A multiplicação da pobreza
Nos bolsões de miséria do Brasil, o númerode filhos por mulher se iguala ao dos maispobres países africanos
Monica Weinberg
Custodio Coimbra
Para definir a taxa de fecundidade "ideal", que aponta para a estabilização do crescimento populacional de um país, demógrafos partiram de um pressuposto simples: o de que crianças são geradas por duas pessoas que, um dia, irão morrer e deverão, portanto, ser substituídas por outras duas. A chamada "taxa de reposição" é, por esse motivo, de 2,1 filhos por mulher. O Brasil já teve uma média quase três vezes superior a essa. Hoje, as famílias têm, em média, 2,3 crianças – índice bem próximo do necessário para o equilíbrio populacional. Estaria tudo muito bem não fosse o fato de que essa aparente normalidade escamoteia uma realidade preocupante: a de que persistem no mapa brasileiro regiões onde as mulheres têm um bebê por ano e chegam ao fim de sua vida fértil com mais de vinte filhos, reproduzindo um quadro semelhante ao exibido por países tão miseráveis quanto Somália e Uganda, na África. Mais grave que isso: diferentemente do que ocorria até pouco tempo atrás, esses bolsões de descontrole populacional não se situam apenas em rincões, mas nos grandes centros urbanos também – as favelas se tornaram ilhas de explosão demográfica dentro das metrópoles.
Um dado extraído do Censo do IBGE indica que, na última década, a população de favelas aumentou num ritmo quase três vezes superior à média brasileira. As maiores expansões ocorreram nas cidades de São Paulo, Belém e Rio de Janeiro. Nesta última, enquanto a população cresceu a uma taxa de 0,74% ao ano na década passada, o número de habitantes de favelas aumentou a um ritmo de 2,4%, segundo pesquisa feita pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE, em conjunto com o Instituto Pereira Passos. Ao decomporem os fatores responsáveis pelo crescimento populacional nesses bolsões, os pesquisadores concluíram que a razão principal (com peso de 35%) foi o aumento da fecundidade, seguido pela imigração (com peso de 17%). Há outros elementos que, isoladamente, tiveram influência menor, como o aumento da expectativa de vida e a chegada de pessoas empobrecidas da própria cidade. Uma projeção feita pela Fundação Getúlio Vargas indica que a população favelada brasileira irá mais do que dobrar nos próximos dez anos: poderá chegar a 13,5 milhões de pessoas caso o ritmo de crescimento populacional nessas áreas permaneça estável.
Há muito se sabe que é um equívoco creditar ao simples aumento da fecundidade o crescimento da pobreza e da desigualdade. Fosse assim, o contrário também deveria ser verdadeiro: o fato de o Brasil ter atingido uma média geral de nascimentos quase idêntica à dos Estados Unidos (2,0 filhos por mulher) levaria por si só a que, num futuro próximo, sua economia se tornasse tão reluzente quanto a de um país desenvolvido. Os números comprovam, porém, que existe um vínculo estreito entre o crescimento populacional e o desenvolvimento de uma economia. As mais pobres regiões brasileiras são as que têm as mais altas taxas de fecundidade. Nas mais ricas, é o oposto. A cidade com o menor índice de fecundidade do Brasil, São Caetano do Sul (SP), é a que apresenta a segunda maior renda per capita do país. O mesmo ocorre no âmbito das famílias: em lares onde a renda per capita não supera um quarto de salário mínimo, há em média cinco filhos, segundo o IBGE. Quando essa renda ultrapassa cinco salários mínimos, predomina o filho único. O alto número de filhos seria a razão da pobreza ou sua conseqüência? As duas coisas, respondem especialistas. Com muitos filhos, uma família com renda já escassa fica com o orçamento ainda mais espremido. As crianças são forçadas a largar os estudos para trabalhar e, assim, diminuem suas chances de superar a condição de pobreza. Sabe-se também que mulheres que não tiveram acesso ao estudo têm até três vezes mais filhos do que as que cursaram a universidade. "As altas taxas de fecundidade funcionam como uma espécie de combustível que faz girar um ciclo perverso de miséria", observa o economista Marcelo Neri, da FGV.
