brito Silva, não foi encontrado pela reportagem. A chamada de seu telefone celular estava desviada para a sede do sindicato. A entidade disse que não tinha outro contato de Brito.
Ele nega que o sindicato compactue com torturadores, como afirmam entidades do menor e de direitos humanos. Uma mostra disso, segundo ele, ocorreu em 2001, quando o sindicato teria denunciado um suposto espancamento de internos na unidade da Febem de São Vicente (litoral paulista) praticado por policiais militares e outros funcionários deslocados para o local.
Para Silva, o incidente ocorrido na unidade 41 foi planejado pela Febem para desmoralizar a categoria. "Se existe tortura, é porque o Estado não cumpre a lei. Em vez de colocar 40 em uma unidade, coloca 200. E são poucos funcionários para cuidar dos internos."

FOLHA DE SAO PAULO