4.16.2004

Proporção de miseráveis cresce 51% em SP

Segundo a FGV, em 1991 8% dos paulistanos eram indigentes e, em 2000, 12,1%; no Rio, taxa foi reduzida

MURILO FIUZA DE MELO
DA SUCURSAL DO RIO

A proporção de miseráveis cresceu 51% nos anos 90 no município de São Paulo, segundo o "Mapa do Fim da Fome 2", divulgado ontem pelo CPS (Centro de Políticas Sociais) da Fundação Getúlio Vargas em parceria com a organização não-governamental Ação pela Cidadania e com o Sesc-RJ.Em 1991, 8% dos paulistanos eram considerados miseráveis na avaliação da FGV. Em 2000, esse percentual aumentou para 12,1%.Em números absolutos, isso significa que, em 1991, 772 mil paulistanos viviam abaixo da linha da pobreza. Em 2000, o número de miseráveis subiu para 1,3 milhão de pessoas, uma variação de 63%.No mesmo período, o município do Rio registrou queda no número de miseráveis. A proporção caiu de 16,36% para 13,32% de 1991 para 2000. Em número absolutos, eram 897 mil em 1991 e passaram a ser 780 mil em 2000.Quem é o miserávelA FGV classifica como miseráveis pessoas com renda mensal per capita inferior a R$ 79- valor necessário, de acordo com preços de São Paulo, para garantir a ingestão mínima de alimentos recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS)."São Paulo foi a cidade que mais sofreu com a crise econômica que atingiu os centros metropolitanos brasileiros. A explosão de miséria pode ser explicada pelo aumento na taxa de desemprego", disse o economista Marcelo Neri, coordenador do CPS da FGV.Com base em dados da Pesquisa Mensal de Emprego do IBGE, o pesquisador concluiu que, entre 2000 e 2002, a miséria explodiu nos municípios das regiões metropolitanas de São Paulo e Rio de Janeiro (excluindo as duas capitais). Até então, havia uma homogeneização crescente da pobreza nas capitais e em seu entorno.Entre 2000 e 2002, a proporção de miseráveis nas cidades vizinhas do Rio aumentou 18,25%, enquanto na vizinhança de São Paulo essa variação foi de 10,43%. Quando se analisa as capitais dos dois Estados, houve queda de 1,7% na proporção de miseráveis no Rio e um pequeno crescimento de 1,6% na capital paulista."Concluímos que inexistem políticas públicas de transferências de renda nos grandes centros. Grande parte da atenção do governo está voltada para os grotões do país", afirmou Neri.O estudo revela ainda que o Brasil tem 33% da sua população vivendo como miseráveis, o que representa 56 milhões de brasileiros. Segundo o trabalho, se cada brasileiro transferisse R$ 14,04 mensais de sua renda para os miseráveis do país, seria possível erradicar a fome. Cada miserável deveria receber R$ 33,15 por mês, em média, para superar a linha da pobreza. Por mês, seriam necessários R$ 2,4 bilhões para acabar com todos os indigentes do país.Não é possível comparar os resultados desse estudo com os dados do primeiro mapa, divulgado em 2001. Naquele ano, a FGV apontou a existência de 50 milhões de indigentes, ou 29,3% da população. "As bases de cálculo são diferentes", diz Neri.O mapa também fez um ranking da miséria por Estados e municípios brasileiros. São Paulo é o Estado com menor percentual de pessoas recebendo menos de R$ 79 reais por mês (14,3%), seguido de Santa Catarina (15,4%), Distrito Federal (17,1%), Rio Grande do Sul (18,4%) e Rio (19,5%).Os Estados com mais miseráveis são Maranhão (68,4%), Alagoas (63,8%), Piauí (63,3%), Ceará (58,7%) e Bahia (57,9%).
Endereço exclui do mercado de trabalho

DA SUCURSAL DO RIO
Dados do "Mapa do Fim da Fome 2" indicam que os favelados do Rio são estigmatizados no mercado de trabalho.Com base na renda dos habitantes da favela da Rocinha, palco da recente guerra do tráfico no Estado, o estudo descobriu que um não-favelado com as mesmas características de sexo, raça, idade e nível de escolaridade ganha até 90% a mais se morar na Lagoa. Se morar na Barra da Tijuca, o não-favelado recebe 78% a mais e, em Copacabana, 74% a mais."Possivelmente, a origem é fator preponderante nesse caso. Para um favelado é mais difícil se inserir no mercado de trabalho. Muitas vezes, ele é obrigado a omitir sua origem para conseguir um emprego", diz o economista Marcelo Neri, coordenador do CPS.O estudo da FGV é uma radiografia da qualidade de vida e da pobreza no Estado e no município do Rio. No Estado, as cidades mais pobres são São Francisco de Itabapoana (norte fluminense), com 44,7% de sua população vivendo abaixo da linha da pobreza (ganho mensal inferior a R$ 79 per capita), e Japeri (Baixada Fluminense), com 41,7%.AnáliseA novidade é que a pesquisa analisou a pobreza e a qualidade de vida por áreas da capital do Estado, que foi dividida em 32 subdistritos. A análise permitiu a localização física das regiões com condições sociais adversas.Os três subdistritos mais pobres da capital são Complexo do Alemão, com 29,4% de miseráveis, Santa Cruz (27,6%) e Jacarezinho (27,4%). Os três mais ricos são Botafogo, Copacabana e Lagoa -todos com menos de 4% de sua população vivendo abaixo da linha da pobreza.O estudo compara ainda as cinco regiões com mais alta renda (Lagoa, Barra da Tijuca, Botafogo, Copacabana e Tijuca) com as cinco maiores favelas do Rio (Alemão, Jacarezinho, Cidade de Deus, Maré e Rocinha).Em comparação com os trabalhadores das áreas mais ricas, os moradores dessas favelas trabalham mais e ganham menos. A renda média mensal é de R$ 405 ante R$ 2.145 no asfalto. Ao mesmo tempo, a jornada semanal média de trabalho é de 46 horas nas favelas -cinco horas a mais do que a das regiões de alta renda.O estudo mostra que, em média, um trabalhador do Alemão ou da Maré ganha R$ 2 por hora trabalhada, enquanto um ocupado da Lagoa, R$ 11,8.A taxa de desemprego também é maior nas favelas, chegando a 19%, ante 10% nas áreas mais ricas. Outro fator é a relação entre renda e a taxa de escolaridade. Cada ano a mais de estudo rende aos ocupados das área ricas mais dinheiro do que para os pobres.Por ano, os ricos recebem mais R$ 180,5; os pobres, R$ 65,9. Em média, os habitantes dos subdistritos mais ricos têm 11,9 anos completos de estudo contra 6,2 nas comunidades de baixa renda.

FSP, 16/04/2004