O processo de urbanização foi um dos fatores que contribuíram para refrear o aumento populacional no Brasil. Ao trocarem o campo pela cidade, as pessoas passaram a ter acesso a serviços públicos como saúde e educação. A universalização da previdência também influenciou na redução dos nascimentos, sobretudo porque fez arrefecer a crença, até hoje persistente em áreas rurais, de que a única fonte de renda na velhice viria do trabalho dos filhos – o benefício fez diminuir o temor dos brasileiros de chegar à velhice sem nenhum tostão. Um estudo feito na década de 70 chegou à curiosa conclusão de que as telenovelas foram outro fator a ajudar no encolhimento dos lares. "Como a maioria delas exibia famílias de dois filhos, o padrão acabou influenciando os casais", diz a demógrafa Elza Berquó, do Núcleo de Estudos da População da Unicamp, que participou da pesquisa na época.
A história das políticas de planejamento familiar é cheia de idas e vindas. Embora a distribuição de preservativos pelos hospitais públicos tenha começado nos anos 70, foi só a partir de 1996, por força de lei, que camisinhas e anticoncepcionais começaram a chegar sistematicamente às regiões mais pobres e distantes das grandes cidades. Agora, o governo federal está preparando um pacote de medidas, a ser anunciado ainda neste mês, que promete aumentar a opção de anticoncepcionais ofertados pelo Estado e dobrar o número de hospitais públicos que fazem esterilizações, hoje disponíveis em menos de 10% dos municípios brasileiros. A interferência governamental exige precisão cirúrgica para que não cause danos difíceis de reverter. O Brasil já exibe uma queda consistente nas taxas de crescimento populacional. Uma ação generalizada poderia acelerar perigosamente essa tendência. Demógrafos afirmam que é muito mais fácil diminuir a taxa de fecundidade do que aumentá-la.
Há anos a Europa assiste à diminuição de sua população. A situação é particularmente grave em países como Itália, Espanha, Alemanha e Suíça, todos com crescimento populacional próximo de zero. Diante da perspectiva de diminuir, esses países passaram a implantar programas de estímulo à natalidade, que incluem de abatimento no imposto de renda a licença remunerada de até um ano para os candidatos a pais. Na Itália, que junto com a Espanha tem a menor taxa de natalidade da Europa (1,2 filho por casal), o problema ganhou proporções tão dramáticas que a Igreja resolveu interferir: "Italianos, façam filhos", foi o slogan da campanha lançada há dois anos. Nem o incentivo da Igreja Católica nem as benesses oferecidas pelo governo estão dando resultados. Projeções indicam que tanto a Itália quanto a Suíça estão prestes a ter crescimento populacional negativo. Ou seja, encolherão de fato. Assim como a Alemanha, a Itália já afrouxou as exigências para a entrada de imigrantes dispostos a trabalhar – a única maneira de manter a economia funcionando nos níveis atuais.
No Brasil, embora o crescimento populacional continue caindo, as regiões pobres e, sobretudo, as favelas vêem agravar-se fenômenos que apontam na direção contrária, como o aumento da gravidez na adolescência, por exemplo. O último censo mostrou que mulheres de baixa renda estão tendo filhos cada vez mais cedo. Nos últimos dez anos, aumentou em 42% o número de mães pobres na faixa de 15 a 19 anos. "A ação do governo tem de ser precisa e baseada em estudos que ataquem problemas localizados como esse", diz o demógrafo Paulo Murad Saad, da Divisão de Populações da Organização das Nações Unidas. Ou seja, regiões com diferentes níveis de instrução e riqueza têm de ser alvo de políticas específicas.
Bagre tem renda per capita anual de 20 dólares (a média nacional é de 2 800 dólares) e metade da população ganha menos de 25% do salário mínimo. Mais de um terço dos seus 8 792 habitantes em idade escolar nunca entrou numa sala de aula e outros 40% não estudaram mais que três anos. À miséria e à baixa escolaridade soma-se o fato de que só recentemente a cidade ouviu falar em planejamento familiar. "O governo começou a distribuir pílulas e preservativos apenas em 2001", diz o secretário de Saúde municipal, Carmelino Nunes. A iniciativa, ao que parece, deu poucos resultados até agora. Apenas 32 casais, 25 homens solteiros e 29 mulheres vão ao posto de saúde regularmente retirar preservativos e só 39 mulheres comparecem ao local em busca de pílulas. "É quase nada, mas é muito quando se sabe que estamos em um lugar em que os homens não admitem usar camisinha e, muitas vezes, proíbem às mulheres que se consultem com ginecologistas", afirma o secretário Nunes.
Como ocorre em boa parte das regiões mais pobres do Brasil, com economia baseada no extrativismo e na agricultura familiar, muitos casais desejam famílias grandes baseados na crença de que cada filho é um par de braços a mais para trabalhar na lavoura. "O bom de ter muitos filhos é ter mais gente para ajudar no trabalho quando precisa", diz Mercedes dos Santos, 41 anos, dezessete filhos e uma única fonte de renda fixa: os 95 reais do programa do governo federal Bolsa Família.
Leonardo Coutinho, de Bagre
Monica Weinberg
Custodio Coimbra
Ag. O Globo
Favela da Rocinha, a maior do Rio: para moradoras, filhos dão "status" e impõem respeito
Para definir a taxa de fecundidade "ideal", que aponta para a estabilização do crescimento populacional de um país, demógrafos partiram de um pressuposto simples: o de que crianças são geradas por duas pessoas que, um dia, irão morrer e deverão, portanto, ser substituídas por outras duas. A chamada "taxa de reposição" é, por esse motivo, de 2,1 filhos por mulher. O Brasil já teve uma média quase três vezes superior a essa. Hoje, as famílias têm, em média, 2,3 crianças – índice bem próximo do necessário para o equilíbrio populacional. Estaria tudo muito bem não fosse o fato de que essa aparente normalidade escamoteia uma realidade preocupante: a de que persistem no mapa brasileiro regiões onde as mulheres têm um bebê por ano e chegam ao fim de sua vida fértil com mais de vinte filhos, reproduzindo um quadro semelhante ao exibido por países tão miseráveis quanto Somália e Uganda, na África. Mais grave que isso: diferentemente do que ocorria até pouco tempo atrás, esses bolsões de descontrole populacional não se situam apenas em rincões, mas nos grandes centros urbanos também – as favelas se tornaram ilhas de explosão demográfica dentro das metrópoles.
Um dado extraído do Censo do IBGE indica que, na última década, a população de favelas aumentou num ritmo quase três vezes superior à média brasileira. As maiores expansões ocorreram nas cidades de São Paulo, Belém e Rio de Janeiro. Nesta última, enquanto a população cresceu a uma taxa de 0,74% ao ano na década passada, o número de habitantes de favelas aumentou a um ritmo de 2,4%, segundo pesquisa feita pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE, em conjunto com o Instituto Pereira Passos. Ao decomporem os fatores responsáveis pelo crescimento populacional nesses bolsões, os pesquisadores concluíram que a razão principal (com peso de 35%) foi o aumento da fecundidade, seguido pela imigração (com peso de 17%). Há outros elementos que, isoladamente, tiveram influência menor, como o aumento da expectativa de vida e a chegada de pessoas empobrecidas da própria cidade. Uma projeção feita pela Fundação Getúlio Vargas indica que a população favelada brasileira irá mais do que dobrar nos próximos dez anos: poderá chegar a 13,5 milhões de pessoas caso o ritmo de crescimento populacional nessas áreas permaneça estável.
As favelas encravadas em centros urbanos não compartilham o isolamento dos minúsculos municípios rurais, mas se assemelham a eles em outro aspecto: os baixos índices de educação formal. Segundo pesquisa do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas, os habitantes das favelas do Rio de Janeiro, as mais populosas do Brasil, estudam, em média, 4,5 anos – pouco mais da metade do tempo que permanece na escola a média dos moradores da cidade. Além da pouca escolaridade, há outras razões que explicam as altas taxas de fecundidade nesses locais. Em meados da década de 80, técnicos do Banco Mundial desembarcaram na favela da Rocinha, a maior do Rio, com o objetivo de desenvolver um programa de planejamento familiar. Os resultados foram insatisfatórios. Ao retornarem ao local para entender os motivos do fracasso da iniciativa, concluíram que ele se deveu, em grande parte, ao peso que certos aspectos culturais tinham sobre a gravidez. As mulheres declaravam que tinham filhos porque com isso ganhavam "status e respeito" na vizinhança, além de conquistar "independência dos pais". Já os homens diziam que se sentiam "mais viris" com a paternidade.
Há muito se sabe que é um equívoco creditar ao simples aumento da fecundidade o crescimento da pobreza e da desigualdade. Fosse assim, o contrário também deveria ser verdadeiro: o fato de o Brasil ter atingido uma média geral de nascimentos quase idêntica à dos Estados Unidos (2,0 filhos por mulher) levaria por si só a que, num futuro próximo, sua economia se tornasse tão reluzente quanto a de um país desenvolvido. Os números comprovam, porém, que existe um vínculo estreito entre o crescimento populacional e o desenvolvimento de uma economia. As mais pobres regiões brasileiras são as que têm as mais altas taxas de fecundidade. Nas mais ricas, é o oposto. A cidade com o menor índice de fecundidade do Brasil, São Caetano do Sul (SP), é a que apresenta a segunda maior renda per capita do país. O mesmo ocorre no âmbito das famílias: em lares onde a renda per capita não supera um quarto de salário mínimo, há em média cinco filhos, segundo o IBGE. Quando essa renda ultrapassa cinco salários mínimos, predomina o filho único. O alto número de filhos seria a razão da pobreza ou sua conseqüência? As duas coisas, respondem especialistas. Com muitos filhos, uma família com renda já escassa fica com o orçamento ainda mais espremido. As crianças são forçadas a largar os estudos para trabalhar e, assim, diminuem suas chances de superar a condição de pobreza. Sabe-se também que mulheres que não tiveram acesso ao estudo têm até três vezes mais filhos do que as que cursaram a universidade. "As altas taxas de fecundidade funcionam como uma espécie de combustível que faz girar um ciclo perverso de miséria", observa o economista Marcelo Neri, da FGV.
O processo de urbanização foi um dos fatores que contribuíram para refrear o aumento populacional no Brasil. Ao trocarem o campo pela cidade, as pessoas passaram a ter acesso a serviços públicos como saúde e educação. A universalização da previdência também influenciou na redução dos nascimentos, sobretudo porque fez arrefecer a crença, até hoje persistente em áreas rurais, de que a única fonte de renda na velhice viria do trabalho dos filhos – o benefício fez diminuir o temor dos brasileiros de chegar à velhice sem nenhum tostão. Um estudo feito na década de 70 chegou à curiosa conclusão de que as telenovelas foram outro fator a ajudar no encolhimento dos lares. "Como a maioria delas exibia famílias de dois filhos, o padrão acabou influenciando os casais", diz a demógrafa Elza Berquó, do Núcleo de Estudos da População da Unicamp, que participou da pesquisa na época.
A história das políticas de planejamento familiar é cheia de idas e vindas. Embora a distribuição de preservativos pelos hospitais públicos tenha começado nos anos 70, foi só a partir de 1996, por força de lei, que camisinhas e anticoncepcionais começaram a chegar sistematicamente às regiões mais pobres e distantes das grandes cidades. Agora, o governo federal está preparando um pacote de medidas, a ser anunciado ainda neste mês, que promete aumentar a opção de anticoncepcionais ofertados pelo Estado e dobrar o número de hospitais públicos que fazem esterilizações, hoje disponíveis em menos de 10% dos municípios brasileiros. A interferência governamental exige precisão cirúrgica para que não cause danos difíceis de reverter. O Brasil já exibe uma queda consistente nas taxas de crescimento populacional. Uma ação generalizada poderia acelerar perigosamente essa tendência. Demógrafos afirmam que é muito mais fácil diminuir a taxa de fecundidade do que aumentá-la.
Há anos a Europa assiste à diminuição de sua população. A situação é particularmente grave em países como Itália, Espanha, Alemanha e Suíça, todos com crescimento populacional próximo de zero. Diante da perspectiva de diminuir, esses países passaram a implantar programas de estímulo à natalidade, que incluem de abatimento no imposto de renda a licença remunerada de até um ano para os candidatos a pais. Na Itália, que junto com a Espanha tem a menor taxa de natalidade da Europa (1,2 filho por casal), o problema ganhou proporções tão dramáticas que a Igreja resolveu interferir: "Italianos, façam filhos", foi o slogan da campanha lançada há dois anos. Nem o incentivo da Igreja Católica nem as benesses oferecidas pelo governo estão dando resultados. Projeções indicam que tanto a Itália quanto a Suíça estão prestes a ter crescimento populacional negativo. Ou seja, encolherão de fato. Assim como a Alemanha, a Itália já afrouxou as exigências para a entrada de imigrantes dispostos a trabalhar – a única maneira de manter a economia funcionando nos níveis atuais.
No Brasil, embora o crescimento populacional continue caindo, as regiões pobres e, sobretudo, as favelas vêem agravar-se fenômenos que apontam na direção contrária, como o aumento da gravidez na adolescência, por exemplo. O último censo mostrou que mulheres de baixa renda estão tendo filhos cada vez mais cedo. Nos últimos dez anos, aumentou em 42% o número de mães pobres na faixa de 15 a 19 anos. "A ação do governo tem de ser precisa e baseada em estudos que ataquem problemas localizados como esse", diz o demógrafo Paulo Murad Saad, da Divisão de Populações da Organização das Nações Unidas. Ou seja, regiões com diferentes níveis de instrução e riqueza têm de ser alvo de políticas específicas.
"Muitos filhos ajuda no trabalho"
O município de Bagre, a catorze horas de barco de Belém, no Pará, orgulha-se de ser a terceira cidade brasileira com a maior média de nascimento de filhos por mulher (7,3), perdendo apenas para Tartarugalzinho e Pracuuba, ambas no Amapá. Segundo o IBGE, 39% das 2 521 mães do município têm mais de seis filhos. Há três anos, a prefeitura organizou um concurso para eleger a dona da maior prole da cidade. As finalistas foram uma mulher de 45 anos e outra de 38, cada uma com 22 filhos. O atual prefeito de Bagre, Pedro Santa Maria, tem explicação singela para a excepcional fertilidade da cidade: "Menos de 30% das residências daqui têm televisão", diz. "Isso faz do sexo umas das principais opções de lazer da nossa população." Há, sem dúvida, outras razões.
Bagre tem renda per capita anual de 20 dólares (a média nacional é de 2 800 dólares) e metade da população ganha menos de 25% do salário mínimo. Mais de um terço dos seus 8 792 habitantes em idade escolar nunca entrou numa sala de aula e outros 40% não estudaram mais que três anos. À miséria e à baixa escolaridade soma-se o fato de que só recentemente a cidade ouviu falar em planejamento familiar. "O governo começou a distribuir pílulas e preservativos apenas em 2001", diz o secretário de Saúde municipal, Carmelino Nunes. A iniciativa, ao que parece, deu poucos resultados até agora. Apenas 32 casais, 25 homens solteiros e 29 mulheres vão ao posto de saúde regularmente retirar preservativos e só 39 mulheres comparecem ao local em busca de pílulas. "É quase nada, mas é muito quando se sabe que estamos em um lugar em que os homens não admitem usar camisinha e, muitas vezes, proíbem às mulheres que se consultem com ginecologistas", afirma o secretário Nunes.
Como ocorre em boa parte das regiões mais pobres do Brasil, com economia baseada no extrativismo e na agricultura familiar, muitos casais desejam famílias grandes baseados na crença de que cada filho é um par de braços a mais para trabalhar na lavoura. "O bom de ter muitos filhos é ter mais gente para ajudar no trabalho quando precisa", diz Mercedes dos Santos, 41 anos, dezessete filhos e uma única fonte de renda fixa: os 95 reais do programa do governo federal Bolsa Família.
Leonardo Coutinho, de Bagre
VEJA, 09/06/2004
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